Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
O casamento com a União Europeia chegou ao fim e a capital vive seu melhor momento desde o começo da pandemia: liderando a volta ao normal pós-COVID19 no mundo, com uma população adepta à vacinação e libra nas alturas, será que o Brexit é mesmo o pesadelo dos britânicos?
O ano de 2021 começou intenso na Inglaterra mas dá ares de que finalmente as coisas vão se suavizar depois do Brexit. Veja bem, o polêmico divórcio com a União Europeia enfim se concretizou no fim de janeiro e o 19 de julho foi marcado como o ‘Freedom Day’ para o país, já que chegamos finalmente à quarta etapa da liberação das restrições da pandemia, ou seja, com o sucesso da rápida vacinação, máscaras não são mais obrigatórias em nenhum lugar e finalmente festivais e casas noturnas podem abrir suas portas para um merecido vamos voltar a ser jovens e pular até o amanhecer depois de meses na seca do baile.
Caros e caras (ou seria ‘cares’?), devo assumir que não é, não foi e nem será fácil a reação da União Europeia com a decisão dos britânicos de deixar o bloco. Na prática não mudou muita coisa para quem vive aqui, tirando umas chatices para os britânicos na hora de bronzear o esqueleto nas praias do Mediterrâneo, mas a temática dói o ego mais do lado de lá do que de cá e nada como o futebol para tirar o melhor e o pior de nós. A recente Euro2020 explicitou o que as negociações não mostraram: depois do Brexit, não era possível que os ingleses estavam na final. Esse era o sentimento geral dos nossos queridos países vizinhos. O que, assumo, me deixou um pouco brava.
Eu tenho cidadania italiana e possuo grande afeição à Itália. Se a Inglaterra é meu amor, a Itália é minha amante. Estava feliz com os dois países na final, pois não passaria muito nervoso, quem ganhasse estaria contente. No entanto, como fazia 55 anos que a terra da Betinha não ia para a final, os ânimos da nação se exaltaram.
Não sei se quase 10 anos aqui me tornaram mais inglesa do que eu gostaria, se foram tantos lockdown seguidos, menos possibilidades de viajar, mais tempo em casa, apego à nação, ou o espírito comunitário do futebol, mas bateu um nacionalismo que só havia sentido no Brasil em tempos de Copa. Talvez a Euro2020 dessa vez, com a final em casa, trouxe à tona uma euforia de meses reprimidos, que poderia ser um evento que marcaria não só vencer um troféu, mas também um vírus.
Às vezes penso que há uma visão errada e injusta em pensar que os ingleses ficariam mais arrogantes do que nunca se levassem o prêmio. Não é bem assim: ninguém acreditava que o país estava na final, os jogadores doariam 10 milhões de libras que seriam distribuídos entre eles ao NHS, o sistema de saúde público britânico, é um time com diversidade racial e que só existe devido à imigração. E creia em mim, em Londres não há nenhum orgulho do Brexit, mas as pessoas só aprenderam a lidar com ele. Não por acaso o mote do Reino Unido é o keep calm and carry on. Assim é a vida, e vamos em frente.
Por fim, preferiria que fosse menos um jogo Brexit x União Europeia, e mais um jogo Inglaterra x Itália. Sem rancores.
Enquanto isso, nos supermercados continuamos a comprar produtos italianos, queijos franceses, cervejas holandesas, salsicha polonesa, laranjas da Espanha, azeite de Portugal e pães da Alemanha. Nos meses que antecederam o Brexit, foi o maior bafafá de que não teríamos mais as delícias de uma burrata no mercadinho de esquina ou as maravilhosas frutas do ensolarado sul europeu, mas foi tudo sensacionalismo da mídia para amedrontar o povo. No fim, o casamento continua na cama, mesa e banho, só não no papel. E não é a tendência dos casamentos de hoje?
A maioria dos europeus obteve o settled status, que dá direito à residência definitiva, e continuam com suas carreiras desse lado do canal. A libra está nas alturas, e nos aplicativos de namoro ainda há chances de dar conexão boa com muitos cidadãos da Europa, ou seja, continua tudo junto e misturado. Falando em carreira, o mercado de trabalho está aquecido. Mesmo com as demissões inevitáveis em setores-chave que foram afetados pela pandemia, a demanda de trabalho voltou mais forte do que se antecipava e há vagas. Muitas.
