Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
Esbarrei sem querer em “Tudo Que É Belo” na livraria que frequento. Dei atenção por causa da capa toda preta (algo cada vez mais raro nas estantes, pode reparar) e por ser título de uma editora que acompanho, a paulistana Todavia. Peguei na mão, pulei para a quarta capa.
“Uma organização dedicada à arte de contar histórias,” explicava o texto curto logo abaixo de um “MARAVILHOSO” cravado pelo New York Times. O livro é um compilado dos vinte anos do The Moth, um projeto de contação de histórias. Nada de novo até aí – quantos encontros de contação de histórias não acontecem mundo afora?
Mas há duas coisas que tornam o The Moth um projeto especial ou, como diz o NYT, maravilhoso. A primeira é que todas as histórias, sem exceção, são reais. A segunda é que elas são contadas por quem as viveu, num palco, de frente para uma platéia, ao vivo, numa parceria desenvolvida entre autor/a da história com os diretores do programa. Daí o tagline: “true stories told live”
Em mais de vinte anos de projeto (o The Moth foi fundado em Nova Iorque em 1997 pelo romancista George Dawes Green) já foram apresentadas mais de vinte mil histórias. Essas histórias podem ser sobre sobreviver num campo de concentração ou encontrar amor verdadeiro na esquina de casa, podem vir de expatriados fugindo de zonas de guerra ou de cientistas, podem ser dramáticas e engraçadas, tristes e alegres, de pessoas de diferentes gêneros, raças e origens. Normalmente são histórias em torno de uma transformação pessoal e é esse o tema do “Tudo Que É Belo” que tem introdução escrita pelo Neil Gaiman, ele próprio um dos grandes contadores de histórias dos nossos tempos (mesmo que você não goste de fantasia) e um “moth“:
É nas mídias que o projeto brilha. Afinal, uma história pessoal narrada em primeira pessoa é conteúdo perfeito para o formato podcast (o The Moth Podcast tem mais de trinta milhões de acessos por ano) e claro, para compilar em livro: “Tudo Que É Belo” é o segundo volume do projeto, o primeiro é “The Moth: 50 True Stories”, foi lançado em 2013 e entrou para a lista de best sellers do New York Times. O The Moth também um canal no Youtube com mais de 65 mil assinantes e um programa de rádio, o The Moth Radio Hour. Todo conteúdo vem das apresentações, e essas vem de uma curadoria incessante que analisa as histórias indicadas por entusiastas do projeto. Todo mundo pode propor sua história, basta usar esse link.
Mas a essência do The Moth está na experiência compartilhada, na relação entre platéia e contador. Afinal, por melhor que seja sua história, é preciso preparo para subir num palco e contá-la. E por mais experiente que alguém seja (Salman Rushdie, David Chang e Moby, entre muitos outros, são “moths“) ainda assim é preciso coragem para contar uma história pessoal, transformadora, reveladora. É essa entrega, junto da aceitação de quem vê e ouve, que define o projeto.
Como Gaiman fala, em sua introdução, sobre ouvir o poeta e autor Edgar Oliver: “sua história pode ser lida, mas na leitura você não capta a bondade, a franqueza e a notável entonação, que é o tipo de entonação que um vampiro da Transilvânia apaixonado por teatro talvez adotasse para interpretar Shakespeare, acompanhado de movimentos de mão elegantes que enfatizam, pontuam e comentam a natureza do que ele está nos dizendo, seja sobre o gótico sulista ou sobre questões pessoais em Nova Iorque.”
Sobre o nome: “Moth” é a palavra em inglês para mariposa, criação de Dawes Green, que começou os encontros em Nova Iorque tentando recriar a atmosfera das tardes de verão no estado Georgia, onde nasceu e cresceu, quando as mariposas eram atraídas para a luz na varanda de sua casa, onde ele e amigos se reuniam para contar histórias.
Veja mais
Cynthia Riggs: Falling in Love at 81
Sam Shepard: You Can Lead a Horse to Water
Cathy Olkin: All These Wonders
Onde comprar: nas principais livrarias do país ou direto no site da Editora Todavia.
*Foto do destaque: Editora Todavia
Gaía Passarelli é paulistana de nascença, autora do livro "Mas Voce Vai Sozinha?"(Globo, 2016) e do blog How to Travel Light. Encontre-a em gaiapassarelli.com
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.