Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
Reza a lenda que a Choperia Pinguim tinha um duto subterrâneo que levava o chope gelado direto da antiga Cervejaria Antárctica para as torneiras. Não à toa, o Pinguim se tornou um dos bares mais famosos do país. A história dos dutos pode ser mentira, mas a qualidade das tulipas que circulam por ali trincando desde 1937 é uma verdade absoluta e deliciosa. Nesses 80 anos, pelo menos uma visita ao bar para quem vai a Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, virou roteiro obrigatório.
Nos últimos 20 anos, entretanto, Ribeirão acabou se tornando um verdadeiro polo cervejeiro brasileiro. O Pinguim agora divide espaço – e copos – com várias cervejarias artesanais que se espalharam pela cidade. Entre elas estão marcas como Lund, Invicta, SP330, Pratinha, Klaro Chopp e Walfänger. O movimento é tão forte por lá que junto veio uma enxurrada de bares como o brewpub – bar que produzem a própria cerveja – Weird Barrel, e a Cervejaria Nacional, bares especializados como o Bier Garten, a primeira cooperativa cervejeira do Brasil (Cooper Breja), e ainda sua própria edição de um dos maiores eventos dedicados à loira, o Slow Brew.
Deu para ver que cerveja é assunto bem sério para os ribeirão-pretanos. Mas além do famigerado Pinguim, uma outra cervejaria pode ser considerada ‘culpada’ por todo esse legado. A Cervejaria Colorado é uma das primeiras e principais cervejarias artesanais do país, e ela não poderia ter surgido em outro lugar. Era 1995 quando Marcelo Carneiro, fundador da fábrica, veio do Rio de Janeiro para o interior paulista com um objetivo: criar uma cerveja verdadeiramente brasileira, que valorizasse nossa cultura, nossa culinária e nossas tradições.
Corta para 2017, e a Colorado acabou de passar por um processo de compra por parte da Ambev, que faz parte do maior grupo de bebidas do mundo. Eu sei o que você está pensando, porque eu pensei também: ‘Ixx, daí veio a grande companhia e tirou toda a graça da Colorado!’ Sim, com a fusão, a cervejaria cresceu para caramba (passou de 120 mil litros por ano para 500 mil). Sim, a fábrica se modernizou muito. Mas a essência artesanal da Cervejaria Colorado se manteve. E foi para provar isso, que fui convidado para ir conhecer toda a história, a fabricação e os valores da marca in loco.
Quando se compara o pequeno galpão dentro da cidade que a Colorado ocupava e o enorme espaço atual à beira da Rodovia Anhanguera, dá para perceber que o investimento em equipamentos e tecnologia foi grande. O salão principal é ocupado por dezenas de tanques gigantes que são vigiados diariamente pelo Laercio. Ele é o mestre cervejeiro e homem de confiança do Marcelo, que teve que aprender tudo na unha lá desde o começo, vinte anos atrás. Ele não só continua lá de olho em toda a produção, como é quem faz pessoalmente as visitas guiadas. Tipo ciúme de pai, sabe?
Em um espaço menor, eles montaram um pequeno laboratório, onde o objetivo é deixar a criatividade rolar solta. Lá são feitas as várias experimentações com novos ingredientes que podem um dia acabar nas prateleiras dos supermercados. É desses testes que saiu a ideia de usar os ingredientes brasileiríssimos usados na linha principal da Colorado: a pilsen Caium leva mandioca; a IPA Indica leva rapadura; a weiss Appia leva mel; e a porter Demoseille leva café. A busca por novidades levou a dupla a explorar a biodiversidade das frutas locais na nova linha de cervejas frutadas, que traduz o mote da marca: ‘Desiberne’. Assim surgiram as novidades de caju (Nassau), graviola (Murica), uvaia (Eugênia) e o trio de berries tupiniquins amora-do-mato, cereja-do-rio-grande e grumixama (Rosália). Provei todas, e é uma melhor que a outra.
