Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
Talvez você nunca tenha ouvido falar sobre a Usina de Arte e eu vou te contar o que você está perdendo. Um parque artístico botânico entra em cena no município de Água Preta, na Zona da Mata sul de Pernambuco. Uma antiga usina de cana, onde tinha uma destilaria de álcool, agora mói arte e destila afeto.
Com mais de 35 obras de arte, de artistas nacionais e internacionais, a Usina de Arte abre espaço para a educação, cultura e reflorestamento, com um acervo em constante expansão em um museu de arte contemporânea ao ar livre.
Os criadores e desenvolvedores do projeto, Bruna e Ricardinho, se uniram a artistas em uma organização sem fins lucrativos, para trazer esperança a uma comunidade que vivia às margens do sonho de um dia a Usina voltar a produzir. Eles dão aula em ressignificar uma história sem deixar de honrar seu passado, produzindo uma nova realidade.
O parque abre diariamente das 05h30 às 18h e é totalmente gratuito.
Sejam bem vindos!
De carro. A Usina de Arte está ao lado da Vila Santa Terezinha, divisa com o Alagoas. Acho mais prático ir por Recife (que usualmente tem voos mais baratos a partir de São Paulo), alugar um carro e seguir estrada por 2 horas e 130km até a Usina.
Sugiro que você fique dois dias, para curtir tudo com calma e poder se entregar para cada obra no seu tempo. Para isso, o ideal é passar por ali uma noite ou duas.
Não tem lugar melhor que a Casa Modernista, que fica exatamente ao lado do Parque, ainda dentro da propriedade da Usina de Arte. Uma casa para 9 pessoas que pode ser alugada pela agência Entaovah e que é uma extensão ao parque, com design e obras de arte.
Quatro quartos, dois banheiros, uma sala pra morrer de amores, além de uma cozinha equipada, varanda e uma mesa linda embaixo de uma árvore. Por 800 realidades a diária, que vale cada centavo.
Existem opções mais baratas, ficando em acomodações bem simples na Vila de Santa Teresinha.
Ao lado do parque tem um restaurante delicioso, que serve as famosas tripas para acompanhar uma cerveja gelada. Já que faz bastante calor.
É possível acessar o restaurante de dentro do parque.
As mais de 35 obras estão espalhadas pelos 33 hectares da Usina de Arte. São obras impressionantes e normalmente imensas. O parque foi inspirado no Inhotim e começou como uma brincadeira, convidando o artista Hugo França para fazer um grande banco em uma residência artística, que alimentou a ideia para convidar outros artistas.
O José Rufino foi convidado a fazer sua residência no antigo hangar da Usina e hoje é possível conferir o trabalho incrível do artista plástico, que usou materiais antigos, facões de cortar cana, folha de pagamento e controles do almoxarifado da antiga Usina. Ele foi também curador da Usina de Arte por anos.
A partir daí, a Usina de Arte se torna referência em arte contemporânea, além de colocar Pernambuco no mapa das artes.
Uma obra icônica, que envolveu muita polêmica, é “Diva”, de Juliana Notari, que abre a múltiplas interpretações. Me comoveu ver a potência da mulher e o medo que essa força gera em uma sociedade muito machista. De concreto armado e resina, a obra tem 33 metros de altura, 16 metros de largura e 6 metros de profundidade. Uma gigante, como sua artista.
Outra obra que impressiona é “Tinha que acontecer”, de Flavinho Cerqueira. Uma cabeça de bandeirante deitada no maior lago da Usina de Arte, feita de 3 toneladas de barro, fundida em bronze. Para pensar sobre a ressignificação dos ditos heróis.
A obra da Rádio Catimbó, de Paulo Meira, é incrível e dá a ideia das palavras sendo levadas por uma grande antena para a comunidade. Aliada à escultura está a própria rádio comunitária, uma iniciativa da Usina de Arte para a liberdade de expressão e facilitação da comunicação.
O que tem de mais rico é a valorização das pessoas e de como todos nós podemos ser grandes artistas. Dois moradores de Santa Terezinha e funcionários da Usina de Arte se tornaram expositores do parque com suas obras. Ronaldo Tavares foi aprendiz de José Rufino, e Seu Bau, aprendiz de Hugo França. Me emocionei ao entrar no ateliê de Seu Bau e ver ali o espaço para o desenvolvimento. Sentar em seus bancos espalhados pelo parque ao lado dos bancos do seu tutor e levar uma peça para casa foi engrandecedor.
