Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
Há tempos eu planejava conhecer a Conceição Discos, misto de loja de vinil, restaurante e bar. O máximo que consegui foi chegar na porta quando passei por lá com um bloco de carnaval. Os horários de funcionamento nunca bateram com os meus e quando batia, eu esquecia do meu plano original. Finalmente consegui ir de supetão. Feriado, cidade vazia, por que não? Liguei, aberto, almoço rolando, corre senão a comida acaba. Fui! Ah, e que boa surpresa me aguardava.
Cheguei no local um pouco deslocada. A impressão que tive era que todos ali batiam cartão no local. Não sabia se era possível pedir cadeira no balcão ou entrar para uma fila de espera por uma das 3 mesas disponíveis. Não sabia nem como fazer para pedir comida ou bebida. Zanzei pra cá e pra lá enquanto observava as pessoas comendo em pé, sentadas na calçada, no sofá ou em qualquer canto livre do restaurante-bar-loja segurando um prato do famoso arroz com pato, a grande pedida do lugar, mas raramente servido, que tinha acabado de sair. Meu dia de sorte.
O serviço é uma confusão até você entender como a casa funciona e então tudo rola numa boa sem stress. A (ou é O?) Conceição Discos é assim: vá sem pressa e de bom humor, melhor ainda se não estiver com muita fome, mas vá para comer o arroz do dia independente de qual for. A impressão é ter sido convidado para almoçar na casa de um amigo que convidou amigos de turmas diferentes. Enquanto ele cozinha para todos, você começa a interagir com os amigos dele acompanhados de uma boa trilha sonora que sai da vitrola.
As pessoas chegam, gritam “oi” pra Thalita, a amiga dona da casa. Elas procuram alguém que pode trazer uma cerveja ou um pão de queijo ou um pão de queijo com ovo frito e pernil ou uma tortinha crocante com salada, para tapear a fome enquanto o arroz com pato não sai.. A Thalita, toda sorridente e serelepe entre pia e fogão, corta cebolas, temperos, prepara o arroz, vai até o balcão dar oi para o amigo que acabou de chegar, enquanto outro acena com a cabeça sinalizando que está na espera do prato principal. É o burburinho dentro e fora do balcão.
Passou-se uma hora até a nova panelada de arroz com pato ficar pronta. A essa altura vários pães de queijo com ovo frito e pernil (já viu combinação mais inusitada?) desfilavam na minha frente para os mais famintos. Até que finalmente todos voam da calçada ou de onde estão e se acotovelam no balcão. O arroz com pato ficou pronto. Como todos souberam eu não tenho a menor ideia. O meu medo mesmo era não sobrar para mim, que estava quase roendo as unhas de tanta fome. A Thalita no maior sorrisão acenando pra cá e pra lá, dando oi, mandando beijos, dizendo “que bom que você veio”, enquanto vai misturando num pequeno espetáculo o pato, o arroz, o molho numa panela gigante, ao mesmo tempo que separa pratos e talheres. O prato ninguém serve, somente ela. Alguns gritam “Thalita, quero o meu com ovo” e outros entoam que querem ovo também, incluindo eu. Ela larga a panela e corre de volta para o fogão, separa os ovos, coloca uma frigideira gigante no fogo e vai quebrando ovo por ovo enquanto pega um chopp e serve alguém que acabou de gritar que está sem cerveja. A Thalita é a pessoa mais dinâmica que eu já vi ao vivo numa cozinha. Ela cozinha, serve os pratos, a bebida, frita ovos, conversa, dá uma dançadinha.
Finalmente ela começa a servir os pratos. O maior mistério é como ela consegue guardar a ordem dos pedidos, mas ela vai chamando pelo nome sem olhar nenhum papel, até porque ela não anotou nada. E chama, joga o ovo em cima do arroz com pato e serve. Quando a panela está quase na metade, ela pára e volta a panela no fogo para ninguém comer comida fria. Eu já estou quase debaixo do balcão rolando de ansiedade. Finalmente ela olha pra mim, sorri, faz o prato e me serve. Eu quase me ajoelho, em especial após a primeira garfada. Valeu toda a espera e a ansiedade. Tentei comer devagar para não acabar. Quando acabou, eu sorri para o Ola e acabei ainda roubando 3 garfadas do prato dele. E quase ajoelhei de novo para agradecer a Thalita pelo prato tão saboroso e bem preparado. É comida de mãe de tanto carinho que eu a vi colocando na panela entre um tempero e outro.
Aos poucos os ânimos acalmam e o lugar dá uma esvaziada. Já são quase 6 da tarde. Chegam alguns atrasados que até cogitam ir embora porque queriam sentar numa mesa e comer tranquilamente, mas eu tento convencer “vá por mim, é um dos pratos mais saborosos que já comi”. Pedimos o delicioso pudim de leite para fechar o almoço com chave de ouro. A conta? R$ 60,00 por cabeça incluindo 2 chopps coruja para cada, meio pudim (já que dividimos) e o delicioso arroz com pato. Choppinho? Coruja. Cervejas? Todas artesanais.
A Conceição Discos tem menos de 1 ano. Abriu em junho do ano passado após a chef Thalita Barros passar por outras cozinhas e decidir ter a sua própria. O lugar é moderno com alguns móveis vintages espalhados, discos para vender, uma vitrola, estante com cervejinhas artesanais à venda, uma geladeira antiga com bebidas e apenas 3 mesas, uma delas comunitária. O balcão é grande e é o lugar mais legal pra ficar. Em frente a ele tem um sofazinho para 2 pessoas e a calçada, onde as pessoas sentam no degrau e por ali ficam. Não tem menu fixo para o prato principal que sempre será um arroz do dia, além do famoso pão de queijo recheado com pernil a cavalo, especialidade da casa. O preço é justo.O arroz do dia custa R$ 35,00. O atendimento é lento, mas não tira o bom humor, porque todo o restante é incrível. É o lugar onde a experiência transcende a boa comida e ambiente. É observar a Thalita cozinhar, as meninas correrem pra cá e pra lá tentando dar conta do atendimento sempre com sorriso no rosto e pedidos de desculpas pela demora, por isso vá sem pressa. É lugar obrigatório para pelo menos uma parada nessa frenética São Paulo. Eu entendi o porquê de todos parecem bater cartão por lá, porque você sai querendo voltar.
Como li por aí: é amor em forma de comida.
Conceição Discos
Rua Imaculada Conceição, 151 – Vila Buarque. Tel.: 3477-4642
Terça a sábado, das 10 às 21h
Lalai prometeu aos 15 anos que aos 40 faria sua sonhada viagem à Europa. Aos 24 conseguiu adiantar tal sonho em 16 anos. Desde então pisou 33 vezes em Paris e não pára de contar. Não é uma exímia planejadora de viagens. Gosta mesmo é de anotar o que é imperdível, a partir daí, prefere se perder nas ruas por onde passa e tirar dicas de locais. Hoje coleciona boas histórias, perrengues e cotonetes.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.