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Cruzando o deserto: uma jornada pela Namíbia vol. 3

Quem escreveu

Chicken or Pasta

Data

13 de June, 2017

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Esse texto é a continuação da série escrita pelo Lucas Noura, sobre sua viagem através da Namíbia. O começo desse texto está aqui e aqui

Sossusvlei e Deadvlei ou atrás da(s) foto(s) perfeita(s)

Saindo de Solitaire, menos de 85km nos separavam do Sesriem Campsite, uma das únicas acomodações – também administrada pela NWR – localizadas já dentro do Sossusvlei. A outra opção é um lodge privado, com preços mais elevados. A vantagem de dormir já dentro do parque é que ganha-se uns quilômetros para ver o nascer-do-sol e pode-se ficar até um pouco mais tarde e curtir o por-do-sol. Altamente recomendável. O acampamento conta com ótima estrutura. Tem bar, restaurante, wi-fi, loja de conveniência, posto de gasolina e banhos quentes (aliás, todos na Namíbia tinham). Como queríamos passar a virada de ano aqui, ficamos 3 noites nesse acampamento.

Em cima de uma duna, em Sossusvlei, ao lado de Deadvlei. Foto: Ola Persson

Existem alguns passeios a serem feitos em Sossusvlei. Além das dunas, têm os vales secos, com suas árvores mortas e paisagens inóspitas. Diferentemente do Etosha, aqui paga-se já na entrada do parque, ao fazer check-in. O preço varia em função do número de dias que cada pessoa fica dentro do parque.

No dia em que chegamos, aproveitamos para fazer nada além de montar o acampamento, tomar banho, comer e dormir. Uma coisa a ser levada em consideração quando alugar um 4×4 com barraca no teto é que sempre que você quiser se movimentar com o carro, vai precisar levantar acampamento. E assim fizemos nos próximos dois dias. Criamos uma rotina diária, dividimos as tarefas – enquanto eu guardava a barraca, ela preparava o café-da-manhã; enquanto eu lavava a louça, ela preparava o interior do carro com água gelada e lanches para o dia – e tudo funcionou bem. Tiveram dias em que era realmente um saco desmontar a barraca logo de manhã; ou cozinhar a meia-luz com vários bichos voando ao redor da comida. Mas estar ali com minha parceira, dividindo coisas básicas e rotineiras, envoltos nas paisagens tranquilas e deslumbrantes, nos trouxe muito contato e intimidade. Crescemos não apenas enquanto casal, mas enquanto parceiros de viagem, amigos.

Perdida. Foto: Luca Noura.

Aqui em Sossusvlei aproveitamos para diminuir o ritmo da viagem, curtir mais os dias no acampamento. Saímos do camping apenas à tarde, com a intenção de pegar o pôr-do-sol em cima da Duna 45 – distante 45km do portão do parque. Antes de subir a duna, fomos até o Sossusvlei fazer um reconhecimento de área e descobrir como era o terreno por lá. A quantidade de cenários espetaculares era incompatível com o tempo que nos restava até o Sol se por.

As impressionantes dunas de 200m de altura. Foto: Lucas Noura

Todo o caminho é asfaltado, exceto por um último trecho até o Sossusvlei, que é por areia, trafegável apenas em 4×4. Existe um estacionamento para carros 2×2 e de lá é oferecido um transfer de jipe – gratuito – para o trecho final. O terreno é realmente arenoso e tirar a pressão dos pneus pode fazer a diferença entre atolar ou não, mesmo estando num 4×4. Caso ocorra de atolar, apenas diminua bastante a pressão dos pneus, bastante mesmo, e você poderá sair deslizando do lugar onde atolou. Não se esqueça de encher os pneus na volta (as locadoras de carro sempre disponibilizam um calibrador portátil).

Antes de chegar ao Sossusvlei há, do lado esquerdo, o Hiddenvlei e o Deadvlei. Optamos por conhecer naquela tarde o Hiddenvlei, que possui um percurso de 4km entre o estacionamento e o próprio vale. É bastante bonito e vale como passeio introdutório. Leve bastante água e câmera fotográfica. E nada mais. Qualquer peso em excesso é revertido imediatamente em suor e calor.