Por outro lado, muitos europeus voltaram, sim, para seus países de origem, com medo dos efeitos da pandemia e de como o Brexit prejudicaria suas vidas e trabalho. Acredito que tenha mais a ver com a estagnação do setor hospitaleiro durante o furlough de 2020 e parte de 2021, demissão temporária em que o governo paga o salário do trabalhador quase em totalidade, fruto do lockdown rígido que durou meses, que também vem acompanhado da sensação de instabilidade, o que deixou muitos em pânico.
Como consequência, o que se vê aqui agora são alguns estabelecimentos, como cafés e restaurantes, tendo de diminuir horários de abertura porque não há equipe suficiente para cobrir todos os turnos. Ou seja, há clientes, há demanda, mas falta mão de obra neste setor. Com certeza um efeito negativo, que diria ser mais da pandemia do que do Brexit por enquanto. Vamos ver depois do verão, quando muitos países do sul da Europa têm menos oportunidades e os termos por aqui vão se estabilizando.
Para driblar a deprê pós-Euro2020, que mexeu com as estribeiras de todos, veio o arco-íris depois da tempestade: nem a variante delta e o aumento de casos driblou o governo de oficializar dia 19 de julho como o dia em que o país venceu a pandemia. Com o número de mortos drasticamente em queda pelos efeitos de grande parcela da população vacinada, máscaras não são mais obrigatórias em lugares fechados, como mercados e lojas, e temos o sinal verde para cair na balada e garantir um ingresso para os famosos festivais de verão daqui.
Tudo isso com muita cautela, porém. Apesar da liberação, a maioria ainda está usando máscara em lugares fechados, pois nosso primeiro-ministro orientou que o uso dela é da consciência de cada um. Talvez ser responsável pela própria escolha nos deixa mesmo mais maleáveis. Lojas e restaurantes podem optar por exigi-la ou não, e muitos ainda querem que a equipe trabalhe protegida, encorajando os clientes a fazerem o mesmo. Em soma, agora que não tem mais a lei, todos parecem ainda mais conscientes. Há mais um discurso de que precisamos aprender a conviver com o vírus de forma responsável, ao invés de voltar ao normal apenas quando ele não existir mais.
E vejam só outra ironia. Na segunda-feira da tão aguardada liberação, o próprio Boris Johnson teve de se autoisolar devido ao aplicativo do NHS que avisa quando você entrou em contato com alguém que testou positivo para o coronavírus. Nem ele se safou dessa. Enquanto todos vivem algo mais perto da normalidade desde o começo de 2020, ele observa. Pelo menos a boa notícia de que aqui estamos livre do ‘faça como eu digo, mas não faça o que eu faço’. E nenhum Brexit veio para mudar isso.
Portanto, a conclusão que chego é que Londres não deixou de prosperar, as grandes empresas ainda não escolheram Frankfurt como a nova capital financeira, o mercado de trabalho está aquecido e ainda existe muito respeito pela Europa. Sinceramente? Nem se dá conta que houve um divórcio. Levamos a coisa como se tivessem dado um tempo.
Afinal, é só ligar o Zoom de manhã e interagir com 13 línguas em uma só reunião para lembrar que você ainda está em Londres. Ou ir ao pub da esquina para encontrar os amigos, cada um de uma parte do mundo, claro, e brindar à diversidade, que pode não estar mais nos papéis, mas certamente ainda está pelas mesas e pelos ares. Ainda bem!
Foto Capa: Natalia B./acervo pessoal
Colocou os pés em Londres pela primeira vez aos 17 e sabia que não pararia por ali. Depois de inúmeras visitas, entregou-se de vez a esse casamento britânico, que já dura sete anos. Agora tem mais motivos para ser feliz porque ouve o Mind the Gap todos os dias e pode se lambuzar com as delícias de um cacio e pepe em Trastevere em apenas 2 horas, pois acredita que viajar é papo sério e comer bem, mais ainda, além de ter certeza que um cappuccino bem tirado pode transformar o dia.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.