Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
No último fim de semana, dias 1 e 2 de Junho, o Festival Path fez a sua sétima edição, mantendo a curadoria voltada para criatividade, inovação e diversidade. Mas o festival veio de cara nova, deixando a região de Pinheiros e ocupando o espaço da região da Avenida Paulista. Hotéis como o Tivoli e o Maksoud e espaços como o Club Homs cederam seu espaço para o festival desse ano.
O destaque, mais uma vez, foi para curadoria impecável. É por isso que, mais do que contar como nos divertimos, resolvemos dedicar esses posts para contar o que aprendemos no festival.
Continuamos conversando com os curadores do Path, agora com uma grande amiga, a Mariana Nobre. Ela é fundadora do Ateliê do Futuro, um estúdio que faz mapeamento e curadoria de tendências de futuro, além de ter 18 anos de experiência em comunicação, tanto em grandes empresas como em bureaus de pesquisa. Mari também foi uma das curadoras da edição de 2019 do Path.
Seu trabalho foi trazer a parte de tecnologia, e Mari trouxe um olhar questionador: “Foi uma preocupação questionar o sensacionalismo que algumas pautas ganham, trazendo questionamentos de cunho até mais filosófico, tirando a camada de euforia da tecnologia pela tecnologia.” Outro ponto do seu trabalho foi humanizar a pauta de tecnologia trazendo outros tópicos transversais para a discussão: o impacto dela na nossa vida.
Tecnologia que impacta o nosso corpo foi um dos destaques para a curadora. Por exemplo, o painel “Edição Genética: Rumos Éticos”, mediado por Eduardo Padilha, um cientista de 21 anos que desde os 13 trabalha genética molecular e reparo de DNA. O debate sobre a edição genética tem tido cada vez mais espaço, primeiro por causa do surgimento do CRSPR – ferramenta de edição genética – e também por conta do episódio envolvendo um cientista chinês e o anúncio de que ele editou o DNA de duas crianças quando ainda eram embriões.
O painel teve uma importante desconstrução logo de cara: sempre fizemos edição genética, o CRSPR apenas torna a prática mais rápida e barata. Alimentos ou animais foram geneticamente manipulados por nós humanos para que apresentem características que nos interessam, como um milho de tamanho maior ou um cachorro com temperamento mais dócil. Outro ponto importante do painel foi a aversão das pessoas ao que parece tecnológico: “Existe um conforto, talvez religioso, em pensar que uma banana é natural”, provocou o pesquisador Otto Herringer.
Para ele, essa aversão se explica pela dificuldade da ciência em se comunicar com a população em geral. E como resultado, tendemos a achar que existe uma dicotomia entre natural e artificial, que não é verdadeira. “Pouquíssimas coisas podem ser divididas entre natural e artificial”, concluiu a também pesquisadora Erika Molina.
A figura de maior projeção dentro do escopo da nossa curadora, sem dúvidas, foi o vereador paulistano e ex-deputado federal Eduardo Suplicy. Ele abordou o fato de que a Renda Básica Universal é discutida há bastante tempo: há menções na ‘Bíblia’ e nas escrituras de outras religiões: “Um livro mais recente, de 1516 (…) é ‘Utopia’ de Thomas Moore’. E o Brasil tem seu case com o Bolsa Família: “No início havia muito preconceito em relação ao Bolsa Família. Nas eleições de 2008 e 2012, vários candidatos prometiam acabar com o programa. Hoje com o inegável sucesso dele, ninguém mais arrisca ameaçá-lo”, lembrou o presidente da Rede Brasileira de Renda Básica, Leandro Ferreira.
A Renda Básica Universal, que parecia algo bastante distante da realidade, passou a ser debatida com mais frequência nos últimos tempos. O avanço tecnológico e a consequente automação, que ameaça muitos trabalhos fizeram com que o debate de uma idéia distante ganhasse tanto corpo. E isso representa uma oportunidade – “Estamos em uma janela de oportunidades. O tema está chegando aos tomadores de decisão”, afirmou Ferreira. Alguns testes do modelo estão sendo realizados ou estão em fase de avaliação em países distintos como o Quênia e a Finlândia, além de que a Renda Básica Universal conta com grande apoio de lideranças do Vale do Silício.
Tecnologia em prol dos animais foi a pauta desse painel. “Devemos escapar do absurdo que é criar um frango inteiro para comer um peito ou uma asa.” Quem disse essa frase foi Winston Churchill, primeiro-ministro britânico no tempo da Segunda Guerra Mundial. Mas parece que somente agora estamos tomando consciência da necessidade de evitar o abate de animais para consumo humano.
Outro destaque da Mari foi o painel sobre carnes feitas sem abate de animais. Existem basicamente duas formas dessa carne – uma feita com plantas (como a do hambúrger do futuro da Lanchonete da Cidade em São Paulo) que simulam o sabor de uma carne e outra utilizando células animais para o crescimento da carne em estufas. A demanda por esse tipo de carne tem crescido uma vez que o público vem tomando consciência dos impactos negativos ligados à produção de carne no mundo: uso de muita água e alimentos para criar os animais, uso exagerado de antibióticos e a crueldade.
E essa transformação pode impactar diretamente o Brasil. “O Brasil é o maior processador de carne e pode deixar de ser protagonista neste cenário se não acompanhar as novas escolhas do consumidor mundial e brasileiro.”, afirmou Felipe Krelling, coordenador de pesquisa do The Good Food Institute.
Para Mari, um dos fatores importantes do conteúdo do evento é a autenticidade dos palestrantes: “Acredito que o público encontrou pessoas com muita legitimidade no que fazem, com assuntos que poderiam ser tratados pelos principais hubs de inovação do mundo, mas com gente de carne osso, acessível e que está pertinho de todos nós, por aqui.”
Com casa nova, falantes de carne e osso, e um olhar reflexivo para a tecnologia, inovação e diversidade, o Path segue firme e forte, se estabelecendo como um evento cada vez mais relevante na agenda do público de inovação do Brasil. Na nossa próxima pauta, traremos os aprendizados de auto-conhecimento!
Vivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.