Subindo a Duna 45, em Sossusvlei. Foto: Lucas Noura

Começamos a voltar, por volta das 17h, para a Duna 45, paramos o carro e começamos a subida. A Duna 45 tem mais de 170m de altura e é formada por areia de 5 milhões de anos. O visual – e a subida! – é de tirar o fôlego. Lá de cima os carros ficam pequenos. O fato de ser uma duna, e não um prédio de 170m, ameniza a sensação de vertigem e tira a noção exata da altura. Algo para lembrar é uma capa plástica para envolver a máquina fotográfica, porque venta muita areia lá em cima. Dali de cima nos despedíamos de 2016, satisfeitos por estarmos onde queríamos. O lugar é ideal para aquelas reflexões: o que fiz e o que aprendi no ano que passou, onde quero estar no ano seguinte…

De olho no relógio, iniciamos nossa descida da Duna 45, rumo ao acampamento. De banho tomado, acendemos a fogueira e cozinhamos o jantar. Nossa virada foi simples, sem contagem regressiva, sem fogos de artifício. O silêncio do deserto já falava muito aos nossos corações. Dormimos cedo porque acordaríamos cedo, para pegar o nascer-do-sol em Sossusvlei.

Árvores mortas no Deadvlei. Foto: Lucas Noura.

Para essa manhã havia duas opções: ou chegar cedo em Sossusvlei e pegar as dunas só para a gente; ou tentar fotos surreais no Deadvlei (uma terceira opção seria ver o nascer-do-sol de cima da Duna 45, mas o Sol se levanta do outro lado do parque, com uma vista não tão bonita assim). Optamos por ir ao Sossusvlei e apenas depois ao Deadvlei. Subimos uma duna relativamente alta no Sossusvlei e esperamos o sol nascer dali. Foi uma subida mais dura, pois a duna era comprida e não havia muita comida no estômago ainda. Fizemos o café da manhã apenas na descida da duna, já perto do carro. Ter um pedacinho daquele deserto milenar só para você, ainda que por alguns minutos, coloca em perspectiva todos os nossos “problemas”. Quão pequenos são nossos problemas diante da imensidão e longevidade do deserto?

Deadvlei é um cenário surreal e paraíso dos fotógrafos. Foto: Lucas Noura

Próximo destino era o Deadvlei, famoso por suas árvores retorcidas. Os que chegam ali cedo se beneficiam – além da ausência de outros turistas, é claro – da ausência de luz direta sobre as árvores, protegidas pelas altas dunas que cercam o vale. É possível fazer fotos alucinantes, tendo os tons de bege e marrom das dunas como panos de fundo. Chegamos ali por volta das 8h, e já havia bastante turistas. Mesmo assim, conseguimos tirar ótimas fotos e aproveitar o sol ainda fraco. A paisagem é realmente impressionante pela aridez, as árvores mortas, o piso seco. Nos sentíamos dentro de um quadro de Dali, atemporal. A visita é imperdível.

Fishriver Canyon e Windhoek

O dia seguinte era dia de estrada novamente, até o Fish River Canyon, segundo maior cânion do mundo, atrás apenas do Grand Canyon norte-americano. Infelizmente, apenas é possível descer o cânion em alguns meses do ano. E para fazer a trilha, que percorre 85km, precisaríamos de 4 ou 5 dias. Assim, tivemos de nos contentar com as impressionantes vistas de cima do platô, merecendo destaque a Hell’s Bend. Para chegar até lá, pegamos a C-14 até Helmeringhausen – pare aqui para abastecer! – e depois seguimos por Bethanie, até alcançar a asfaltada B-4. Um desvio em Seeheim e entramos na C-12, de terra e bastante burocrática.

Hells Bend, no Fish River Canyon. Foto: Lucas Noura.

