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Entre 1922 e 1929, o comerciante português Francisco de Castro se lançou em uma empreitada maluca sozinho: em um terreno com declive acentuado, onde passava o riacho Itororó (será o da música?), começou a construir um conjunto de 37 casas para aluguel e um palacete para si próprio. O intuito da construção da Vila Itororó era a ocupação do espaço público pela comunidade, segundo seu idealizador. Para não estourar o orçamento, Castro comprou todas as sobras de construções que estavam sendo demolidas, como o Teatro São José, que ocupava o terreno hoje do Shopping Light até pegar fogo. De lá saíram as 18 colunas de sua casa, bem como os vitrais e algumas esculturas de leões e gárgulas. A vila também recebeu a primeira piscina privada de uso público da cidade, abastecida com água de uma mina que havia ali.
A época de ouro da Vila Itororó acabou nos anos 50, quando Castro faleceu sem deixar herdeiros. Seus bens foram leiloados para credores, e como ela já estava começando um processo de degradação, acabou doada para o Hospital Benenficiente Augusto de Oliveira Camargo, que continuou a cobrar o aluguel dos moradores, mas não conseguiu evitar a formação de um cortiço. O Sesc chegou a negociar a compra do terreno para instalação de um centro de convivência cultural nos anos 70, mas a ideia não vingou. No final dos anos 90, o HAOC deixou de cobrar os aluguéis e a vila ficou entregue ao destino.
Agora a vila voltou a ser notícia graças ao anúncio de um projeto de restauração e conversão em centro cultural e realização da Prefeitura de São Paulo, Ministério da Cultura e Governo Federal, com co-patrocínio da Lei de incentivo à Cultura e a iniciativa privada. O projeto final não está totalmente definido, e demorou muito a ser elaborado, justamente por causa da polêmica causada entre os interesses do poder público e dos moradores da vila. O decreto de desapropriação saiu em 2006, e as primeiras das 80 famílias a sair de lá se foram apenas em 2011. Mas entre processos de usucapião, intervenção da polícia militar para efetivar o despejo e acusações de higienização, o restauro da vila está começando.
O lado bom desse projeto, pelo menos, é que a Secretaria da Cultura resolveu abrir as portas literalmente para que a população se envolva e ajude a definir o destino da área. O projeto Vila Itororó Canteiro Aberto está preparando intervenções e eventos no local durante a obra com ajuda do coletivo transnacional ConstructLab, que vai montar de forma colaborativa módulos e equipamentos móveis para criar espaços de leitura, descanso, lazer, reuniões e assembleias até a finalização da obra. Além disso, o galpão de abriga o canteiro estará aberto para o público em determinados horários para visitas e oficinas.
O primeiro evento, no último dia 10, marcou a inauguração do espaço cultural temporário e o início da obra de restauro. Foi uma grande festa, também colaborativa. Quem quisesse poderia aparecer, e os organizadores pediam que cada um trouxesse comes e bebes para compartir. Lá tinha música, dança, brincadeiras, lojinhas, e muita gente que viveu na vila a vida toda. Nós estivemos lá e conversamos com algumas famílias. Elas nos contaram como tinha sido a evolução da vila desde a infância, da vida da comunidade que vivia ali, os bons e os maus momentos. Todos tem saudades e ainda estão se adequando à nova vida em apartamentos do CDHU. Mas uma unanimidade entre eles é a felicidade de saber que, mesmo não morando, vão poder visitar e frequentar a vila quando a obra estiver pronta. Nós, que vemos de fora, não podemos afirmar até que ponto a Prefeitura acertou até agora nesse processo para recuperação das construções tombadas, mas uma coisa é certa: o processo de restauro da Vila Itororó vai marcar definitivamente a participação popular na construção de equipamentos públicos da cidade.
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Foto de destaque: Lucas Verzola
Para o Renato, em qualquer boa viagem você tem que escolher bem as companhias e os mapas. Excelente arrumador de malas, ele vira um halterofilista na volta de todas as suas viagens, pois acha sempre cabe mais algum souvenir. Gosta de guardar como lembrança de cada lugar vídeos, coisas para pendurar nas paredes e histórias de perrengues. Em situações de estresse, sua recomendação é sempre tomar uma cerveja antes de tomar uma decisão importante. Afinal, nada melhor que um bom bar para conhecer a cultura de um lugar.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.