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Em outubro de 2017 fiz uma viagem de uma semana pelo Peru, começando em Cusco e terminando em Machu Picchu. Muita caminhada, descobertas e beleza num dos países mais incríveis que já visitei. Contei sobre Cusco aqui e sobre a caminhada pelo Vale Sagrado aqui.
A falta de pesquisa prévia acabou resultando em boas surpresas, pois eu realmente não sabia o que me esperava nos próximos dias durante a minha viagem ao Peru. O pacote de cinco dias da Mountain Lodges traz uma boa amostra da beleza e história dos povos Incas. Tudo tem história, até mesmo onde parece não ter.
O nosso terceiro dia começou bem cedo (por volta das 7h) após um reforçado café da manhã. Seguimos para outro sítio arqueológico surpreendente, o Ancasmarca, que ocupa uma grande área numa coluna nas montanhas de Urubamba, ainda na região do Vale Sagrado. A chuva ameaçava cair e o fôlego logo pela manhã ainda falhava na caminhada. Éramos os únicos turistas por lá. O dia nublado deixou o local ainda mais dramático do que é.
Apesar de menos conhecido, o sítio arqueológico Ancasmarca (ou Ankasmarka) impressiona e é diferente dos demais. Ele fica 4.015 metros acima do nível do mar. Ao contrário de Machu Picchu, esta área não foi restaurada. Funcionou no passado como lugar para pouso e armazém entre Cusco e a selva, antes mesmo dos Incas chegarem. Os alimentos eram armazenados em silos arredondados, que permitiam a circulação de corrente de ar frio que os conservava. Durante o dia, os alimentos eram retirados e colocados para secarem ao sol. Tudo milimetricamente pensado.
Depois de uma boa caminhada por Ancasmarca, eu optei em conhecer Choquecancha, já no Vale dos Lares. A estrada sinuosa que leva até lá é acompanhada de uma paisagem montanhosa dramática. Linda de chorar! A maior parte da viagem que fizemos pelo Peru foi em estradas boas com paisagens espetaculares.
Coquecancha é um vilarejo remoto de tecelãs habitado por cerca de 800 famílias, onde a troca é uma das suas principais moedas. A vila fica no meio das diversas trilhas de montanhas abertas pelos incas há mais de cinco séculos. Fiquei impressionada com o trabalho minucioso e delicado das tecelãs. Uma peça grande, como uma colcha, por exemplo, pode levar um ano para ficar pronta. Elas fazem tudo, do desfio da lã ao tingimento natural feito com raízes, chás e folhas andinas. A senhora María, dona da casa que visitamos, é pura simpatia e esbanja talento e cuidado nas suas tecelagens. Dá vontade de levar tudo. É um tecido mais bonito que o outro. Pena que tudo é pago com dinheiro vivo. Me restou levar duas bolsas, que foi o que coube no orçamento naquele momento, pois tinha esquecido o dinheiro na mala.
Foi também na casa da dona María que arrisquei pela primeira vez experimentar o famoso cuy, que conhecemos como porquinho da índia. A carne é saborosa, mas ossuda e trabalhosa para comer. Para acompanhar, diversos tipos de batatas, claro, e chá gelado. O passeio não se alongou muito porque a chuva persistiu. Depois de um longo papo com as artesãs, seguimos para o nosso próximo lodge.
Imagine um lodge moderno, com a área da recepção com pé direito altíssimo, todo envidraçado e vista para montanhas de altitudes elevadas. Saímos da van babando um cadinho com a beleza do Huacahuasi Lodge, o meu favorito de toda a viagem. Mas também pudera. Cada um dos oitos quartos conta com uma jacuzzi particular na varanda com vista para as montanhas. É o hotel que a gente entra e não quer sair. Infelizmente teríamos menos de 24 horas para curti-lo. Tanto que após a calorosa recepção, todos fugiram para os seus quartos para sair só na hora da merecida massagem. Aaaaah, massagem! Depois de dois dias andando pra cima e pra baixo, dormindo pouco, uma hora de massagem foi o melhor presente que eu poderia ganhar.
O Huacahuasi Lodge fica a 3.835m de altitude. A essa altura da viagem, eu já estava bem acostumada. Tanto que já estava me dando ao luxo de tomar vinho sem ganhar uma dor de cabeça de troco.