Além dessas obras, muitas outras encantam e emocionam os visitantes. Não deixe de pesquisar e de agendar a sua ida a esse paraíso da arte.
Eu sou mãe de planta, e a Usina de Arte também. O cuidado com a natureza vai muito além de fazer jardins com maestria, dando espaço para as flores e plantas brilharem como peças de arte que são. Começa com a recuperação da mata do interior do Pernambuco, plantando uma verdadeira floresta.
Conhecer o parque hoje te dá a chance de ter o privilégio de ver a transformação do entorno. Deixo aqui como é atualmente, e farei questão de mostrar como estará daqui a 5 anos. Se até Sebastião Salgado vai ficar orgulhoso, imagine nós, meros mortais!
A recuperação se fez necessária pelo tempo em que ali só se plantava cana, o que prova que é possível intercedermos pela Natureza, impactando o clima e a vida animal. Interessante perceber que voltaram muitas espécies de aves, agora que tem refúgio, que fazem revoadas lindas ao pôr do sol. Um espetáculo.
A transformação da comunidade acontece com envolvimento e sensibilidade da Usina de Arte.
Dito isso tudo, aliado a uma biblioteca, oficinas de arte, expressão corporal, aulas de música, uma rádio comunitária, educação ambiental e afetiva e mais uma infinidade de iniciativas, a transformação do entorno é natural.
Eles criaram um laboratório de tecnologia, com acesso a computadores e com capacitação da população para utilização de impressoras 3D para projetos de usufruto da própria comunidade. Criando e trazendo oportunidades para aproximadamente seis mil pessoas.
O projeto ainda se intensifica com um festival anual, aquecendo a economia e trazendo liberdade financeira para a vila.
Não deixe de ir conhecer de perto as ruínas da Usina Santa Terezinha e da destilaria de álcool, para se inspirar com o poder de transformação do antigo para o poder do novo. Os prédios por si só são lindos – confesso que tenho paixão pelo decadente. As intervenções feitas ali dão o tom da inspiração da Usina de Arte para moer novas ideias.
Tive o privilégio de estar presente na inauguração da obra Banquete da Terra, da Denise Milan. A obra fala sobre devolver à terra o que dela retiramos. A artista apresentou a performance “”Petrafagia”, sob curadoria de Marcello Dantas. Intenso e muito bonito.
Te convido a ver isso tudo de perto e a se transformar junto com a Usina de Arte. Deixo abaixo uma carta aberta à Usina, grata por tudo que essa experiência gerou em mim.
Já foi conhecer a Usina de Arte? Entaovah!
Olhe Usina,
Eu saio daqui muito melhor do que quando eu cheguei.
Lugares que extrapolam a natureza e inclusive, a arte me dão coragem em seguir em frente.
A ruptura com o que um dia foi, respeitando os processos e mantendo e cultivando a história, é sem dúvidas, o melhor caminho para a transformação consciente.
Que leva tempo, mas que não tem volta.
Fazer desse lugar um lar, com possibilidade de educação e moradia, com cuidado estético e arte, como nos tempos do coroné, mas a maneira de vocês, é tremendamente incrível.
Me emocionei ao entrar no ateliê de Seu Bau e ver ali o espaço para o desenvolvimento.
Sentar em seus bancos e levar uma peça para casa é engrandecedor.
Para proteger vocês, a família, a usina e todo esse poder de transformação, ficam ervas e sal e um pedaço de mim, transformado também.
Mas pera, fica também um legado à Usina de Arte.
Peguei um fruto de Baobá da obra Tempo Templo para vocês. Um super fruto, nutritivo e afetuoso.
Voltarei muitas vezes e se conseguir trazer uma pessoa para cá com minhas palavras, ficarei feliz. Porque essa pessoa nunca mais será a mesma.
Até breve.
Viajante por natureza, Patricia busca pequenas descobertas cotidianas. Acredita que o encanto das cidades mora no ritmo dos locais e pode passar horas em um café apenas observando a banda passar. Ex-dona de hostel e ex-mochileira com algumas recaídas, hoje prefere quartos com vista em nowhere. Amante das road trips e desenvolvedora de roteiros com a cara do viajante, cai na estrada para conhecer e desbravar esse mundão.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.