Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
Caminhar sob o escaldante sol de Nova York por longas quatro quadras, desde a estação Bedford Av. até o East River State Park, no Brooklyn, só pode ser feito quando se busca alcançar algo muito especial. A cidade que nunca dorme é abafada e possui um calor impiedoso nos meses de verão. Chegar à margem do East River, por tanto, pode trazer uma necessária brisa, ainda que esse não fosse meu objetivo principal. Vale dizer que a única coisa que me faz caminhar longos trechos a pé (derretendo e fritando meus miolos) é comida. Neste caso, mais do que uma simples refeição, eu não desidratava em nome de uma comida qualquer, mas de um singular festival de comidas: Smorgasburg.
Descrito pelo New York Times como o “Woodstock da gastronomia”, o Smorgasburg é muito mais do que uma feira gastronômica com algumas barracas de comida. Poderia ser definido, aliás, como alguma coisa entre um festim romano, uma atração turística, e a Meca da junk food (comida frita, nada saudável) – ainda que lá possa se encontrar até mesmo opções saudáveis, como sucos naturais, pratos vegetarianos, e saladas.
Saindo do metrô e ao longo do caminho até o parque percorrido na interminável 7th St., uma pacata rua de Williamsburg, bairro do Brooklyn, se tem a sensação de que estar indo em direção a algum festival de música, com vários fãs das diversas bandas juntos em harmonia, rumo a um local sagrado onde satisfarão seus sentidos e preencherão um pouco mais suas existências. Era minha primeira vez por lá e para mim sobravam ansiedade e expectativa de um jovem novato.
Logo que alcancei a esquina da Kent Av., meus olhos brilharam, e o aroma de dezenas de pratos e quitutes tomaram conta de mim como se eu tivesse sido abduzido e introduzido em outra terra de modo instantâneo. Esse é, definitivamente, meu tipo de festival.
Em um espaço aberto, mais de cem barracas brindam o visitante com todo o tipo de comida imaginável: costela bovina assada lentamente na brasa; milho assado com parmesão e azeite trufado; sucos verdes; sanduíche de queijo no pão de miga, frito em imersão no óleo; arroz de pato; churrasco de pimenta jalapeño; pizza; sanduíche de lagosta e a própria lagosta com molho de manteiga; macarrão com queijo (o famoso prato americano, mac and cheese); asinhas de frango fritas; sanduíche de sorvete, composto por dois cookies e um sorvete no meio; e uma infinidade de outras coisas. Em resumo, uma perdição!
O único defeito desta instituição: o “espaço alcoólico”, aqui um problema de ordem cultural americano. De modo geral é proibido beber em público nos Estados Unidos. Isso quer dizer que carregar uma boa cerveja nas mãos enquanto se caminha pelas ruas é certeza de problemas com a lei. No Smorgasburg não seria diferente, portanto. Assim, era impossível pegar uma cerveja e bebê-la enquanto se espera na enorme fila do espetinho de lula, por exemplo. A bebida ficava restrita a este espaço delimitado, onde era proibida a entrada de menores de 18 anos, e que mais parecia um berçário para adultos beberrões, cansados do sol e das filas, e que preferiam sentar-se e apreciar uma ótima cerveja gelada.
A ação de comer e beber, então, ficava contra-intuitiva, pois primeiro se enfrentava alguns bons minutos sob o sol para pegar uma comida, de garganta seca, para só depois poder ir atrás da cerveja. Isso significava longos minutos de calor e sol na cabeça, sem álcool para refrescar! Mas tudo bem. No fim, acaba sendo um problema menor, quando se tem na mão algo tão insólito quanto uma enorme costela bovina com molho chimichurri para degustar, enquanto se espera na fila da cerveja.
Ao final de algumas horas e muitos (quero dizer, muitos!) dólares gastos – prefiro dizer “investidos” – resolvi encerrar aquela tarde no Brooklyn com um passeio pouco conhecido pelo ferry. Andando apenas uma quadra a partir do parque onde se localiza o festival, chega-se ao terminal do New York Ferry, de onde se pode pegar um barco para subir o rio até o Queens, ou descer até o sul de Manhattan ou até o Dumbo, também no Brooklyn. A vista, não é preciso dizer, é linda: com o vento batendo no rosto, o passeio é um espetáculo a parte, e uma mais do que merecida sobremesa após tantas frituras e tantas guloseimas ingeridas.
Para quem tiver interesse em ir, ficam aqui as informações: aos sábados, o festival acontece em Williamsburg, no East River State Park; aos domingos, o festival vai para o Prospect Park, em Breeze Hill. No entanto, isso só ocorre nos meses de verão. Durante o inverno o festival se muda para um grande edifício em Clinton Hill, tanto aos sábados quanto aos domingos. Todas estas localidades ficam no Brooklyn.
Para quem gostaria de ir, mas não está afim de vencer a distância que nos separa de Nova York, termino o texto com uma notícia extremamente agradável: ouvi dizer que em maio de 2019 haverá uma edição especial do festival aqui no Brasil, em São Paulo. Chegaram a fazer uma espécie de “esquenta”, que ficou um pouco pequeno e desorganizado, mas que tinha opções deliciosas como um bolinho frito de macarrão com queijo. Agora estou no aguardo, pois nem preciso dizer que estarei lá em maio, ansioso para saber quais tipos de delícias fritas serão entregues pelos audaciosos chefs brasileiros!
*Este texto foi escrito por Vitor Sampaio, psicólogo, viajante, amante da boa e da má gastronomia. Concilia seu trabalho como psicoterapeuta com viagens e aventuras pelo mundo. Tem certeza de que compartilhar refeições e bebidas é o melhor modo de contato com as pessoas e suas culturas. Tem como objetivo rodar o mundo provando todo tipo de comida e vivendo todo tipo de experiência possível. Também é criador do site www.comendoomundo.com.br, onde compartilha algumas de suas experiências com comidas pelo mundo.
Foto destaque: divulgação evento
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