Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
O Caminho do Artista, de Julia Cameron, é considerado a bíblia da criatividade. Não só indicada para artistas, mas para qualquer um que queira desbloquear e/ou estimular a criatividade.
Escrever é algo que sempre me fez muito bem, mas de repente escrever virou um ganha pão por conta do CoP e a minha relação com a escrita mudou. Ela ficou mais formal. Um pouco dura. Menos espontânea, eu diria.
Recuperar essa espontaneidade tem sido uma árdua tarefa, porque quando escrevo eu deixo tantos rastros de quem sou, que passei a querer me esconder. Mas aos poucos eu tenho voltado à escrita de um outro jeito. Do jeito que eu sempre gostei.
No início da pandemia eu conheci as Páginas Matinais, que me levaram ao livro “O Caminho do Artista”, de Julia Cameron, considerado por muitos a “bíblia da criatividade”, que tem ajudado a desbloquear criativos e artistas há quase 30 anos. É um best seller com mais de 4 milhões de livros vendidos no mundo e traduzido para mais de 40 idiomas.
“O Caminho do Artista” propõe um processo de doze semanas com exercícios diários e semanais, alguns repetitivos e outros feitos uma única vez. O processo não é fácil porque, além de demandar tempo, ele te coloca em contato com o seu “Eu” mais íntimo. O “Eu” que muitas vezes escondemos de nós. Ele nos escava tão profundamente que vai nos surpreender positivamente e negativamente em vários momentos. Como Cameron escreveu “as páginas matinais nos levam até o outro lado: o outro lado do nosso medo, da nossa negatividade, dos nossos humores.”
Está aí toda a beleza do livro e do processo. Ao contrário do que parece, “O Caminho do Artista” é um livro dedicado a qualquer pessoa que queira estimular e/ou desbloquear a criatividade. Não precisa ser artista, mas pode ser que você descubra ser um(a).
Durante as doze semanas propostas de curso, são duas as atividades recorrentes: As Páginas Matinais e o Encontro com o Artista, ou seja, você. As Páginas Matinais são um exercício de “drenagem mental” para ser feito como a primeira coisa do dia. Eu mesma precisei assistir a uma entrevista com a Julia Cameron para entender que eu não estava usando o potencial da tarefa, já que escrevia depois do café da manhã quando a minha mente já estava ocupada demais.
Quando acordamos, passamos por um processo chamado “inércia do sono”, que significa que nosso cérebro leva cerca de meia hora para se tornar funcional. Ou seja, nosso corpo está acordado, mas o cérebro está parcialmente adormecido (por isso é normal se sentir cansado ao acordar). Para Cameron, é justamente esse período o ideal, pois ainda não somos inteiramente nós.
O objetivo é aproveitar essa brecha para colocar na ponta do lápis tudo o que for passando pela nossa cabeça. Não são necessariamente pensamentos organizados ou frases que façam sentido. O objetivo não é escrever um diário, narrar o dia-a-dia detalhadamente, mas cavar mais fundo as ideias aleatórias e palavras soltas que vagam pela nossa mente. São três páginas diárias escritas à mão. Às vezes pode sair uma lista de afazeres, de supermercado, de vontade ou mesmo a frase “Não sei o que escrever hoje” porque a cabeça está vazia demais (ou estamos travadas).
Faz muita diferença seguir o exercício à risca. Nesta mesma entrevista teve a participação da Elizabeth Gilbert, que contou que foram as páginas matinais que a levaram a escrever o seu livro mais famoso: “Comer, Rezar e Amar”.
Após o divórcio, foi a primeira vez que Gilbert se viu bloqueada criativamente, por isso abraçou a jornada completa do “O Caminho do Artista” para se reencontrar. Escrevendo as páginas matinais, ela descobriu, por exemplo, que queria falar italiano, um idioma que nunca passou pela sua cabeça aprender. Foi isso que a levou para uma temporada em Roma e a partir daí o livro foi nascendo.
“As páginas matinais mapeiam nosso interior. Sem elas, nossos sonhos podem permanecer como terra incógnita” – Julia Cameron.
Cameron também comenta no capítulo dedicado às páginas matinais sobre nosso “cérebro lógico, preponderante do Ocidente, que é categórico. Pensa de maneira ordenada e linear.” É ele quem nos julga, ao contrário do nosso “cérebro artista, o nosso inventor, nossa criança, nosso professor distraído. …As páginas matinais ensinam o nosso cérebro lógico a sair de cena e a deixar nosso cérebro artista brincar.”
