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Meu gerente chegou com a proposta: “Pedro, estamos precisando de alguém pra trabalhar algumas semanas num projeto no Quênia. Topa?” Foi somente o necessário pra minha mente explodir com imagens de savanas africanas populadas por zebras, elefantes, leões e girafas. Resultado: alguns dias depois, eu desembarcava em Nairobi, capital do Quênia, sem saber muito bem o que me esperava mas com muita vontade de conhecer a cidade e o país.
Antes de mais nada, vamos ser sinceros: a menos que você venha pra cá a trabalho, como eu, Nairobi provavelmente vai ser apenas um pit stop a caminho de algum dos Parques Nacionais pelos quais o Quênia é famoso. Mas se você tiver um tempinho disponível, Nairóbi pode oferecer opções bem interessantes pra um dia ou dois de safari urbano.
O Quênia é um país grande, de 44 milhões de habitantes, localizado na costa oriental da África, entre a Tanzânia e a Etiópia. Foi colônia inglesa até 1963, e por isso o inglês é uma de suas línguas oficiais. Entretanto, como você vai perceber logo que chegar, os quenianos falam inglês com níveis diferentes de sotaque, indo do charmoso até o quase ininteligível. Isso porque para eles a língua da rainha é apenas a 2ª ou 3ª língua: o Quênia tem nada menos que 44 tribos oficialmente reconhecidas, cada uma com sua língua própria. E além disso, todos falam swahili, uma mistura de línguas africanas como o banto com o árabe e pitadas de hindi, e que era a língua franca do Oceano Índico antes da chegada dos europeus. Ou, mais propriamente, e especialmente em Nairóbi, falam sheng, uma espécie de dialeto que mistura o swahili com o inglês. Em outras palavras: tudo junto e misturado, mas todos se entendem no final!
Aliás, a questão das tribos é um dos elementos definidores da vida queniana: além das línguas, elas também tem vestimentas e tradições diferentes uma das outras, e se especializam em atividades distintas. As mais conhecidas são os Kikuyu, que compõe cerca de um quinto da população e são tidos como os comerciantes e donos de capital no Quênia, e os famosos Masai, ferozes guerreiros que, embora pequenos em número, são facilmente identificados pelas vestimentas vermelhas (para saber um pouco mais sobre as diversas tribos do Quênia, vale uma visita ao Museu Nacional em Nairóbi). Existem também populações significativas de indianos, uma dádiva pra culinária queniana, e em menor número de árabes. De maneira geral, os quenianos vivem em paz e conflitos étnicos, tão comuns em países vizinhos, são relativamente raros.
A maior parte da população mora no sul do país, sendo o norte quase inabitado. Apesar de estar situado em cima da linha do Equador, o Quênia tem um clima surpreendentemente temperado. Isso porque a maior parte do país está situado num enorme platô, a grandes altitudes, próximas a 2000 mts, o que garante temperaturas sempre entre os 10 e 30ºC, o ano inteiro. A região oeste se caracteriza pelo Vale do Rift ou Vale da Grande Fenda, uma grande falha tectônica onde as placas continentais da África e da Arábia estão se separando e que corre desde a Jordânia até o norte de Moçambique. No oeste o país alcança ainda o enorme Lago Vitória, na fronteira com Uganda.
O período de chuvas começa em novembro e vai até maio, mas o principal da atividade pluviométrica acontece em março, abril e maio. A costa e as áreas de fronteira com a Tanzânia tem altitude menor e portanto são mais quentes.
Se sua imagem de África é apenas de natureza e miséria, vai se surpreender com o Quênia: o país é o maior centro financeiro da África Oriental e Central, e o Quênia foi um pioneiro na adoção de dinheiro virtual, com o serviço M-Pesa, oferecido pela Safaricom, sendo utilizado por grande parte da população no dia a dia. Aliás, a internet móvel é ótima e barata: você consegue um chip rapidamente em qualquer loja e aí é só carregar com créditos: 1GB custa USD5 e 3GB saem por USD10, válidos por um mês. Dito isso, a principal atividade econômica no Quênia é a agricultura: o país é um grande produtor de café e chá (lembrando que o café é originário da Etiópia, vizinha do país), e ambos tem ótima reputação entre os entendidos.
