Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
‘Você sabe que estamos vivendo em um mundo material’, cantava a Material Girl lá nos idos dos anos 80. Mais de 30 anos se passaram, e parece que nada mudou. Mas enquanto tem (muita) gente com fome de ouro, outros preferem mesmo é tratar com ouro da sua fome. Digo isso literalmente. O ouro é um dos poucos minerais seguros para se comer – junto com o cálcio e o ferro – e claro que o ser humano não resistiu e transformou o metal em ‘iguaria’. Ele não tem nenhum propósito referente a sabor e não vai ajudar em nada nos teus movimentos peristálticos. Então pode ter certeza: se tua comida vier decorada com ouro, manda descer duas champagnes com fogos de artifício! O chef só quer mesmo que você se sinta o ‘rei do camarote’, e pague por isso. O ouro comestível é vendido em flocos, folhas ou pó, e é usado geralmente para decorar doces, bolos e – veja só – taças de champagne. O material usado tem 23 ou 24 quilates, e pesquisando rapidinho, achei um pacote com 25 folhas de 8,5×8,5cm por módicos 40 dólares. Nem achei tão caro, se você quer mesmo saber.
Existem ingredientes que, desculpem a força de expressão, valem ouro de verdade. São artigos difíceis de encontrar, ou que tem uma produção beeeem complicada, e por isso tem o preço lá no Olimpo dos milionários. Então, se você quiser se meter a bacana na cozinha, sugiro colocar na tua lista de indulgências culinárias algum desses alimentos. Esses, sim, tem valor nutricional, e vão trazer uma experiência de sabor de outro mundo. Mas, depois de ver os preços deles, acho que todo mundo vai pensar que vale até a pena comprar o tal do ouro comestível para jogar na batata frita e na dose de catuaba.
Com certeza você já ouviu falar desses pequenos pedaços de fungo tirados do fundo da terra como sendo a coisa mais chique do cardápio, mas olhando friamente eles não parecem tão elegantes assim. O preço alto das trufas brancas é justificado pelo fato delas não poderem ser cultivadas, então não tem jeito de aumentar a produção. Elas crescem naturalmente nas raízes dos carvalhos e são colhidas apenas durante o inverno com ajuda de cachorros e porcos farejadores. Podem ser encontradas em algumas regiões da França e da Croácia, mas a boa mesmo – a Alba, aquela que vale uma fortuna – vem das florestas do Piemonte, no norte da Itália. O quilo da trufa branca gira em torno de 3 a 5 mil dólares. Mas já teve um caso de uma trufa inteira de 1,5kg que foi leiloada por 330 mil doletas.
Baunilha deve ser o sabor mais comum do mundo depois do chocolate. Mas baunilha mesmo, aquela que vemos os chefs estrelados esfregando com a faca nos programas de culinária, não tem nada a ver com aquele gostinho doce que vem do frasquinho de essência. A verdadeira nada mais é que uma vagem extraída de uma orquídea natural da América Central. Só que as flores dessa orquídea desabrocham apenas por algumas horas durante todo o ano, e a polinização tem que ser feita de forma totalmente manual. Depois disso, as vagens ainda precisam ser fermentadas e envelhecidas por dois anos, para começarem a liberar aquele gosto adocicado maravilhoso. Fora isso, você já viu quanta baunilha de verdade sai de cada vagem? Pois é, não dá nem para uma bola de sorvete. E para piorar o preço dessa belezinha, ela só é produzida em áreas tropicais como ilhas do Índico e do Pacífico Sul, na região do Caribe, e nos dois países que são os maiores produtores do mundo: Madagascar e Indonésia. O preço da baunilha chegou a 600 dólares por quilo em 2017, depois que um ciclone arrasou plantações em Madagascar.
Campeão de preço entre os temperos, o açafrão é uma verdadeira joia culinária. Mas vamos com calma. Aquele pozinho amarelo que você tem do lado do fogão, que comprou na seção de temperos do supermercado por uma pechincha, não é açafrão, ok? Aquilo é cúrcuma, também conhecido como açafrão-da-terra, que é um rizoma da família do gengibre. O açafrão de verdade são os estigmas de uma florzinha lilás que nasce apenas uma vez por ano, e que possui apenas 3 deles. Para se produzir 1kg de açafrão são necessárias mais de 200 mil florzinhas, colhidas à mão. Mais ou menos um campo de futebol. E apesar de ser fortemente associado com a gastronomia indiana, 95% do açafrão vendido no mundo vem do Irã. Preparado para o preço do quilo? De mil a 10mil dólares, dependendo da qualidade.