Já o segundo exercício, o “Encontro com o Artista”, propõe passar um tempo divertido a sós com você. Cameron sugere duas horas por semana para mimar o artista que habita em nós sem incluir terceiros. No livro, ela sugere passeios para lugares que nos inspiram, seja uma caminhada na natureza, uma exposição, uma visita à uma loja de discos. Nessa última entrevista que eu vi, perguntaram a ela como fazemos para que esse encontro aconteça de forma criativa durante a pandemia, já que a situação pede que a gente fique em casa? Sua sugestão foi buscar momentos divertidos dentro de casa, seja batendo um bolo, escrever ou ler um poema, assistir a um filme de arte, ouvir um disco inteiro, dançar… qualquer coisa que faça com a gente se divirta de verdade. Esse é o objetivo: nos divertir, brincar, nos mimar.
Cameron diz que em algum momento nós tentaremos evitar esses encontros com o artista. Mas que é para reconhecer essa resistência como medo de intimidade com nós mesmos. Assim como ela também comenta que é comum as pessoas abandonarem o curso (que é a proposta do livro) na metade. Pois é mais confortável voltar à vida que tínhamos antes já que o processo todo pode desencadear um grande tumulto emocional. Eu fui uma dessas. No ano passado fiz quase a metade e desisti, pois eu estava com muita dificuldade de focar, fui abraçada pela preguiça e tédio por ficar em casa trancada por tanto tempo.
Nesta minha primeira semana de processo eu fui a um dos meus lugares favoritos para assistir ao por-do-sol em Berlim. Fui pedalando, algo que eu não fazia desde início de dezembro, e que eu amo. Para completar esse passeio comigo, eu escolhi o novo álbum do The Avalanches, “We Will Always Love You”, com 1h11 de alegria em forma de música.
O livro “O Caminho do Artista” traz uma introdução da Julia Cameron sobre como ela criou o método ainda no começo dos anos 1980. Ela propõe o livro como um curso para ser feito em 12 semanas. Um dos princípios básicos para a Cameron é que a criatividade está conectada diretamente com a espiritualidade, pois “o caminho do artista é um caminho espiritual por nos levar a entrar em contato com o nosso EU mais profundo e a nos tornar pessoas melhores.”
Cada uma das dozes semanas é dedicada a uma recuperação pessoal: segurança, identidade, poder, integridade, possibilidade, abundância, conexão, força, compaixão, autoproteção, autonomia e fé.
Uma dúvida frequente é o tamanho do caderno ou se pode escrever no computador. Cameron é categórica: escrever à mão. Hoje percebo que escrever à mão tem uma intensidade e poder diferente ao me conectar comigo. Já o tamanho sugerido é A4, mas eu uso um caderno médio.
O livro também tem um capítulo dedicado para quem quer fazer a experiência em grupo, que é o que estou fazendo. Como é um processo longo e difícil, eu convidei qualquer pessoa interessada no assunto para também fazer o curso. Para complementar, criei uma sala no Clubhouse para encontros semanais, onde compartilhamos como foi a semana e discutimos o exercício proposto em cada capítulo. O encontro acontece sempre às quintas-feiras, às 14h (horário São Paulo). Para acompanhar, basta me seguir no Clubhouse: estou como @lalaipersson e há um “sininho” no perfil. É só ativá-lo para receber as notificações das salas que crio. O primeiro encontro foi uma pincelada sobre as páginas matinais, o próximo será focado na Semana 1.
A Julia Cameron é uma multi-artista, autora de mais de 40 livros, dramaturga, compositora e poeta. Já foi casada com o Martin Scorsese (fico imaginando a explosão de criatividade que rolava entre o casal). Ela começou a ministrar aulas de criatividade nos anos 1980. Suas anotações feitas ao longos dos cursos acabaram virando o livro que já foi usado por grandes artistas, como Alicia Key, Reese Whiterspoon, Russel Brand, J. Cole, Elizabeth Gilbert, Rashid, e anônimos como eu.
Comprar o livro, que vale bastante a pena, mas se o momento não é propício, eu indico o podcast “O Caminho do Artista“, feito pela Nina Cast.
Também indico um episódio maravilhoso e inspirador sobre as Páginas Matinais feito com o Rashid no podcast Meteora.
*Foto capa: Yannick Pulver – Unsplash
Lalai prometeu aos 15 anos que aos 40 faria sua sonhada viagem à Europa. Aos 24 conseguiu adiantar tal sonho em 16 anos. Desde então pisou 33 vezes em Paris e não pára de contar. Não é uma exímia planejadora de viagens. Gosta mesmo é de anotar o que é imperdível, a partir daí, prefere se perder nas ruas por onde passa e tirar dicas de locais. Hoje coleciona boas histórias, perrengues e cotonetes.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.