Pra deixar claro desde o princípio, o Quênia tem sim seus problemas de segurança, o principal deles envolvendo terrorismo. Vários grupos terroristas são ativos no país, principalmente o Al Shabaab, baseado na Somália. O país já sofreu alguns ataques de peso, sendo o principal uma explosão no Shopping Westgate em Nairobi, que matou 67 pessoas, além de diversos outros ataques menores. O governo britânico considera alta a possibilidade de novos atentados. Dito isso, a maioria dos ataques se concentra na região da fronteira com a Somália, uma área que você provavelmente não irá visitar de qualquer maneira.
Violência urbana também é um problema, especialmente nas grandes cidades. Não é a toa que a capital tem o apelido em inglês de Nairobbery. Entretanto, não é nada diferente do que estamos acostumados nas grandes cidades brasileiras, e diria até que é mais tranquilo que no geral do Brasil. Portanto, tome cuidados básicos como evitar andar sozinho por locais desertos e escuros e sempre ficar de olho em seus pertences, e você deve ficar bem. Justamente por isso, evite caminhadas noturnas nas cidades, visto que a iluminação pública costuma ser bem precária. As áreas de safári são geralmente seguras.
Os quenianos, em geral, são respeitosos com mulheres, incluindo as estrangeiras. Mas mesmo assim, viajantes desacompanhadas devem sempre ter cuidado redobrado.
O país tem poucas cidades grandes, sendo as principais a capital, Nairobi, com 3 milhões de habitantes, e Mombasa, na costa, com pouco mais de 1 milhão. Existem aeroportos nessas cidades, e recentemente foi inaugurada uma linha de trem financiada pelos chineses que tornou a viagem entre elas bem mais confortável, rápida e segura, diminuindo o tempo de transporte de pelo menos 12hs em ônibus para 4h30. É previsto um prolongamento da linha de Nairobi a Naivasha, que deve ser inaugurado até o final do ano, e de lá os planos são para estender o percurso até Uganda e Ruanda. Outros deslocamentos dentro do país, bem como dentro das cidades, são feitos nos coloridos matatus, ônibus ou vans extremamente decoradas e chamativas – uma experiência antropológica completa.
De maneira geral, os matatus que fazem rotas interurbanas são mais organizados e confortáveis que os que atendem perímetros urbanos. Muitas pessoas tem medo de abordar um matatu, mas se você algum dia já pegou uma van em alguma cidade grande do Brasil, a experiência é bem parecida. De qualquer forma, pelo menos na capital, o Uber funciona muito bem e barato – um deslocamento no centro de Nairobi dificilmente sai por mais de 3~4USD.
Tenho que confessar que não tinha tido boas experiências anteriores com a culinária da África Subsaariana, especificamente na África do Sul e em Moçambique. Felizmente no Quênia as coisas foram diferentes: encontrei uma culinária simples mas muito saborosa, fortemente influenciada pela cozinha indiana e árabe.
Comecemos pelo pior: o staple food dos quenianos, a base de quase todas as refeições, é o ugali, uma massa densa de milho branco absolutamente sem graça – pense numa polenta ou angu mineiro, só que mais seco e sem nenhum tempero. Felizmente, as coisas não param por aí. Arroz é bastante consumido, assim como chapatis, as panquecas indianas de trigo. Outros pratos comuns são o irio, um purê de batatas e ervilhas com grãos de milho, o ghiteri, simplesmente grãos de milho e feijão cozidos com vegetais, e o matoke, bananas da terra cozidas num molho de tomate.
