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Desde o início da pandemia por coronavírus a discussão sobre o que será o “novo normal” foi pauta constante. Visitar a Suécia e a Dinamarca, onde as regras se afrouxaram, nos mostra um pouco sobre o que o futuro nos aguarda.
Há um ano eu vesti minha roupa de Mãe Dinah e escrevi um artigo para o The Summer Hunter com as previsões que se desenhavam sobre como seria viajar pós-pandemia. Na época, eu tinha acabado de sair da minha primeira quarentena em Berlim e tudo já estava diferente. Álcool gel para todo lado, distanciamento social nos restaurantes, cardápios em QRCode, entrada no salão só de máscara, restaurantes criando “bolhas” para manter o público seguro e/ou placa de acrílico instalado entre as mesas (fora o que vimos sobre os shows de música ao vivo). Mas tudo que eu achei que duraria por um bom tempo, eu estava bem enganada.
Viajar localmente, preferir transportes terrestres, aderir ao camping e/ou glamping e buscar destinos na natureza estão realmente em alta, mas desde que cheguei na Escandinávia, a minha máscara e o álcool gel seguem esquecidos onde foram colocados tão logo eu saí da área de desembarque do aeroporto de Gotemburgo.
Esta viagem foi marcada com 2 meses de antecedência e aguardada como o meu grande evento do ano, mesmo Gotemburgo estando a menos de 800 quilômetros de distância da minha casa. Mas viajar foi por longos meses uma atividade proibida, o que me deixou bem ansiosa e causou uma pequena dor de barriga a caminho do aeroporto. Para a minha surpresa, o aeroporto não estava tão lotado como costuma estar nesta época do ano (alta temporada na Europa) e a máscara no rosto obrigatória não nos deixava esquecer que estamos em meio à uma pandemia.
A Suécia foi um dos últimos países da União Européia a não ter quarentena exigida no retorno à Alemanha, por isso a demora nesta minha primeira viagem que teve dois objetivos: visitar a família e relaxar à beira mar com pores-do-sol de tirar o fôlego.
Assim como muitos visitantes se assustam ao chegar em Berlim quando se deparam com as pessoas andando pelas ruas sem máscara, aqui meu susto foi logo que a porta do desembarque no aeroporto se abriu. Ali, me deparei assustada com o costumeiro grupo de pessoas que está sempre plantado em frente ao portão esperando os passageiros. Estavam todos sem máscara. Foi a primeira vez que vi desde março de 2020 uma aglomeração de pessoas em local fechado com as pessoas sem máscara. Deu até um arrepio.
Sabemos que a Suécia fugiu à regra no gerenciamento da pandemia, mas depois do desastre inicial, as medidas foram revistas e a situação passou a ficar sob controle. Hoje, cerca de 46,8% da população já tomou as duas doses da vacina e quase 64,9% tem uma dose tomada. A Dinamarca está à frente com 64,6% da população totalmente vacinada e 74,5% com uma dose tomada.
Algumas regras existem na Suécia, como a de distanciamento social, mas o país está aberto para o turismo e praticamente não há obrigatoriedade de uso de máscara, mesmo em locais fechados. Até 31 de agosto somente está permitida a entrada de pessoas vindo de países da União Europeia e da EEA, enquanto os cidadãos de todos os países escandinavos não precisam apresentar teste PRCR negativo e/ou o passaporte de vacina para entrar. Já na Dinamarca o distanciamento social obrigatório caiu. Mas é obrigatório mostrar o passaporte da vacina em restaurantes, bares, academia e outros eventos indoor. Os clubs continuam fechados com festinhas apenas a céu aberto. O aeroporto, onde a máscara se mantém obrigatória, estava bem vazio no começo da noite contando apenas com 2 bares/restaurantes abertos, além da loja Duty Free.
As minhas primeiras saídas nesta viagem foram a uma peixaria, que também funciona como restaurante, e ao supermercado. Ambas causaram um comichão no estômago quando me deparei novamente com tanta gente sem máscara. Nas duas vezes eu tive que sair para tomar ar. Depois de um ano e meio tendo que usar máscara em quase todas as situações, com exceção de lugares abertos, o cérebro estranha causando a sensação de que estamos fazendo algo errado (talvez estamos mesmo).
Após mais de duas semanas viajando entre os dois países, o meu cérebro já se acostumou com a nova situação. Eu voltei a frequentar lojas, restaurantes, farmácias e até viajei de trem de Gotemburgo para Copenhagen sem máscara.
A maioria dos lugares mantém o álcool gel na entrada e/ou em lugares estratégicos internos, mas no geral a impressão é que a vida normal está de volta. Os cardápios de papel ou plástico ressurgiram como outrora, não há espaçamento entre as mesas e estão todas lotadas, mesas comunitárias sendo usadas à vontade e no trem nem mesmo os ticketeiros usam máscara.
Gotemburgo e Copenhagen retomaram o turismo com força total. As ruas lotadas, as varandas dos hotéis cheias, filas para fazer o famoso tour de barco pelos canais das duas cidades. Também não vi controle de número de pessoas em nenhum lugar que eu entrei e os restaurantes andam todos bem concorridos, tanto na área externa quanto na interna.
