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Angra dos Reis: Mergulhando na natureza viva

Quem escreveu

Lalai Persson

Data

12 de January, 2022

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A cidadezinha de Angra dos Reis ficou para trás junto com um céu cinza que carregava os quiproquós de 2021. Embarquei num veleiro levando comigo a leveza e a alegria que quero para 2022. Finalmente o mar. O verde que banha a nossa costa litorânea. O verde que forma uma bonita paleta de cores quando se junta com matas tropicais. O verde que mora nos lugares mais bonitos do Brasil.

Angra dos Reis – a nossa pequena ilha onde ficamos uma semana. Foto: Lalai Persson

Pela frente, uma semana para relaxar numa das 97 ilhas de Angra dos Reis onde o Wi-fi existe, mas não funciona. Melhor assim, uma semana desconectada era o que eu precisava.

Foram quarenta minutos entre o continente e a ilha percorridos no veleiro comandado pelo Antonio, nosso simpático anfitrião. A barra do leme mal se moveu enquanto o nosso barco trespassava suavemente aquele mar, o verde, à nossa frente. Sorte a minha de não estar numa dessas lanchas barulhentas que rasgam o mar como se alguém estivesse pela hora da morte.

O anúncio do Airbnb não fazia jus à beleza do lugar. Uma área verde a perder de vista de tão grande, com uma casa simples no meio de paredes laranjas por fora e branca por dentro, janelas e portas verdes onde habita uma sala bem decorada com quadros bonitos e muitos livros. São duas suítes pequenas, mas aconchegantes, uma delas com um banheiro grande que poderia servir de terceiro quarto. Uma cozinha aberta com chão de pedra, onde uma parede de bambu sustenta um armário antigo reformado. Uma mesa grande ao centro para refeições e partidas de baralho, além de um sofá para os que preferem ficar de pernas para o ar.

A casinha principal com vista para o mar. Foto: Lalai Persson

O bom gosto se esparramava como o mato por lá, por todos os lugares.

Considerada pelos amigos a Rainha Silvia da viagem, eu ganhei a suíte presidencial. Segui com o rei eleito, que dividiria comigo não apenas uma cama grande e o quarto, onde eu poderia morar meses a fio, mas também uma vista esplendorosa.

Um grande janelão onde o vidro foi substituído por uma tela fina para evitar a entrada dos mosquitos, e outra janela grande de vidro aos fundos repousada sobre uma espécie de divã. Tanto a porta do banheiro quanto a porta de entrada são repartidas em duas, deixando a casa ainda mais ventilada. O banheiro possui paredes feitas de bambu e uma parte em vidro para escancarar a beleza que vem de fora. Do chuveirão, a vista para o mar. Da cama, a vista para o mar de um lado e para a floresta do outro. No teto à frente da cama, a vista para o céu. Eu estava ali me sentindo soberana. Maravilhada.

Angra dos Reis: O meu quarto. Foto: Lalai Persson

O meu quarto ficava no alto do morro, onde exercício físico diário foi obrigatório para ir e vir até a casa principal ou à praia. Além do meu quarto e da casa principal, tem mais dois chalés cercados por jaqueiras franjudas carregadas e muitas flores de diversos tipos por todos os lados.

Angra dos Reis – jaqueiras com jacas gordíssimas por vários cantos. Foto: Lalai Persson

Energia elétrica existe graças às placas solares e a um gerador, que é ligado apenas à noite para iluminar os quartos e carregar eletrônicos. Mas não fez a menor falta enquanto esteve desligado.

O plano era passar os dias comendo, bebendo, tomando banho de mar, conversando com os amigos, jogando baralho e lendo uma pilha de livros que levei na mala. Li três.