Em matéria de carne, eles vão de boi, bode ou frango, no geral. Carne de porco não vi em lugar nenhum, imagino que por influência muçulmana. Essas carnes podem ser servidas guisadas, fritas ou assadas na brasa, uma forma de preparo extremamente popular e conhecida por aqui como nyama choma – o churrasco queniano. Bastante popular também são as tilápias, consumidas empanadas e fritas inteiras.
Os pratos costumam ser levemente picantes mas sem exageros. Acompanhamentos comuns incluem batatas fritas, feijão ou lentilha ensopadinhos como o brasileiro gosta, e couve ou repolho refogados, além da onipresente kachumbari, uma salada de tomate, cebola roxa e pimenta, as vezes enriquecida com pedaços de abacate.
Ou seja, pra brasileiros é muito fácil se sentir em casa com a comida queniana.
Além disso, a influência indiana se faz sentir com vários restaurantes típicos pelo país, de qualidade variável. Em menor quantidade, é possível encontrar também restaurantes árabes e etíopes, além de outras especialidades. O preço das refeições vai variar entre 3 e 10USD, em média, dependendo da qualidade do estabelecimento. Cerveja gelada é facilmente encontrada, especialmente a local Tusker.
Aposto com uns 90% de certeza que o motivo pelo qual você vai visitar o Quênia são os safáris. Foi nesse país que a prática do safári moderno, como o entendemos, começou – a própria palavra safári vem do swahili e significa “jornada”. Felizmente, é bastante fácil embarcar numa dessas aventuras no Quênia: o país é rico em Parques Nacionais que permitem a observação dos “Big 5” africanos: o elefante, o búfalo, o rinoceronte, o leopardo e, é claro, o leão. Além disso, a fauna queniana inclui girafas, zebras, gnus, diversos tipos de antílopes, hipopótamos, macacos de diversas espécies e muito mais. E, embora a caça ilegal ainda seja um problema em algumas partes, ao que parece o governo queniano tem conseguido preservar sua riqueza natural.
Os principais parques do Quênia são:
Existem inúmeros operadores de safári no Quênia. Ao invés de simplesmente recomendar um ou outro, me pareceu muito mais interessante usar o site Safari Bookings, que permite buscar safáris por local, duração e preço, e ainda traz reviews dos operadores. Funciona bem, e permite a você escolher o mais adequado as suas necessidades.
Mas afinal, que diabos é esse negócio de grande migração? A história toda começa no Serengueti, na Tanzânia. Os gnus (aqueles bois barbudos da África) dão a luz em fevereiro, época de chuvas e pastagens verdes. A medida que o tempo e a vegetação secam, eles começam a se deslocar rumo ao norte, atrás de novas pastagens. São literalmente milhões de gnus, seguidos por centenas de milhares de zebras, antílopes e outras espécies. Na caminho vão enfrentar fome, sede, exaustão e predadores: sim, porque as manadas são seguidas de perto por leões, crocodilos e outros bichos igualmente famintos.
O circuito todo engloba cerca de 800km, do sul do Serengueti até finalmente chegarem a Masai Mara, no Quênia, entre o final de julho e início de agosto, onde vão ficar até novembro, quando as chuvas reiniciam no Serengueti e os animais percorrem o caminho de volta. No total cerca de 250 mil gnus vão perder suas vidas ao longo dos deslocamentos.
A visão dessas enormes manadas percorrendo as savanas é uma das grandes experiências africanas, que vão fazer você se sentir no meio de um documentário da National Geographic. Se calhar de estar na região na época, não perca. É possível fazer safáris de 3 dias a partir de Nairóbi que incluem visitas aos rios Sand e Mara, alguns dos pontos mais emocionantes da travessia, onde milhares de crocodilos esperam a passagem do almoço.
O site Herd Tracker é muito interessante e faz um rastreamento das manadas, assim você pode ter certeza de onde os bichos estão a qualquer momento.
Pra entrar no clima antes de visitar o Quênia, recomendo as seguintes obras:
Paraense radicado em Lisboa. Engenheiro, cozinheiro e cervejeiro, sem ordem específica de preferência. Viajante de vocação.
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