Fui atendida numa padaria por alguém sem máscara que foi até meu pão, o colocou no pacote e o entregou sorrindo. Há tempos eu não via o sorriso de alguém do outro lado do balcão, mas agora já o vejo nos cafés, na cervejaria e nas barracas de comida de rua. Ganhei o habitual abraço apertado de todas as pessoas com quem eu me encontrei, mesmo as mais idosas. Visitei uma exposição concorrida cheia de gente idosa e nela havia apenas uma senhorinha usando máscara. O Louisiana, na Dinamarca, não tem mais limite de tickets diários. Há tempos eu não via um museu tão cheio com o restaurante, que é gigante, concorridíssimo para conseguir uma mesa.
Numa tarde ensolarada de domingo em Copenhagen eu me deparei com um jogo de vôlei de praia com uma plateia apinhada de gente sem máscara. Todo mundo grudadinho um no outro.
Conversando com alguns amigos que moram em Copenhagen, todos acham prematura a liberação quase total de tudo, em especial a não obrigatoriedade de uso de máscara, não mais obrigatória sequer no transporte público, e o distanciamento social que está praticamente abolido entre outras medidas que foram relaxadas.
Listei na minha cabeça várias regras que me pareceram (e ainda parecem) óbvias se manterem após a pandemia, mas elas se foram antes mesmo da pandemia acabar.
A minha impressão geral é que o novo normal não está muito diferente do velho normal no nosso dia-a-dia. Há mudanças drásticas acontecendo, mas elas estão muito mais nas estruturas e nos processos internos de empresas, como o “remote first”, nos estabelecimentos comerciais (assim espero) e nos aeroportos e aeronaves. No turismo, os hotéis devem estar mais atentos à limpeza e higiene, apesar de não ter notado nada muito diferente no último hotel em que me hospedei, os voos devem manter a obrigatoriedade da máscara por um bom tempo ainda, assim como nos aeroportos e viajar sem passaporte de vacina ou teste PCR negativo não deve rolar tão cedo.
Antes de sair de Berlim, eu confesso que o álcool gel, que eu nunca achei que iria me desgrudar, já estava bem menos presente na minha rotina. O que se manteve de fato foi um grande frasco na entrada do meu apartamento, o qual eu não consigo entrar em casa antes de dar uma borrifada de álcool nas mãos.
O especialistas andam otimistas sobre o fim da fase pandêmica, que assumem passar para endêmica, com chances do coronavírus se tornar uma doença menos grave a partir do aumento da imunidade da vacinação em massa:
“Os especialistas acham que a imunidade contra a doença grave será potente e duradoura. É importante frisar a palavra grave: sabemos que os vacinados podem se infectar e ficar doentes, mas se as reinfecções são muito mais leves, em uma altíssima porcentagem de pessoas e ocasiões, conviver com o coronavírus em 2030 será algo muito diferente do que fazê-lo em 2020.” – El País
Mas os mesmos especialistas não conseguem prever se alcançaremos um equilíbrio endêmico, o que me faz achar esse relaxamento total das medidas tomadas anteriormente precipitadas, mas li que na Inglaterra ninguém consegue explicar o porquê do relaxamento das medidas coincidiu com a queda de novos casos.
Deixo aqui um episódio do podcast da Revista Gama com as previsões do Ricardo Freire sobre a retomada das viagens, que para ele será um direito a ser reconquistado.
O que ele previu e já está acontecendo é “Quando as pessoas voltarem a viajar, elas vão querer fazer o que era proibido durante a pandemia: Aglomerar.” Pois é, já estão aglomerando do lado de cá do planeta.
A gente quer ver show, quer pular carnaval, quer ir a festival, quer se acotovelar no balcão do bar e isso tudo está voltando aos poucos. Claro que aqui eu não estou falando sobre todos os resquícios, cicatrizes, saúde mental abalada e dores que a pandemia vai nos deixar. Temos muitas coisas para lidar, mas ali, na nossa vidinha dia-a-dia, muita coisa já está voltando a ser como antes. Então vamos fazer com que esse antes retorne de uma forma mais consciente, generosa com o planeta e com o entorno. Não dá mais para fechar os olhos. Vamos cuidar.
Não dá mais para ignorar os problemas do mundo que foram escancarados pela pandemia e o pouquinho que cada um de nós pode fazer para que o mundo não siga descendo ladeira abaixo. Aproveito para encerrar com esta ótima reflexão da Natália Baffatto:
“Compre uma Polaroid, leia mais sobre o lugar, assista a um documentário, conheça a origem de onde pisa, sinta frio, calor, brinde-se de sensações, alegria, entusiasmo, choque. Mas sinta, entregue-se ao espírito do momento. Vale tudo, só não vale ir com medo.“
Eu continuo favorável ao uso da máscara em lugares cheios e/ou fechados, álcool gel sempre que possível e evitar aglomeração, mas que foi bom viver uns dias a vida como vivíamos pré-pandemia, ah se foi.
*Foto capa: Suécia por Pontus Wellgraf no Unsplash
Lalai prometeu aos 15 anos que aos 40 faria sua sonhada viagem à Europa. Aos 24 conseguiu adiantar tal sonho em 16 anos. Desde então pisou 33 vezes em Paris e não pára de contar. Não é uma exímia planejadora de viagens. Gosta mesmo é de anotar o que é imperdível, a partir daí, prefere se perder nas ruas por onde passa e tirar dicas de locais. Hoje coleciona boas histórias, perrengues e cotonetes.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.