Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
A notícia demorou para chegar. William Onyeabor faleceu no último dia 16, mas a imprensa só soube dois dias depois – uma eternidade nos dias de hoje. Mas esses dois dias não são são nada considerando-se que o mundo pouco soube dele nos últimos 32 dois anos, quando ele trocou a genialidade de sua música por uma vida cristã e reclusa. Desde 1985, ele se recusava a dar qualquer entrevista, e mesmo durante seus anos de intensa produção criativa, pouco se sabia de sua real história. A única certeza que se pode ter é que perdemos um dos gênios mais prolíficos da música mundial. Mas afinal, quem é William Onyeabor?
Nascido em 1946 em Enugu, no sul da Nigéria, ele veio de uma família pobre. Conseguiu juntar dinheiro na juventude para viajar para a Europa, e foi estudar fabricação de discos na Suécia. De volta ao seu país no fim dos anos 70, ele já tinha conseguido montar seu próprio estúdio, sua gravadora, sua fábrica de prensagem de discos e uma produtora de filmes, a Wilfilms. Em 1977 ele gravou seu primeiro disco, Crashes in Love, sobre o qual já paira o primeiro grande mistério: a lenda diz que esse disco era na verdade a trilha sonora de um filme homônimo, mas que nunca ninguém assistiu.
Entre 1977 e 1985 ele gravou nada menos de 9 discos sozinho. Suas músicas são viagens psicodélicas incrivelmente inovadoras e originais. São longos hinos que misturam funk, afrobeat, muitos sintetizadores e uma ácida crítica social. É impossível ficar indiferente à sua música – assim como é impossível ficar parado. Outras lendas rodeiam sua biografia: ele teria estudado direito em Oxford, ou talvez cinema em Moscou. Ninguém sabe ao certo, pois sobre nada disso existe qualquer registro. Mas nada supera sua enigmática criatividade, que inventou sons que grandes profissionais da música ainda sonham em alcançar mesmo décadas depois, em lugares muito mais cosmopolitas que o interior da Nigéria.
Seus grooves finalmente ficaram conhecidos para além de Enugu em 1985, com o lançamento do seu último álbum Anything You Sow, e os hits When the Going Is Smooth and Good e Atomic Bomb. O sucesso, então, foi bem regional, mas considerando a situação econômica do continente africano na época, e a produção totalmente artesanal de tudo, pode-se dizer que ele virou um astro da música. Mas foi exatamente aí que sua vida virou de ponta-cabeça.
Sem fazer um show na vida sequer, Onyeabor descobriu a religião. Virou um cristão fervoroso e se recolheu completamente ao anonimato em sua Enugu. Desde então ele praticamente se recusou a falar com a imprensa, e se dedicou exclusivamente a seus muitos negócios, com os quais ele dava emprego para muita gente da comunidade. Ele ainda foi pastor, diretor do time de futebol da cidade, presidente da União dos Músicos de Enugu, e ainda foi condecorado como West African Industrialist of the Year no fim dos anos 80. Na sua cidade natal, era conhecido apenas como The Chief.
A música de William Onyeabor saiu do ostracismo em 2010, quando Better Change Your Mind entrou na compilação Nigeria 70, da gravadora Strut. A partir disso, o interesse pela sua obra cresceu por todo o mundo, e explodiu de vez com a criação da Atomic Bomb! Band, um projeto que juntou um monte de figurões para regravar músicas de Onyeabor, e fazer a tão esperada turnê, que ele nunca fez. Os integrantes da banda mudavam sempre, e o dream team contou com David Byrne, Damon Albarn, Jamie Lidell, integrantes do LCD Soundsystem, Hot Chip, Beastie Boys, Bloc Party, Blood Orange, The Rapture, Gotye, e muitos outros.
Tudo – ou pelo menos o pouco – que sabemos sobre William Onyeabor hoje deve-se a Eric Welles-Nyström, do selo Luaka Bop (de David Byrne), e ao jornalista Uchenna Ikonne. Ambos tentaram diversas, e infrutíferas, vezes conversar com ele, e tentar arrancar pedaços de sua história, mas descobriram que ele era paranóico com sua privacidade, escondendo detalhes de sua vida até das pessoas da comunidade de Enugu. Na primeira ligação de Nyström, Onyeabor respondeu: ‘Eu só quero falar sobre Deus. Eu não quero voltar àquele tempo.” E desligou.
Sua última ‘aparição’ foi uma surpreendente entrevista à BBC em 2014, em que ele afirmou que não tinha nenhum interesse em se apresentar ao vivo, mas que estava trabalhando em composições novas. Com a sua morte, é bem provável que nunca tenhamos a chance de escutar esses novos trabalhos. Agora, só sobrou a sua obra extraordinária e todos os boatos e lendas que cercam esse verdadeiro mito do funk nigeriano.
Para o Renato, em qualquer boa viagem você tem que escolher bem as companhias e os mapas. Excelente arrumador de malas, ele vira um halterofilista na volta de todas as suas viagens, pois acha sempre cabe mais algum souvenir. Gosta de guardar como lembrança de cada lugar vídeos, coisas para pendurar nas paredes e histórias de perrengues. Em situações de estresse, sua recomendação é sempre tomar uma cerveja antes de tomar uma decisão importante. Afinal, nada melhor que um bom bar para conhecer a cultura de um lugar.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.