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Spin the Globe: Daniel Nunes

Quem escreveu

Gaía Passarelli

Data

26 de November, 2014

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As pessoas que mais viajam no mundo são as que trabalham com isso, como contratados de companhias aéreas. Em seguida vem pessoal executivo e gente do entretenimento. Mas normalmente essas pessoas mais voam do que realmente viajam. Diferente de travel writers, nome cool para escritores e jornalistas de viagem. Essas pessoas acumulam milhas, sim, mas para viver e relatar experiências que leitores como eu e você vamos sonhar em recriar depois. É uma vida e tanto, cheia de macetes para viajar melhor, aprendidos na prática. Por isso procurei um desses profissionais aqui do Brasil para contar como é.

Daniel Nunes escreve para revistas impressas como a National Geographic Brasil e Viagem & Turismo, e também mantém um blog chamado SameSame. Tem seu nome na capa de cinco livros diferentes, inclusive um do fotógrafo Araquém Alcântara. Só esse ano esteve no Egito, na Etiópia, Uruguai, Recife, Olinda, Índia, Tailândia, Nova York, Roma, Islândia, Nova Zelândia. Respondeu essa entrevista enquanto voava para Berlim e antes de virar o ano no Equador, ainda ia passar por Viena. Parece incrível e é – mas também é um trabalho duro, como ele confirma nas repostas abaixo.

Na Nova Zelândia. E esteja pronto em 48 horas!
Na Nova Zelândia. E esteja pronto em 48 horas!

CoP: Como você começou a escrever sobre viagem e turismo?

Daniel Nunes: Quando estava em dúvida sobre qual seria minha profissão, fui trabalhar como office boy da Editora Abril (sempre curti comunicação, mas também gostava de arte, de teatro etc). Foi trabalhando na minha primeira revista, a Quatro Rodas, aos 18 anos, que folheei pela primeira vez na vida revistas como National Geographic, Condé Nast Traveler, Travel & Leisure. E decidi que queria fazer aquilo da minha vida. Prestei vestibular pra jornalismo e entrei. Minha primeira matéria em 1991, aos 19 anos, no segundo ano da PUC, foi uma rota de restaurantes que serviam frango com polenta na Avenida Demarchi, em São Bernardo. Curti a ‘viagem’, a comilança, a leveza da pauta, o texto experiencial. Antes de me formar eu já tinha rodado mais de 10.000 quilômetros de carro pelo Brasil escrevendo sobre turismo rodoviário para a revista. Isso incluiu o rolê litorâneo da BR-101 de São Paulo a Mossoró, na divisa de Rio Grande do Norte, e um bate-e-volta SP-Ilha do Marajó/Pará, via Belém-Brasília.  Foi nessa época que o suplemento “Viagem e Turismo”, da Quatro Rodas, ganhou vida própria e virou uma publicação independente, a maior do segmento no país. Vi a revista nascer.

Você escreve principalmente para revistas impressas, mas também tem blog. Quais são as diferenças editoriais que você vê nos dois formatos?

Sim, nesses 23 anos escrevi centenas de matérias em revistas como National Geographic, Discovery, Viagem e Turismo, Os Caminhos da Terra, GQ, Travesias (México), Tam nas Nuvens, Red Report (TAM), Revista da Azul, Próxima Viagem. Escrevi sete livros, seis guias – tudo ligado a viagem. Já o Same Same nasceu há três anos como um portfólio digital e só em 2014 passou a ser alimentado como um blog. A mídia impressa permite escrever mais longamente, com mais tempo, quase sempre de forma impessoal (com textos em terceira pessoa), trabalhar coletivamente (com editores de arte, infografistas, revisores, cartógrafos e fotógrafos) e parece despertar mais credibilidade do que meus trabalhos virtuais. No formato online, os textos curtos têm mais leitura que os longos, os posts experienciais (em primeira pessoa) e instantâneos ganham mais likes e o travel writer trabalha sozinho: produz e edita suas próprias fotos, checa dados e se vira para incluir, por exemplo, um mapinha no post, uma marca d’água na foto, uma galeria de fotos com filtro.

Você tem feito workshops sobre travel writing, certo? Como é, sobre o que exatamente você fala?

Descobri que a grande vantagem de me assumir blogueiro é que passo a ser respeitado por meu nome e não pela grife da da publicação para quem trabalho. Vale minha capacidade de produzir conteúdo de viagem criativo e confiável. E com uma vantagem: tenho a experiência de jornalista profissional, que falta à maioria das centenas de blogueiros de viagem mundo afora. Como mostram blogs badalados como FHits, o mercado acaba transformando os blogueiros em celebridades de um segmento, de um mundinho. Há anos costumo reunir amigos informalmente para contar histórias de viagem, e essa experiência acabou rendendo quatro convites diferentes, nos últimos dois meses, para palestrar. Em uma delas compartilhei os desafios para monetizar a carreira de travel writer independente. Depois contei da Islândia para agentes de viagem que começavam a vender esse destino. A última, na USP, contou dessa passagem do impresso pro digital. Ensino técnicas pra incorporar informação atraente na hora de descrever uma praia deserta ou um hotel boutique, conto de aprendizados como o de fazer bom uso da tecnologia (timing para posts, também em Facebook, Instagram, Trip Advisor) A real é que ensino melhor o que mais preciso aprender. Mas o que mais faz sucesso são os “causos” de frequent traveler: roubadas da estrada, voos perdidos, imprevistos sem fim, luxo inesperado e micos, claro. As pessoas gostam de historinhas.