Além da bela arquitetura, do conforto e luxo, o lodge é o primeiro projeto da Mountain Lodges of Peru que tem a comunidade local como sócia. A empresa não detém a terra, que não tem como comprar, e o vilarejo detém 25% de participação dos lucros do lodge. Ali, todos os trabalhadores são locais, se vestem nos belos trajes típicos, que com o tempo sacamos que não tem nada a ver com “se vestir pra turista ver”. Eles realmente se vestem assim no dia-a-dia e é lindo de ver a cultura ser de fato preservada.
O jantar foi caprichado com entrada, prato principal e sobremesa. Peixe, saladinhas e doces saborosíssimos, acompanhados de vinho (tem que levar, porque não tem para venda). E então o merecido descanso ao léu na hidromassagem quentinha enquanto eu tricotava dela com o meu vizinho de quarto.
Como de costume, tínhamos duas opções de passeios: um tour de três horas por Lares, que meus amigos optaram em fazer de bike (passeio comprado a parte por US$ 80), com direito a churrasco no almoço; ou uma caminhada desafiadora de sete horas. Eu e meus amigos Victor e Gaía decidimos encarar o segundo, afinal sete horas de caminha por entre montanhas deveria proporcionar um passeio de beleza tão grandiosa como a do restante do Peru. E lá fomos nós, bravos viajantes, sofrer um pouco com o sedentarismo (no meu caso e da Gaía, já que o Victor só ostentou energia do começo ao fim).
Antes da entrada no vale, paramos no vilarejo para conhecer as famílias que lá habitam. As crianças corriam para a escola e olhavam curiosas para o nosso grupo. Entramos pela primeira vez numa casa local, muito simples, com chão de terra batida e diversos cuys correndo de um lado pro outro para se esconder de nós. Ali eu me emocionei com a vida extremamente simples, onde há apenas o básico para viver.
Foi então hora de encarar a empreitada que tínhamos topado. O maior dos luxos foi ter um carregador, um burrico, para nossas mochilas. E, ainda assim, não foi fácil. A parte inicial foi a mais difícil, pois subimos uma elevação de 600 metros numa altitude de 3.835 metros. O fôlego faltou. Parei, sentei, ofeguei, chorei, não sei se de emoção por tanta beleza à minha volta ou por achar que não daria conta da subida. Mas, guerreiros que somos, chegamos ao topo com um bocado de esforço. Antes, porém, nos deparamos com um lago de água verde cristalina cercado por uma montanha aos fundos. Só essa paisagem já fez valer a pena o passeio. Ali sentamos, comemos um pouco, conversamos e tiramos um monte de fotos, tentando adiar o restante da subida inevitável.
A região é completamente vazia. Por nós passaram apenas lhamas. Em algum momento, passamos por um minúsculo vilarejo onde uma mulher, ao nos avistar, correu para dentro de casa, retornando com tecidos para vender. É assim, todo mundo tem uma “lojinha” improvisada para qualquer momento do dia em qualquer lugar do país. Infelizmente não compramos nada, apenas distribuímos comida para as crianças.
A caminhada até chegar na segunda parada foi longa e cercada de montanhas altíssimas, algumas com o pico nevado. Uma beleza sem fim. Uma poesia em forma de natureza. De repente, o céu escureceu ameaçando uma chuva para a qual não estávamos preparados. Corremos, o que não é nada fácil quando estamos em altitudes tão elevadas, mas logo alcançamos uma casa, que só existe para almoços de quem faz essa rota. O pessoal do vilarejo sai de Huacahuasi levando todos os mantimentos para preparar nosso almoço. Enquanto a gente sofre se arrastando até chegar na tal casa, eles chegam e preparam a comida, a mesa, a sobremesa. É um verdadeiro oásis construído de frente para um outro grande lago, também de tirar o fôlego de tão belo. A chuva caiu forte e ficamos um pouco mais do que o planejado, esperando por uma trégua. Eu só pensava no rapaz que levava o burrico com as nossas coisas, pois ele iria até o fim da trilha para então retornar ao vilarejo antes mesmo de anoitecer.
Continuamos nossa longa caminhada, que ficou um pouco mais fácil após essa última parada. Já no fim dela, avistamos Patacancha. Crianças começaram a passar por nós vindo da escola. Paravam animados na esperança de ganharem alguma coisa. Tínhamos doces que fomos distribuindo aos que cruzaram o nosso caminho. A chegada, por volta das 16 horas, foi efusiva. Nós três nos abraçávamos, pois no dia anterior chegamos a duvidar se conseguiríamos fazer a trilha. Foi demais! Nada como um desafio cheio de beleza.