Pela falta de tempo, não dormimos ali – Hobas Campsite – nem em Ai-Ais, local de águas termais. Como no dia seguinte teríamos de devolver o carro em Windhoek, optamos por começar a subir o país, e fomos dormir em Keetmanshoop, cidadezinha com alguma estrutura. No dia seguinte fizemos os 540km até o aeroporto de Windhoek, parando apenas em Rehoboth para lavar o carro, já que não queríamos pagar os indecentes 75 dólares (!!!) que a companhia nos cobraria por devolver o carro sujo. Vale destacar que dia 2 de janeiro também foi feriado na Namíbia, já que o dia 1° havia caído em fim de semana. Política de feriados interessantíssima. Feriado que cai em fim de semana não é feriado!

Ao devolver o carro, nova vistoria é feita. Além do pneu furado, havíamos ganhado dois trincos no painel do carro. Como havíamos contratado o seguro Super Cover (recomendado) não precisamos arcar com nenhum custo adicional.

Já em Windhoek, escolhemos gastar nossos últimos dólares em um hotel mesmo, com cama grande, confortável, lençol limpo e cheiroso e toalha felpuda. Afinal de contas, como diz meu avô, a burguesia tem seus encantos. Ainda mais depois de 20 dias comendo poeira e levando uma rotina austera de acampamento. Ficamos no Protea Hotel, da rede Marriot. Nos dois dias que nos restavam na Namíbia, demos alguns passeios em Windhoek. Para mim, recém retornado de 5 anos em Berlim, tudo aquilo era muito engraçado. Nomes de ruas em alemão, igrejas e arquitetura germânicas, algumas pessoas na rua falando um alemão rocambolesco. E na Namíbia. Ao mesmo tempo em que via máscaras africanas em lojas e locais petiscando biltong – tradicional snack feito de carne seca. É uma mistura inusitada, para dizer o mínimo.

Christ Church em Windhoek. Foto: Lucas Noura.

Em Windhoek, vale a pena caminhar pela Independence Avenue, da parte da estação central de trem (Bahnhof) até o Namibia Crafts Centre, onde é possível achar artesanato local com uma pegada mais moderna. Ali perto tem a Town House e no final da Fidel Castro St., depois de passar pelo War Memorial, fica a Christuskirche. Bonito também é o Tintenpalast e o House of Parliament, prédios públicos com lindos jardins. Na Post St., que se inicia na Clock Tower, é possível encontrar alguns vendedores de rua ofertando máscaras. Preferimos comprar uma no Bushman Gallery, na própria Independence Av. Preço um pouco salgado, ainda mais para fim de viagem, mas lá tem muita variedade e certeza de autenticidade.
Confesso que após tantas paisagens lindas desenhadas e esculpidas pela natureza, estar diante de obras humanas – prédios, ruas, igrejas, carros – perde muito do seu valor. Andávamos despretensiosamente pelas ruas de Windhoek, já bastante satisfeitos com tudo que vimos e vivemos nos dias em que estávamos motorizados.

Com relação à culinária, há pouco a comentar, uma vez que comemos comida de supermercado. E os supermercados de lá possuem basicamente tudo que um supermercado “normal” dispõe. Variedade enorme de frutas, legumes e verduras, todos os tipos de grãos, carnes – de antílopes também! – molhos, chocolates, sucos. Enfim, supermercados completos, sem surpresas. Não tivemos problema algum com falta de segurança. As pessoas são prestativas, simpáticas e tourist-friendly, embora nem sempre muito abertas, de início. Absolutamente todo mundo fala inglês – e outros idiomas mais. Não há tanto assédio para comprar como vimos em outras viagens – como Zimbábue ou Marrocos. Turistas chamam a atenção, mas isso não nos gerou problema algum. Como costuma ser a praxe na maioria dos países africanos, todos adoram o futebol brasileiro.

Namíbia é um país para ir mais de uma vez, dar-se tempo para sincronizar-se com o ritmo do deserto, perceber a magnitude deste mundo e entregar às areias do tempo nossos problemas e preocupações.

Foto destaque: Marcelo Novais

Quem escreveu

Chicken or Pasta

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13 de June, 2017

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Comentários

  • Incrível relato! Obrigada pela riqueza de detalhes.

    - Fabiana
    • que bom que curtiu! :)

      - Lalai Persson

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