Daniel nos remansos do Kerala: ê vidão!
Daniel nos remansos do Kerala: ê vidão!

Só esse ano você esteve na Etiópia, Itália, Tailândia, Índia, Nova Zelândia, EUA… (que mais?). Qual o item que nunca pode faltar na mala, não importa o destino?

De dezembro pra cá foram: Egito, Etiópia, Uruguai (réveillon), Recife e Olinda (pro carnaval ;-), Índia (segunda vez), Etiópia de novo, Tailândia (também segunda vez), EUA (Nova York), Itália (Roma), Islândia (segunda vez), Nova Zelândia. Até o fim do ano tem ainda Alemanha (Berlim), Áustria (Viena) e Equador. A mala, que tento fazer cada vez menor, inclui sempre uma mochilinha de ataque para passeios de um dia, adaptador elétrico para o país do destino, sunga e óculos de natação (usei até na Antártica e em hotel chinfrim), a nécessaire pré-feita (tenho uma pra viagem curta e outra pra longa, cada uma com suas escova, seu desodorante, seu protetor solar). Mas macete mesmo tem de ter a bolsa de mão, que é a que sobrevive quando a companhia aérea extravia a sua principal. Obrigatórios: tapa-olhos, aquele travesseiro de pescoço inflável (e lavável), um fone de ouvido power com ipod recarregado e silenciador (para neutralizar o desconforto de um bebê berrando no assento ao lado), lenço de papel, bloquinho (e duas canetas), cartão de visitas, livro/revista, casaco leve que não amasse, recarregador do celular, protetor labial, garrafinha de água (comprada depois do raio x), escova e pasta dental e um kit de cuecas, meia, shorts e camiseta.

Sei que sua viagem pra NZ foi do tipo “esteja pronto em 48h”. Como você faz para estar pronto para atravessar o mundo com tão pouco tempo de aviso?

Tudo depende de como está a minha agenda de entrega dos trabalhos. Nesse caso, dava certinho para terminar o texto pendente no voo longo. Básico é ter passaporte e visto para os EUA válidos. Gosto de ter uns 500 dólares e/ou euros em casa para emergências. Tenho a nécessaire pré-arrumada, vizinhos amados que regam minhas plantas, aqueles tokens do banco que permitem pagar contas à distância. Mais importante que tudo: não tenho filhos. Isso dá uma independência enorme.

Rodar o mundo faz você enxergar o Brasil e São Paulo de outra forma? Como?

O mais rico de viajar, para mim, é a experiência da diferença cultural. Na diferença descobrimos que somos todos iguais – muda só a comida que a gente come, a roupa que veste, o nome que damos ao Deus para quem rezamos na hora do perrengue. E de longe a gente enxerga nossa cidade e nosso país de forma mais ampla, crítica. Hoje acho SP insalubre ao extremo, mas cada dia mais cosmopolita e rica culturalmente. E o Brasil, de gente e natureza tão lindos, está a anos-luz de desenvolver sua hospitalidade no nível até de países vizinhos como Peru e Chile.

Profissão repórter: em Mamirauã, Amazonas
Profissão repórter: em Mamirauã, Amazonas

Qual foi seu maior “vanessismo” (alguma loucura ou mancada que deu muito errado)?

Ui, essa palavra eu nem conhecia! Roubadas: aceitei a responsa de ser anfitrião de um leitor da Quatro Rodas que tinha ganho uma viagem pra assistir a Fórmula 1 na Austrália, em Adelaide. A cidade estava cheia, topei que nos hospedassem em uma casa de família. Chegando no aeroporto, só existia a plaquinha com o nome do meu convidado, um senhor nipo-recifense professor de matemática kumon. Com um detalhe: dizia, não lembro bem se o nome era esse, “Sr. e Sra. Murakami”. Ou seja: erraram na reserva e a Sra. Murakami era eu! O casal que nos recebeu só tinha um quarto com cama de casal. Deixei meu novo amigo íntimo dormindo na cama e me ajeitei, sobre um cobertor no carpete, dormindo no chão duro. Fora isso? Quando eu estendo dias de passeio em uma viagem de trabalho sempre resta algum trabalhinho na hora do lazer: nunca esqueço de ter feito uma entrevista com o Emerson Fittipaldi a partir do único telefone que existia na recepção de um albergue baladeiro em Venice Beach, Califórnia. Outras: fui obrigado a ensinar uma família mexicana anfitriã inteira a sambar (sendo que eu não sei sambar); vi minha expedição de 4 amigos pela Índia se pulverizar em 4 viagens individuais depois de notarmos incompatibilidades de desejos; me empolguei tanto numa balada em Sydney que passei horas para descobrir o hotel onde eu estava (e até hoje não lembro como fiz). Cansei de acampar com chuva entrando na barraca. E o trânsito da Marginal já me fez perder dois voos internacionais.

Se fosse pra largar tudo e mudar de vez para algum lugar, para onde você iria?

Para uma temporada, voltaria a viver em Nova York e experimentaria Rio, Vancouver, San Francisco, Paris, Barcelona e Cidade do México. Para sempre? Meu sítio com floresta e cachoeira em Juquitiba.

Mais sobre o Daniel
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Quem escreveu

Gaía Passarelli

Data

26 de November, 2014

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Gaía Passarelli

Gaía Passarelli é paulistana de nascença, autora do livro "Mas Voce Vai Sozinha?"(Globo, 2016) e do blog How to Travel Light. Encontre-a em gaiapassarelli.com

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