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Quando uma viagem nos causa curto-circuito

Quem escreveu

Lalai Persson

Data

28 de April, 2014

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Uma amiga retornou recentemente do Atacama com os planos de vida totalmente diferentes de quando foi. O lugar mexeu com ela, que agora quer comprar uma casa por lá e dividir sua vida entre São Paulo e o deserto.

Eu gosto de viagens assim, que nos causam um certo incomodo. Gosto quando minhas viagens:

– causam curto-circuito no cérebro
– viram a nossa vida de ponta cabeça
– mostram o quanto nossas vidas muitas vezes é medíocre

Se uma viagem não me causar nenhuma pequena seqüela, é porque não viajei direito.

Não pude deixar de meditar um pouco acerca das viagens que fiz e as que me causaram cada um desses itens. O primeiro mochilão com certeza tirou minha vida do eixo, tanto que ao invés de retornar ao Brasil um mês após ter partido, voltei 6 meses depois completamente diferente, incluindo mudança radical no visual. Saí daqui com os cabelos na cintura e voltei com eles super curtos. Foi o jeito que encontrei para extravasar a mudança que estava rolando dentro de mim.

Berlim por Semmick Photo - shutterstock.com
Berlim por Semmick Photo – shutterstock.com

E claro, colecionei viagens e experiências que continuaram (e continuam) virando minha vida de ponta cabeça. Fiz um segundo mochilão sozinha há 8 anos. Uma das paradas foi Berlim, cidade que eu já tinha visitado anos antes, mas não tinha me causado nenhum frisson. Mas dessa vez eu tive um curto-circuito. Voltei determinada que daria um jeito de ir morar lá. Não fui. Falhei nos planos e fiquei frustrada por algum tempo. Sei que se tivesse ido, minha vida teria hoje um rumo completamente diferente. Provavelmente não teria conhecido o Ola, não teria aberto minha própria agência e não sei sequer se estaria no Brasil, afinal uma decisão pode nos acarretar uma vida completamente diferente da que temos. E é isso que gosto nas minhas viagens, que elas me provoque mudanças e faça eu querer levar minha vida por um caminho diferente do que estou. Adoro me sentir incomodada.

foto: arka38 - shutterstock.com
foto: arka38 – shutterstock.com

A minha primeira ida à NY foi uma viagem que causou exatamente isso na minha vida: uma grande mudança. Cheguei na cidade e a odiei logo de cara. A paixão foi vindo aos poucos, mas de uma maneira desconcertante. Não voltei para o Brasil louca para fazer as malas e ir morar lá, mas voltei determinada a mudar minha vida. Difícil explicar, mas na época NY mostrou um mundo à minha volta muito maior de como eu o percebia por aqui. Estava trabalhando há 5 anos na mesma agência e super acomodada, sem nenhum tesão. Voltei determinada a sair de lá e partir para outras coisas, que eu nem sabia o que seria. Poderia me dedicar às festas, que era algo que fazia na época, mudar de emprego ou de país. Pedi demissão, mas ainda fiquei por lá uns 3 meses até eu ouvir uma fatídica frase dita pelo meu amigo Facundo, ao ouvir minhas lamúrias do meu anseio por mudanças:

– O pior que pode acontecer ao Homem, é ele ter um bom salário.

Era justamente o que me prendia no lugar onde eu estava. Me sentia estável, tinha um bom salário, trabalhava num clima bacana, mas sentia que minha missão por lá tinha terminado no dia que embarquei de volta ao Brasil.

Voltei à sala da minha diretora e pedi demissão pela segunda vez, já que na primeira ela me convenceu a pensar melhor sobre minha decisão. E dessa vez não teve volta. Fiquei um mês cumprindo meu aviso prévio enquanto borboletas loucas voavam no meu estômago pelo futuro incerto que eu via à minha frente. E vale dizer que eu tinha reservas para sobreviver por 3 meses apenas e sem uma família para me dar uma força financeira caso tudo desse errado. Ou seja, eu não poderia falhar porque sabia que a frustração seria gigante.

E não falhei. Foram 6 meses loucos depois disso que me trouxeram outras viagens. Trabalhei muito, viajei bastante e então comecei meu próprio negócio.

Desde então viagens e mais viagens vieram, algumas fizeram eu apenas relaxar. Mas muitas delas reviraram meus olhos e meu cérebro. Fez eu olhar pra mim, pra minha vida, para as pessoas à minha volta e querer revirar tudo de novo. A minha viagem à Lofoten, na Noruega, me causou isso, mostrando que eu estava levando a minha vida para um rumo muito sem graça. Depois vieram Istambul e Islândia, que foram duas viagens que me incomodaram. Com a Islândia eu ainda estou tentando lidar com o curto-circuito que rolou. Estou me sentindo desconfortável ultimamente, pensando em coisas que quero fazer, viver, abraçar. Por enquanto estou aqui parada… mas não sei quanto tempo vai durar.

O melhor disso tudo é ter ao lado alguém que também se sequela com as viagens e se conecta com vontades similares às minhas. Ou seja, se em algum momento eu querer tirar um ano sabático, sei que não estarei sozinha nessa. Pena que nem sempre as coisas são tão simples, mas por isso a graça delas. Depois do bom salário te segurando, o que mais nos segura?

*Foto destaque: Yasemin K. – Unsplash

Quem escreveu

Lalai Persson

Data

28 de April, 2014

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Lalai Persson

Lalai prometeu aos 15 anos que aos 40 faria sua sonhada viagem à Europa. Aos 24 conseguiu adiantar tal sonho em 16 anos. Desde então pisou 33 vezes em Paris e não pára de contar. Não é uma exímia planejadora de viagens. Gosta mesmo é de anotar o que é imperdível, a partir daí, prefere se perder nas ruas por onde passa e tirar dicas de locais. Hoje coleciona boas histórias, perrengues e cotonetes.

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