Na primeira noite fui despertada às 4h44 com um zumbido agudo, que aumentava gradativamente, vindo de todos os lados. Alto, muito alto. Um coral de cigarras afinadas clamavam pelas fêmeas. Um canto soando ao desespero. Quinze minutos longuíssimos em que eu sentia aquele zumbido crescente atravessando os meus tímpanos, tomando conta do meu quarto. Era quase ensurdecedor. Era como se todas as cigarras do mundo estivessem penduradas nas árvores que cercavam a casa.

Nos minutos que se seguiram, a floresta foi acordando aos poucos. Há tempos eu não ouvia essa algazarra de bichos no meio da madrugada. Aves marinhas e costeiras, cigarras, micos, esquilos, gambás, e, quem sabe, até um bugio, o macaco-uivador… os sons da floresta entravam no meu quarto enquanto eu via o dia amanhecer pela abertura do teto à minha frente. Todos os dias foram assim, festeiros. “Pelo jeito não invadiram tanto o morro, porque a natureza está bem viva” – ouvi enquanto bocejava pela noite mal dormida porque me desacostumei ao barulho do mato. Ele só passou incólume nas duas últimas noites, quando finalmente eu me acostumei às festividades noturnas.

O café da manhã era servido com vista para o mar numa mesa cheia de fartura. Bolos, pães, frios, queijo branco, manteiga, requeijão, frutas, iogurte, cereais, suco de laranja espremido na hora e café passado no coador pedindo uma refeição sem pressa.

A rotina não sofreu alterações e eu preferi assim, sem surpresas: Banho, café da manhã, esticar numa cadeira de praia para tomar sol, banho de mar, ler um pouco, bater papo com os amigos até alguém abrir o bar. Caipirinhas, vinho rosé e cerveja. Banho, caiaque, tentativa de aprender a boiar, contemplar as tartarugas e chuveirada. Petiscos descem da cozinha. Biro-biro com gosto de adolescência, mas me falaram que era calabresa, nachos, guacamole, lula à doré, pães, tapenade de azeitonas, sardela e outras pastinhas saborosas. Quando eu estava pronta para o cochilo da tarde, o almoço chegava. E então recomeçávamos a comilança e continuávamos com os drinks.

Angra dos Reis: nosso quintal com vista para o mar. Foto: Lalai Persson

No fim do dia eu escalava o morro para tomar banho, cuidar das picadas dos borrachudos (que são muitos) e assistir ao por-do-sol da cama. Escolhi ela ao invés de sentar numa pedra no mar. Tolice, eu sei, mas eu acho muito chique ver o mar e o por-do-sol da cama. Então ficava lá contemplativa.

Quando a noite caía, ocupávamos a cozinha, a nossa área social noturna. Ficávamos por lá jogando, bebendo e petiscando até o sono vencer. A sala raramente foi usada. Era tão arrumada que preferimos mantê-la assim.

Duas cozinheiras, a Margareth e a Marcia, sempre no comando cuidando de tudo. Nasceram na região, uma mora na ilha e a outra na cidade. A única coisa que não gostam é dos mosquitos. Depois de voltar com meu corpo salpicado de mordidas por todos os lugares, eu consegui entendê-las. Mas agora, já de volta, eu sinto falta do canto das cigarras, do barulho incessante do mar, da umidade que não permitia que as toalhas se secassem, da vista que eu tinha da cama, do lugar onde o tempo passa diferente, do lugar onde a natureza está viva.

*Foto capa: A vista a partir da casa principal por Jo Machado

Quem escreveu

Lalai Persson

Data

12 de January, 2022

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Lalai Persson

Lalai prometeu aos 15 anos que aos 40 faria sua sonhada viagem à Europa. Aos 24 conseguiu adiantar tal sonho em 16 anos. Desde então pisou 33 vezes em Paris e não pára de contar. Não é uma exímia planejadora de viagens. Gosta mesmo é de anotar o que é imperdível, a partir daí, prefere se perder nas ruas por onde passa e tirar dicas de locais. Hoje coleciona boas histórias, perrengues e cotonetes.

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    Vivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.