Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
Dos muitos amores que tenho na vida, há dois eternos: cinema e São Paulo. E os dois estão reunidos na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. O evento acontece anualmente há 38 anos, sempre em outubro, na capital paulista. Essa acontece de 16 (sexta-feira) a 29 de outubro (quarta-feira). São centenas de filmes (cerca de 450 produções) de vários formatos: curtas e longas; lançamentos e clássicos; comerciais e independentes; nacionais e estrangeiros (de todas as bandeiras possíveis deste planeta). É uma festa que frequento há dez anos e, abaixo, algumas dicas para quem quiser aproveitar o festival deste ano.
Compre um pacote de ingressos antecipadamente. A venda dos pacotes (são vários os formatos) se inicia uma semana antes do evento. Neste ano, a largada foi no sábado, 11 de outubro, às 11 horas da manhã, no Conjunto Nacional. Números lindamente cabalísticos para 2014. O pagamento, sempre, deve ser em espécie.
Há duas imensas vantagens na aquisição dos pacotes. A primeira: os filmes saem muito mais baratos (de R$ 16 ou R$ 20 para R$ 9,25 por filme no pacote de 20 ingressos, e R$ 7,90 no pacote de 40 ingressos), praticamente o mesmo preço da meia-entrada (R$ 8 ou R$ 10, dependendo do dia da semana). A segunda: abre-se o privilégio de adquirir os ingressos com até quatro dias antes da sessão.
Uma boa é o pacote de vinte ingressos (R$ 185), que permite acompanhar o evento, sem renunciar demais à vida pessoal e profissional. Em média, dá para ver um filme por dia durante os dias úteis e outros quatro nos finais de semana.Esse pacote de ingressos é, por isso, o mais disputado. Formam-se filas imensas no Conjunto Nacional, e os famosos pacotes de vinte evaporam. Nas últimas edições, abri mão de sofrer na fila e consegui garfar as últimas credenciais no final do primeiro dia de vendas. Sobre as filas: a dica é desprender-se da aglomeração e aproveitar para conhecer as pessoas bacanas na sua frente e atrás…
Sobre outras opções de pacotes: quarenta filmes (R$ 315) são bastante coisa. É quase um desafio (e, no meu caso, não muito prazeroso) conseguir esgotar todos. O Permanente Integral (R$ 430) vale para quem, realmente, for comer e respirar a Mostra por todos os dias. E o Permanente Especial (R$ 100), o mais barato, vale para quem puder ver apenas os filmes em sessão vespertina e dias de semana. Um alerta sobre o pacote especial: muitos dos filmes mais disputados raramente passam nessas sessões. E, aqui, vai uma crítica à Mostra: embora tenha havido um esforço grande de mudar, é nítido que a programação acaba contemplando uma parcela muito privilegiada da humanidade, dos que podem ver sessões em horários — e até locais — pouco acessíveis à maioria dos mortais.
Para quem não pode ou não quer adquirir os pacotes, é possível adquirir os ingressos pela internet, com a mesma antecedência de quatro dias até o dia anterior à exibição (no dia do filme, só dá pra comprar na bilheteria). Cabem dois pequenos apartes: a cota reservada para essa modalidade de ingressos é inferior à dos pacotes. E há a odiosa e injustificada “taxa de conveniência”, que torna os ingressos mais caros. No mais, vale tentar a sorte e ir à bilheteria. Mas, sempre, estando ciente de que são bem altas as chances de NÃO conseguir ver o filme pretendido.
Continuando o planejamento, baixe a ansiedade. É preciso pragmatismo, distribuindo as sessões e os horários naquilo que for viável. E, aqui, mais pontos para a Mostra: grande parte dos filmes está concentrada no circuito da Augusta, com fácil acesso de metrô. E, em sentido oposto: várias outras salas fora desse circuito foram incluídas. Fora do circuito tradicional, vale conhecer a linda sala da Cinemateca ou o espaço muito convidativo da Matilha Cultural. Viva a democratização.
Ainda sobre a ansiedade, é impossível ver tudo. No meio de tantas opções, a Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo lançam encartes específicos que servem de guias. Eles são distribuídos gratuitamente em todas as salas participantes. Algumas pessoas acham os destaques dessas publicações pasteurizados e previsíveis. Já eu não torço o nariz para essas recomendações: devo reconhecer que, muitas vezes, elas são bastante acertadas.
Sobre minha programação pessoal: privilegio os filmes que não vão sair em cartaz e/ou cujas temáticas me interessam. Meu lado radical também prefere filmes em película, e não em tecnologia digital, embora eu reconheça que a última tenha universalizado o acesso à produção de filmes. Essas informações estão, todas, na programação oficial. Sobre as legendas, é informado se elas estão prontas ou serão eletrônicas. Quando as legendas são eletrônicas, é bem improvável que o filme entre em circuito, pelo menos no curto prazo. Anedota sobre as legendas eletrônicas: elas são inseridas, via laptop, por uma pessoa presente na sala. E, muitas vezes, acabam saindo desencontradas ou até mesmo suprimidas. Não é muito agradável, sobretudo quando o idioma for um muito exótico para nós. Eu ainda me lembro de um documentário palestino cujas legendas eletrônicas simplesmente sumiram em vários minutos do filme. Foi uma gritaria na sala (minha também), mas não deixa de ser muito divertido. Aliás, anedotas não faltam nas Mostras paulistanas.
Com isso, entramos no quesito oposto, o da “desorganização”. Sim, haverá filmes cancelados em cima da hora. Não, você não vai conseguir ver um filme muito desejado porque todos os ingressos já foram vendidos. Faz parte do espetáculo. Você pode se surpreender com muitos filmes inicialmente desprezados como me decepcionando com tantos outros muito incensados. E saio em defesa da organização da Mostra: essas cópias são duramente negociadas (não se pode, nunca, esquecer a magnitude do evento) e, muitas vezes, acabam retidas na alfândega. E isso não é exclusividade brasileira, faz parte de qualquer evento com tantas variantes. Eu, pelo contrário, a cada ano, só vejo a Mostra melhorando.
E vai um último conselho, para todos nós, e já com as desculpas do imperativo: além e acima da paciência, educação. Se há uma etiqueta, universal e intuitiva, aplicada aos cinemas, ela fica ainda mais forte nesse período. O cinema é, em última instância, uma linguagem de luz e de som. Interferências a essa interação não são bem-vindas: ruídos e luzes vindos de conversas, celulares e alimentos são, antes de tudo, chatos. Vale, sempre, lembrar: a sala de projeção é um espaço coletivo, não é uma extensão da nossa sala de estar. Por mais que eu nutra o desejo de, um dia, ver um filme sozinho – e, se possível, nu – em uma sala de cinema, sei que não é na Mostra que essa vontade vai se concretizar. Na outra ponta: não faça escândalo porque o colega chegou atrasado ou se levantou no meio da sessão. Repetindo o bordão: quem nunca?
E, para o final, deixo e prometo o melhor da Mostra: o espírito que toma conta da cidade, especialmente nos arredores da Paulista. Pessoas da cidade inteira – e do país e do mundo inteiro, aliás – estão circulando por ali. Você vai se deparar com figuras engraçadíssimas. Vai ter histórias para guardar e contar. Quem sabe, algumas dessas histórias até vindas de encontros nossos pelas filas, sessões e intervalos. Muitos bons filmes, para todos nós!
Texto escrito por Ivo Yonamine, bacharel em Direito, tradutor, revisor e apaixonado por cinema, do Simonde.
Vivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.