Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
pilantragem
substantivo feminino
Era dia 16 de fevereiro, aparentemente um sábado como outro qualquer, só que não! Tempo fechado, festival marcado para começar às 19h. Algumas semanas de espera, ansiedade e uma grande decisão pela frente: encarar o mau tempo e pagar pra ver… Era dia do festival Pilantragi \o/
Mas antes de falar sobre o festival, eu vou compartilhar um pouco sobre o cara por traz dele!
Alto, charmosíssimo e com um sorriso frouxo, Bento é o cara! Eu estava numa fase de laboratório, estudando a cidade, as festas, os DJs. Foi num desses rolês que topei com ele, cuja camiseta dizia: “After Party at My House” … Mostrando bem a que veio.
Ao longo das muitas noites em que nos encontramos, trocamos várias ideias sobre experiências, vida, noite. Descobri que Bento trabalhou alguns bons anos na noite de São Paulo, foi host e promoter em algumas das principais casas noturnas da capital e que festa era o que ele fazia de melhor. Foi numa dessas trocas que eu ouvi o nome Pilantragi pela primeira vez :)
Ao mínimo contato que se tenha com ele, você vai notar que a Pilantragi é uma extensão da energia que ele emana. O que o Bento e a Rute Correa – diretora de produção da festa/festival – entregam é nada menos que uma expressão exponencial de tudo que eles, assim como eu e alguns bravos, acreditam: no poder da música e na arte como agente propulsor da inclusão e transformação. _/\_
A Pilantragi é um projeto/coletivo que nasceu em 2012 composto por mais de 120 pessoas, dentre elas artistas, designers, cenografistas, DJs e produtores. É a festa dedicada à música popular brasileira com mais edições realizadas até hoje, totalizando 750. Isso sem contar as 45 ocupações de rua, edições gratuitas, os oito blocos de carnaval e as 20 cidades da Europa por onde a Pilantragi já passou. E, como se não bastasse, em 2018 as edições Pilantragi reuniram mais de 11 toneladas em doações diversas, que ajudaram intuições, crianças, famílias e mais.
Foram mais de 2,5 milhões de pessoas contagiadas com o gene da música, da revolução e do amor. Entretanto, isso são apenas números. O que realmente importa aqui é a experiência e a relevância dela no nosso dia a dia, especialmente em tempos em que ser feliz é pura ousadia.
A noite começou com uma chuva daquelas, mas quem – como eu – chegou no horário, encontrou uma instalação ok, staff posicionado, cronograma fluindo conforme prometido. As pistas estavam prontas. Agora era esperar e ver se as pessoas chegariam pra ver que noite linda seria aquela. E elas chegaram… timidamente, com capas de chuva ou totalmente despreocupadas com a água.
A Banda Xaxado Novo subiu no palco e deu início a sequência de shows, trazendo um forró suave e botando o povo pra dançar na chuva. Minuto a minuto, os espaços foram sendo preenchidos. Houve quem se arrumou, quem se fantasiou, quem se transvestiu, quem quis economizar nos panos, mas esbanjar na simpatia, distribuindo beijos e abraços. Eram grupos de amigos, casais, todo tipo de gente!
Entre uma atração e outra, fomos presenteados por sets de DJs consagrados na noite de São Paulo. Nomes como DJ Lia Macedo, DJ Tahira, Furmiga Dub, Salvador Araguaya e DJ Ian Nunes completaram a noite.
Cada DJ trazia uma vibe diferente para a pista, como um prenúncio do que estava por vir no próximo show. Deu certo! Anelis Assumpção chegou chegando, entregando um sucesso atrás do outro e muita energia para público. A artista foi o chamariz da pista principal e a melhor maneira de juntar todo mundo que chegou e oficialmente começar a noite.
A chuva finalmente deu uma trégua. Céu subiu no palco e sacudiu a pista com sucessos como “A nave vai”, “Perfume do Invisível” e “Varanda Suspensa”. No entanto eu confesso que, para mim, o mais bonito foi ver que a música era apenas um pano de fundo para o que realmente predominava ali. Um encontro quântico de pessoas com um nó na garganta, cantando em uníssono a vontade de transgredir as barreiras do ‘politicamente correto’ do nosso cotidiano para apenas SER e ESTAR no estilo Pilantragi de viver a vida.
Até a meia noite seis atrações já haviam se apresentado nas duas pistas. A virada foi marcada pelo set do Bento, que trouxe ninguém menos que Ekena para o palco levantando o hino feminista “Todxs Putxs”. Numa onda de união, ela fez aproximadamente 1.700 pessoas darem as mãos e cantarem juntas por dias de mais igualdade e de muito mais respeito.
E, em meio a tudo, chega o Bloco Pilantragi dando um drop do Carnaval. Foi fascinante viver aquela injeção simultânea de vozes, mensagens, sons, imagens e sensações de cada parte dele vinha despejando na gente. Isso sem esquecer das diversas intervenções artísticas, como o painel da Sil Strass, a presença do Maravilhosas Corpo de Baile , que criaram uma atmosfera real de confraternização e folia.
É por meio desse tipo de experiência que se olha para o lado e se percebe que somos todos iguais e que, sim, “a gente quer comida, diversão e arte”. A gente quer amor, quer vibrar junto e que, mais que existir, a gente quer viver e acreditar que o ponto essencial da vida é o amor: seja próprio ou ao próximo. Nada como a música e arte, juntas, para nos situarmos e para ajustar o mindset para tudo isso.
Circulando por todos os lados, do backstage, as pistas, o bar, os trucks de comida, banheiros e demais áreas, a alegria era a máxima. No ápice da festa, ao logo de todo show da Letrux, a energia era só uma e o espírito era de um Carnaval que vinha representando – como nos tempos de Chico – a necessidade de estar junto, de mãos dadas como na apresentação de Ekena, espantar os males, as frustrações e acreditar que apesar de qualquer “você”, amanhã seria um novo dia.
Depois dessa enxurrada de sentimentos , de mais de 15 atrações terem se apresentado em 11 horas de festival, Bento voltou pra pick-up e presenteou o público com um set de encerramento. Nada, nem a chuva, impediu aquela multidão de se conectar, de dançar junto, trocar, se conhecer, chorar e beijar e ser feliz aquele dia.
Público, produção, segurança, limpeza, atendimento… todos que fizeram o festival acontecer saíram dali – quase sete da manhã – tomados por um frisson.
O festival Pilantragi 2019, na sua segunda edição que rolou no Fabriketa, além de um line up recheado de encantamento e choques de realidades embalados por vozes e sons incríveis, ressignificou pra mim o substantivo feminino com o qual comecei esse relato. Ele reforçou minha sensação de que, música a música, festa a festa, festival a festival a festival, é assim que juntos vamos criar uma timeline de experiências coletivas de dias, posturas, pensamentos e ações melhores.
Que sejamos então todos pilantras do bem e que nossas Pilantragis sejam sempre esse festival de lembranças e vontades transformadoras. Que venha então o Carnaval da revolução!
Veja mais registros do festival aqui.
Jornalista por formação e Produtora Cultural por propósito. Direto da Amazônia, Ana viaja o Brasil trabalhando em shows, festivais e pesquisas. Focada em desbravar sons, costumes, sabores e experiências, é assim que ela pretende dar a volta ao mundo: aprendendo novas músicas e conhecendo novas culturas. Acredita que o sentido da vida é a troca. Pensadora profissional e escritora amadora, ela anda por aí capturando momentos únicos, revelando belezas essenciais e compartilhando tudo isso escrevendo aqui.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.