Muita gente já ouviu falar da carne Wagyu pelo nome Kobe Beef, mas Kobe é apenas um dos lugares onde o gado Wagyu é criado. Toda a região de Hyogo, no Japão, se especializou nesse tipo de pecuária. Parte da lenda do Wagyu é verdadeira: os animais são alimentados com uma cerveja por dia (além do melhor capim que existe no mercado), e recebem massagens regulares para deixar sua carne ainda mais macia. Já a parte que eles ficam escutando Vivaldi e Chopin o dia todo eu não posso garantir. A grande graça da carne Wagyu é o efeito marmorizado da gordura em meio aos músculos. Além de ter baixo teor de colesterol, essa gordura tem baixo ponto de derretimento, fazendo-a se liquefazer quando cozida. Mas só cerca de 3 mil vacas são certificadas como Kobe anualmente, e uma parcela pequena delas acaba indo para exportação. Já deu para ver que esse hambúrguer não vai sair barato, né? O corte pode ir de 200 a 800 dólares por quilo.
Eu não quero acabar com os sonhos gourmet de ninguém. Mas vamos ser sinceros: se está no supermercado comum, e está baratinho, com certeza o que você está comprando não é o real deal. Então não se frustre quando eu te disse que aquilo que você joga na tua salada não é vinagre balsâmico. O verdadeiro é feito com uvas tipo Trebbiano, na Itália, e ele passa por um processo de envelhecimento em barril de 12 a 25 anos. Essa uva é cultivada na região da Emilia Romagna, e o vinagre é protegido pelo sistema europeu PDO (Protected Designation of Origin). Mais ou menos como champagne, que se não veio de lá, não é. Se algum dia você provar o verdadeiro vinagre balsâmico, vai ver que ele é viscoso e bem adocicado, nada a ver com aquele azedume que servem no buffet de salada da churrascaria. Segura a carteira aí. Preço: de mil a 4 mil dólares por litro.
Nem preciso mais falar, certo? Você provavelmente nunca comeu o verdadeiro presunto cru, e agora já sabe disso. O Jamón Ibérico de Bellota, conhecido no mundo todo, vem do oeste da Espanha, de uma espécie específica de porco negro. O sabor especial desse presunto vem de uma noz adocicada da região (a bellota) que eles comem na floresta. Para ter o certificado PDO, que garante a qualidade e a procedência, o criador não pode ter mais que dois porcos por hectare de terra. Só assim dá para garantir que os mais de 5 quilos de bellota que os porcos devem comer todos os dias durante a estação da noz. O processo de desidratação da carne pode demorar 3 anos, e o produto ainda é verificado por um dos oito técnicos com nariz treinado para julgar se o aroma está correto. O quilo do verdadero jamón pode chegar a 500 doletas. E você aí querendo fazer um misto-quente gourmetizado.
O melão do tipo Yubari King você não vai encontrar na feira. E provavelmente não vai encontrá-lo no Brasil. Esse tipo de melão cultivado em estufas na região de Yubari, no Japão, é um cruzamento de dois tipos de cantalupos, e é bem doce e suculento. Quem come diz que não tem nada a ver com um melão comum. E seu formato perfeitamente redondo e proporcional transformou o Yubari King em um dos presentes mais elegantes a se dar para um japonês. Mas pode preparar o bolso, porque se você quer impressionar, você tem que dar um par. Um melão sozinho pode custar de 50 a 100 dólares, mas existem registros de leilões onde o par bateu a marca de 26 mil. Mas quer saber o pior? Isso não é nada perto do preço da melancia Densuke. Ela é escura, dura, crocante e doce, mas anualmente só 65 unidades são colhidas. Uma única melancia chega a custar 3,5 mil dólares.
O cogumelo Matsutake cresce em vários lugares do mundo, como Canada, Japão, Finlândia, Suécia, Estados Unidos, Coréia do Sul e China. O sabor dele é picante e suculento, com textura similar ao Portobello. É muito usado – e celebrado – na cozinha japonesa, que compra grande parte da produção mundial. Mas o Matsutake enfrenta dois problemas que fazem seu preço subir às alturas. Primeiro, ele brota escondido embaixo das folhas caídas no chão da floresta, o que faz ele ser difícil de ser encontrado. E segundo porque ele estão correndo risco de extinção no Japão, por conta do aumento na população de um tipo de verme que ataca as árvores na região de Okinawa. O cogumelo Matsutake comum sai por cerca de 90 dólares o quilo, mas algumas colheitas especiais podem bater a marca de mil dólares.