Entramos na van e então partimos para um dos pontos mais esperados da viagem, Ollantaytambo. Eu, a mais perdida da viagem, mal sabia o que me esperava por ali. Chegamos no fim do dia com o sol se pondo lindamente atrás de um dos sítios arqueológicos que ali existem. Paramos para tentar sacar dinheiro, demos um rolezinho na praça principal, pegamos uma cerveja merecida (afinal caminhamos 7 horas!) e seguimos para o nosso K’uychi Exclusive Lodging, a 17 quilômetros do centrinho de Ollantaytambo. No caminho ainda deu para espiar o famoso hotel Skylodge Adventure Suite, onde o hóspede precisa escalar 400 metros numa via ferrata.
O K’uychi Exclusive Lodging, onde ficamos, é formado por casinhas simpáticas e aconchegantes cercadas de um belo jardim e muitas montanhas. A melhor recepção foi ainda ser levada para um bar de cerveja artesanais, onde encontramos o resto do grupo para contar o passeio que fizemos e, claro, experimentar várias cervejinhas bem geladas e pra lá de merecidas. A noite acabou com uma deliciosa pizza no hotel acompanhada do que sobrou das garrafas de vinhos que levamos.
Ollantaytambo é uma obra excepcional da arquitetura inca. É a única cidade cidade da época dos incas ainda habitada. Ela servia de pouso para os transportadores de alimentos entre Cusco e outras áreas do antigo império. A cidade é pequena, super charmosa, com ruas estreias, cafés, restaurantes e lojinhas. E bem turística.
É ali que fica um dos complexos arquitetônicos mais monumentais do antigo Império Inca. Apesar de chamarem o lugar de “fortaleza”, ele serviu mesmo como cidade-alojamento.
É surreal!!! E, para mim, foi uma grande surpresa, porque na minha ignorância, eu não sabia muito bem do que se tratava. O passeio começou cedo, pois a nossa guia Silvia queria muito mostrar um outro sítio arqueológico pouco visitado, o Pinkuylluna, que fica exatamente do lado oposto do sítio principal da cidade. A subida foi quase de joelhos de tão íngreme e estreita. Subida daquelas que a gente acha que não vai dar conta. A montanha é cravada por ruínas abandonadas que também serviram de depósitos no passado. Dali, além da surpreendente arquitetura, a vista para a “fortaleza” é, provavelmente, a melhor que se pode ter. Mas não recomendo o passeio para quem tem realmente pânico de altura.
Voltamos para o centro, onde visitamos uma outra casa de uma moradora. Ela tinha um pequeno altar com um crânio da sua avó cercado de velas e flores (ahn??). Bem assustador! No chão muitos, mas muitos, cuys. Na porta, uma tenda vendia seus produtos artesanais.
De lá seguimos ansiosos para o Santuário de Ollantaytambo, que desafia qualquer um na subida de seus imensos degraus até chegar no topo. Não foi fácil. É tudo grandioso em todos os sentidos. O sítio está em perfeito estado de conservação. Há blocos imensos de pedras, que a pergunta que fica é como ela chegou ali naquela altura. Os destaques são o Templo do Sol, com seus gigantes monolitos, o Salão Real e os Banhos de Princesa. Na parte superior fica a fortaleza com uma série de terraços de pedra lavrada, construídos para evitar possíveis invasões. São pelo menos duas horas e meia até andar por toda a área do sítio.
Por mais que muita gente só vá para Ollantaytambo porque é de lá que sai o trem de Machu Picchu, o lugar merece pelo menos uma noite para explorar a região. Não o deixe fora da sua lista.
Próxima parada? Machu Picchu numa viagem de trem a partir de Ollantaytambo. Mas essa eu conto no próximo post.
Você pode ler a parte 1 aqui: Cusco
Você pode ler a parte 2 aqui: Vale Sagrado
*Eu viajei para o Peru a convite da Mountain Lodges of Peru. Para fazer a mesma viagem que fiz, só dar uma conferida no pacote neste link.
Lalai prometeu aos 15 anos que aos 40 faria sua sonhada viagem à Europa. Aos 24 conseguiu adiantar tal sonho em 16 anos. Desde então pisou 33 vezes em Paris e não pára de contar. Não é uma exímia planejadora de viagens. Gosta mesmo é de anotar o que é imperdível, a partir daí, prefere se perder nas ruas por onde passa e tirar dicas de locais. Hoje coleciona boas histórias, perrengues e cotonetes.
Ver todos os postsgostaria d viajar 5 dias. entre 5 e 15 de abril de 2019. gostaria de trilha. vou sozinha. quero saber preços. tenho pontos
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