O trabalho de pesquisa desenvolvido em cima não só da cerveja, mas das origens históricas, das lendas e dos aspectos científicos de cada ingrediente está presente em todos os rótulos. A escolha desses produtos na elaboração da cerveja também não é acidental. Além de conferir um sabor único, eles ainda são comprados de produtores locais, ajudando na economia regional. E também acabam fazendo uso daquelas frutas que não são exatamente bonitas e adequadas para se vender, mas são perfeitas para consumo. Os rótulos trazem imagens e informações sobre alguns desses produtores, para humanizar ainda mais a cadeia produtiva e valorizar o trabalho daqueles que não estão necessariamente na empresa, mas são peça essencial da cerveja realmente artesanal.
E não é conversa de departamento de marketing, não! Fomos conhecer o sítio do Seu Zé e da Dona Maria, que aparecem no rótulo da cerveja Indica, minha favorita. O casal que destina toda sua produção artesanal de rapadura para a fábrica. Nos levaram para ver todo o processo, desde o vistoso canavial até a hora de enformar da rapadura já pronta. Dona Maria conta que a demanda é tanta, que tiveram que apertar os cintos e investir em maquinário novo, mas que em menos de dois anos já estava tudo pago. Dava para ver o orgulho estampado na cara do casal.
Eles ainda lançaram uma campanha ‘O Sabor é Cego’ para estimular a valorização da biodiversidade e do consumo de frutas ‘feias’ mas próprias para o consumo. Junto rola uma plataforma de crowdfunding, no site Benfeitoria, para apoiar três projetos que usam frutas: Maria Preta Jabuticaba (Campinas), Clube de Mães Maria de Nazaré (Amazônia), e Manacá Orgânicos (Rio de Janeiro).
A visita acabou com um jantar bem animado montado no meio da cervejaria. Entre os toneis gigantes, a comilança foi toda harmonizada com as criações da própria Cervejaria Colorado, claro. Infelizmente o jantar foi um evento único, e você não vai poder curti-lo como eu. Mas se quiser visitar a fábrica, dá para agendar pelo site. Logo eles também vão montar um bar para degustação lá mesmo no galpão. Enquanto ele não sai do papel, as cervejas da Colorado podem ser apreciadas no Cervejarium, em Ribeirão, nas unidades do Bar do Urso em São Paulo, ou em vários mercados do país.
Cervejaria Colorado – Fábrica e Loja
Rodovia Anhanguera, km 308 + 300 metros – Bairro Residencial Cândido Portinari
Ao lado do Atacadão e em frente ao CDD Ambev – Ribeirão Preto
Cervejarium
Av. Independência – Alto da Boa Vista
Ribeirão Preto – SP
(16) 3911 4949
Bar do Urso
Rua Mourato Coelho, 23 – Pinheiros
Rua Traipú, 156 – Perdizes
Rua Itapura, 826 – Tatuapé
(11) 3562-7010
Para o Renato, em qualquer boa viagem você tem que escolher bem as companhias e os mapas. Excelente arrumador de malas, ele vira um halterofilista na volta de todas as suas viagens, pois acha sempre cabe mais algum souvenir. Gosta de guardar como lembrança de cada lugar vídeos, coisas para pendurar nas paredes e histórias de perrengues. Em situações de estresse, sua recomendação é sempre tomar uma cerveja antes de tomar uma decisão importante. Afinal, nada melhor que um bom bar para conhecer a cultura de um lugar.
Ver todos os postsCamarada, eu farei a visita. Li o Termo de Visita e não disseram nada ao uso restrito de cameras fotograficas. Então pode né? Mesmo sendo DSRL?
André, não sei qual é a política de fotos na visita. Acho que não vai ter problema nenhum. Em todo caso, recomendo dar uma ligada lá para confirmar antes de ir.
Vivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.