Eu fico intrigadíssimo pensando em como o ser humano inventou certas coisas. Por exemplo, o café. Alguém um dia olhou para aquele grãozinho e falou: vamos pegar um monte desses, a gente seca, torra, mói, joga água em cima do pó, e bebe o caldinho que vai escorrer. Tão óbvio! (#sqn) E mesmo com todo esse processo bizarro, ainda tem gente que acha uma forma de dificultar. O café Kopi Luwak não só passa por todo esse processo, como o grão, antes de colhido, passa pelo sistema digestivo de um felino chamado Paguma larvata, comum no Sudeste Asiático. Pois é, o tal bicho come os grãos mais doces do cafezal, e o que ele põe para fora depois é o que você vai saborear nos cafés mais chiques da Europa. Parece que o amargor do grão é removido na passagem pelo animal, deixando a bebida adocicada, suave e rica de sabores. O Kopi Luwak você consegue pela bagatela de 200 a 400 dólares o quilo.
Sabe aquele queijo tipo camembert do mercado? Ou tipo-brie? O queijo da Moose House, na Suécia, não tem tipo nenhum. É o queijo mais exclusivo e caro do mundo. A fazenda de 23 hectares perto da cidade de Bjurholm cria alces, e apenas três deles, chamados Gullan, Haelga e Juna, fornecem o leite usado na preparação dessa joia. As alces-leiteiras só são ordenhadas entre maio e setembro, o que restringe bem a produção. Por ano, são só cerca de 300 quilos de queijo de três tipos: curado, azul e um similar ao feta. O preço varia entre 800 e mil dólares o quilo, então só posso intuir que deve ter o sabor do manjar dos deuses. Se quiser provar, a Älgen Hus está aberta a visitantes, que podem conhecer as alces e ainda fazer compras na lojinha.
Por último, como não poderia deixar de ser, eis o caviar. Sinônimo de rykeza desde tempos imemoriais, nada tira a realeza dessa maçaroca feita de ovas de peixe. Hoje qualquer rodízio bagaceiro de comida japonesa serve sushi com ovas em cima. Mas você que está prestando atenção no texto já deve saber que aquilo NÃO É CAVIAR. Vamos para a aula: caviar é a ova de um peixe específico, o esturjão, encontrado nos mares Cáspio e Negro. Existem três tipos de caviar, o Beluga, o Ossetra e o Sevruga. O Beluga é o mais famoso e mais caro deles. E dentro dos Belugas, existe um ainda mais raro e valorizado, o Almas. Ele é nada mais, nada menos que o caviar tirado de esturjão albino com mais de 100 anos. Tá fácil? Então vamos dificultar um pouco mais. Esse tipo de peixe, que vive na costa do Mar Cáspio no Irã, está na lista de animais ameaçados de extinção. Tanto que o colheita das ovas está suspensa. Desse jeito parece até fácil acertar na Megasena. O caviar Almas parece uma pequena pérola dourada, e é vendido em caixinhas banhadas a ouro, porque né? Luxo demais é bobagem. Quer saber o preço do quilo? Mais ou menos 25 mil doletas. E mesmo que você tenha essa bala na agulha, tenha paciência. A lista de espera para comprar um pouco de caviar na única loja que vende em Londres, The Caviar House and Punier, pode levar mais de 4 anos.
Se você ficou com fome depois desse papo todo, mas também se sentiu ainda mais pobre, pode me convidar para para ir na padoca comer uma coxinha com cerveja de garrafa. Porque as coisas realmente boas da vida não tem preço. ;-)
*Foto do destaque: Creative Commons – Safa Daneshvar
Para o Renato, em qualquer boa viagem você tem que escolher bem as companhias e os mapas. Excelente arrumador de malas, ele vira um halterofilista na volta de todas as suas viagens, pois acha sempre cabe mais algum souvenir. Gosta de guardar como lembrança de cada lugar vídeos, coisas para pendurar nas paredes e histórias de perrengues. Em situações de estresse, sua recomendação é sempre tomar uma cerveja antes de tomar uma decisão importante. Afinal, nada melhor que um bom bar para conhecer a cultura de um lugar.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.