Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
O SXSW 2022 concluiu com o brilho de sempre a primeira edição presencial desde 2019. Existem várias leituras que podemos fazer a partir do evento – mas gostaria de pensar que houve um grande destaque feminino.
Já começou no SXSW Edu, que teve início na véspera do Dia Internacional da Mulher. Em 08 de março, o braço voltado para educação do South by Southwest promoveu uma sessão de duas horas dedicada a comemorar a data. Além de celebrar o empoderamento feminino, os participantes discutiram a equidade de gênero na educação. Para completar, no site do SXSW Edu, uma seleção de palestras de anos anteriores e sugestões da programação de 2022 garantiram a extensão do conteúdo.
Nos dias seguintes, as atrações do SXSW – com os Festivais de Música, o de Cinema e o Interactive – seguiram com espaços abertos para cores, humores e brilhos femininos. Foi assim até mesmo fora da programação oficial. A Celsius, por exemplo, aproveitou a ocasião para realizar seu primeiro hackathon feminino. Já a Bumble e a Gucci, fizeram um coquetel para celebrar as mulheres inovadoras.
No Festival de Cinema, dos 16 longas-metragens da Competição, nove foram dirigidos ou codirigidos por mulheres. No Festival de Música, a Future is Female, mais uma vez, garantiu a curadoria e liderança feminina em seu Futuristic Femmes. Em outros palcos, encontramos ainda mais mulheres cheias de autenticidade levantando plateias, inclusive a brasileira Bivolt.
A música feminina ecoou no Interactive. Só para citar um exemplo, Kristin Robinson (da Billboard) comandou o painel Feminism in Rock, que você pode ver aqui. Ah! Também não tem como não falar da participação de Lizzo. Numa conversa ultra descontraída com Angela Yee (iHeart Media), a cantora falou de representatividade e de autocuidado, dois temas que parecem estar no subtexto do reality que ela lançará em breve.
Temas como estes, que têm uma ótica bem particular no universo feminino, apareceram em diversos momentos do SXSW 2022, e uma palestra, em especial, contribui com esta reflexão. A escritora Jessica Nordell é conhecida por mesclar ciência rigorosa com humanidade compassiva em suas pesquisas, e foi isso que ela trouxe na palestra Creating a World Beyond Bias. Há anos, ela estuda o tipo de preconceito que não costuma ser reconhecido como tal por ter base em visões e comportamentos muito impregnados em nossa cultura.
O painel Gender Bias in Medicine: Advancing Women’s Health traduz muito bem a questão que Jessica Nordell levantou. Nele, três mulheres da área de saúde – Beth Battaglino, Dr. Lisa Larkin e Alyson J. McGregor – discutiram o preconceito de gênero nos cuidados neste setor. Em síntese, a medicina foi desenvolvida, prioritariamente, em cima de estudos feitos em homens brancos. Muitas doenças e tratamentos, no entanto, se desenvolvem de maneira diversa em mulheres (assim como em outras raças). Um ataque cardíaco, por exemplo, se manifesta de maneiras diferentes nos corpos femininos e masculinos. O resultado é que, recorrentemente, mulheres nessa condição recebem diagnósticos que vão de refluxo a ansiedade. Esse tipo de viés, portanto, leva a prejuízos desnecessários, inclusive à morte.
Mudar isso é crucial e, ao mesmo tempo, cada vez mais desafiador. Temos que lidar diariamente com práticas de empresas que não reconhecem a diversidade do mundo, como Frances Haugen disse a respeito do Facebook em sua apresentação.
“As atuais estratégias técnicas do Facebook não pressupõem que o mundo seja um lugar diverso nem constroem um modelo de negócios que possa realmente suportar um nível razoável de segurança.”
Frances Haugen
Esse reconhecimento tão fundamental à democracia também está na fala de Margrethe Vestager, vice-presidente da Comissão Europeia para Uma Europa Adequada à Era Digital. Ela falou da pouca diversidade nas big techs e enfatizou que elas precisam entender que as regras que valem para o mundo físico também valem para o ambiente digital. Margrethe destacou, ainda, que o esforço para mudar os aspectos negativos das redes sociais têm sentido por causa do lado bom que elas trazem, sobretudo para a conexão entre as pessoas. No entanto, como sociedade, precisamos ser responsáveis no uso das tecnologias e moldá-las, em vez de permitir que elas nos moldem.
“A tecnologia é um pouco como a mudança climática. Ela acontece. É inevitável e, se não tentarmos moldá-la, obviamente ela nos moldará, já está nos moldando há muito tempo. Se quisermos ter certeza de que a tecnologia nos serve, que cria novas oportunidades, novas maneiras de aprender (…), temos que trabalhar com ela de uma forma diferente”
Margrethe Vestager
Quem está bem alinhada com ela é Maria Ressa, jornalista filipina e premiada com o Nobel da Paz em 2021. Ela foi enfática em atribuir a grandes empresas de tecnologia o estado que a democracia vive hoje. Para a situação não se agravar ainda mais, a gente precisa atentar aos alertas de Renée Richardson Gosline na palestra In Praise of Friction. Sua pesquisa examina como tecnologias, inclusive IA, afetam nosso julgamento e desempenho. Com isso, ela observa bastante a interação entre viés humano e o da Inteligência artificial. Renée alerta que esta tecnologia apresenta preconceitos em sua origem, até mesmo se desconsiderarmos o humano responsável pela programação. Isso porque ela se baseia em dados históricos e (voltando a Jessica Nordell), estamos mergulhados em discriminações impregnadas à nossa cultura.
Todas estas falas servem como convite a promover as diferentes vozes que compõem nossa sociedade. Há quem diga que esta é uma tarefa relacionada à visão de mundo feminina, afinal, são as mulheres que conseguem equilibrar vários pratos de uma vez. Aliás, isso me lembra uma fala de Pryia Parker na palestra de abertura do SXSW 2022. Ela disse que, nesse momento, precisamos de pessoas que sejam capazes de ser pacificadoras e provocadoras, assumindo cada um desses lados no momento devido. Pessoas que saibam colocar o dedo na ferida o bastante para trazer mudanças, mas que também saibam acalmar os ânimos e evitar que as coisas desandem.
Bom, como eu disse, as mulheres se destacaram muito no Southby este ano. Poderia falar de muitas outras aqui, mas este texto viraria uma enciclopédia… Então, deixo alguns nomes, os de parceiras de SXSW que, assim como eu, levam para este festival incrível um pouco do que as mulheres brasileiras pensam e criam. Esse ano, estiveram por lá Luciana Bazanella, Catarina Papa, Simone Kliass, Emily Ewell, Wal Flor, Patricia Ellen da Silva, Marilia Bonas, Daniela Mariuzzo, Sabina Deweik e Carolina Bolinger.
texto em parceria – Renata Lea e Vanessa Mathias
Seu exacerbado entusiasmo pela cultura, fauna e flora dos mais diversos locais, renderam no currículo, além de experiências incríveis, MUITAS dicas úteis adquiridas arduamente em visitas a embaixadas, hospitais, delegacias e atendimento em companhias aéreas. Nas horas vagas, estuda e atua com pesquisa de tendências e inovação para instituições e marcas.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.