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Liberaram cogumelos mágicos no Colorado – é o renascimento da psicodelia

Quem escreveu

Rê no Rolê

Data

17 de May, 2019

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Andam dizendo que depois da cannabis, a próxima grande oportunidade de investimento são os cogumelos mágicos. Agora que estamos conseguindo mostrar para a tradicional família brasileira o poder medicinal da cannabis e diminuir os preconceitos em torno de uma planta medicinal, é hora de chegar para aquela tia careta e perguntar o que ela acha de tomar ácido. É isso mesmo, e não é papo de doidão. A nova indústria já dá os seus sinais e o uso de substâncias psicodélicas – de forma controlada, com apoio de um profissional e com um propósito claro – tem se mostrado benéfico no tratamento de diversas condições e vem sendo cada vez mais estudado por universidades no mundo todo.

A psicodelia, que teve seu momento nos anos 60 e 70, volta agora na forma científica. A assim chamada medicina psicodélica, ou psicoterapia psicodélica, faz usos terapêuticos – e espirituais – de substâncias alucinógenas, para melhoria de qualidade de vida e tratamento de algumas condições. Mas a pesquisa precisa avançar e os cientistas compreenderem melhor quais as moléculas presentes em cogumelos mágicos e como elas interagem entre si, para então começarem a ser formulados produtos à base de cogumelos (extrato completo ou princípios ativos isolados), para serem consumidos com eficácia e segurança, como hoje vem sendo feito com o CBD isolado. Após cinco décadas de pesquisas, hoje é possível oferecer a pacientes os benefícios da cannabis sem o efeito de ficar doidão gerados pelo THC, que nem todo mundo deseja. Mas vamos aos cogumelos mágicos.

Psilo o quê?

Foto: pretty-drugthings

Existem mais de 200 espécies de cogumelos reconhecidas como psicodélicas e os efeitos subjetivos causados por elas são consideravelmente distintos. Assim como a cannabis não tem apenas THC, o cogumelo não tem apenas psilocibina. O correto é dizer que a psilocibina não é o único princípio ativo responsável pelo efeito alucinógeno. A psilocibina é uma pró-droga que, quando metabolizada no corpo humano, se transforma em psilocina, e esta sim é quem possui psicoatividade.

Wikipedia

No Brasil não é crime portar ou usar cogumelos alucinógenos, quem conhece São Tomé das Letras em Minas Gerais sabe. Mas nos EUA a psilocibina é proibida pelo governo federal, classificada pela DEA como droga schedule 1, isto é, entre as mais perigosas, sem valor terapêutico e com alto potencial para abuso, no mesmo nível da heroína! Inclusive, os pesquisadores da Universidade John Hopkins, em Maryland, discordam publicamente e já sugeriram neste artigo a reclassificação da psilocibina para não mais que schedule 4, baseados em estudos em animais e humanos que indicam baixo potencial de abuso e nenhum potencial de dependência física.

As pesquisas mostram que mesmo com o pouco que se sabe sobre a substância, há indícios de que os compostos ativos presentes nos cogumelos mágicos podem ser úteis no tratamento de depressão resistente, ansiedade em pacientes terminais, alcoolismo, tabagismo e Transtorno do Estresse Pós-Traumático, que nos EUA tem uma incidência enorme, afinal, país que faz guerra acaba tendo muitos veteranos com desordens mentais. A psilocibina é segura, conforme mostra o gráfico a seguir, que compara o potencial prejuízo causado por diversas drogas para o usuário e para outros.

 

 

A eleição em Denver

Photo by Cassie Gallegos on Unsplash

Vejamos Denver, no estado do Colorado, que semana passada numa votação histórica se tornou a primeira cidade nos EUA a descriminalizar a psilocibina, o mais conhecido dos princípios ativos presentes nos cogumelos mágicos. A proposta criada pelo coletivo Decriminalize Denver arrecadou nove mil assinaturas ano passado e, em janeiro deste ano, foi incluída na cédula da eleição municipal, para ser votada em 8 de maio. É nessa rapidez que as coisas funcionam numa real democracia. Além de escolher prefeito, vereadores, secretários e auditores, o eleitor de Denver encontrou na cédula deste ano a seguinte pergunta: “o uso pessoal e posse de cogumelos contendo psilocibina entre maiores de 21 anos deveria ser a menor prioridade legal de Denver?”, para qual se votava sim ou não.

A disputa foi acirrada e alguns jornais sensacionalistas americanos publicaram na madrugada que a proposta não tinha passado. Foi todo mundo dormir frustrado. Mas na tarde do dia seguinte, com o final da apuração (americano não confia em urna eletrônica, e demora quase 24h pra contar os votos de uma cidade pequena como Denver), viu-se que a maioria dos cidadãos, 50.56% contra 49.44%, aprova a medida. Já estão na campanha pela descriminalização os estados da Califórnia, Vermont e Oregon, que devem votar propostas similares em 2020.

Denver não legalizou os cogumelos mágicos, veja bem, não vai vender chapeleta na lojinha. Isso continua sendo privilégio de Amsterdã, que permite a posse, cultivo e a venda do produto. Em Denver eles vão continuar sendo proibidos por lei federal e estadual, mas portar e usar não será mais crime. E vai facilitar a pesquisa.

Por que isso é importante para a farmacologia?

Louis Reed on Unsplash

Nos últimos 50 anos, a psilocibina tem sido tratada como uma droga perigosa, sem valor terapêutico. Enquanto isso, a indústria farmacêutica não conseguiu criar boas drogas para o tratamento de transtornos do humor, como depressão, ansiedade, transtornos compulsivos e dependência. As principais drogas usadas hoje apresentam tempo de início de ação muito longo, efeitos colaterais graves e pouca eficácia. Temos uma necessidade não atendida de longa data por produtos que efetivamente tratam transtornos do humor sem gerar efeitos colaterais.

Futuros produtos à base de psilocibina poderão conter vários ingredientes conhecidos em quantidades conhecidas, e a próxima geração de produtos derivados de cogumelos deverá otimizar o “efeito entourage, atingido por meio do uso de múltiplos componentes ativos, além de garantir que esses componentes sejam formulados em quantidades confiáveis.

Hoje em dia, um cientista precisa aguardar meses para conseguir autorização para trabalhar com a psilocibina, e mesmo depois da permissão, ainda tem que desembolsar uma fortuna por grama do produto. Vale a máxima “tudo que é proibido é mais caro”. Em março de 2018, a pesquisadora Olivia Goldhill publicou um artigo intitulado “Cientistas que querem estudar cogumelos psicodélicos têm que pagar US$ 7.000 por grama”, mostrando a dificuldade encontrada no campo da ciência. Porém, a farmacologia da psilocibina sintética pura é diferente dos cogumelos porque nos cogumelos encontramos uma combinação de várias substâncias derivadas da psilocibina – como acontece com os canabinóides, quando isolados, não apresentam os mesmos efeitos sinérgicos de quando encontramos em extrato contendo as demais substâncias presentes na planta.

A pesquisadora Cristina Magalhães, PhD, da Alliant International University Los Angeles e co-presidente de um simpósio sobre psicodélicos e psicoterapia sugere que “combinado com psicoterapia, algumas drogas psicodélicas como MDMA, a psilocibina e a ayahuasca podem melhorar os sintomas de ansiedade, depressão e transtorno de estresse pós-traumático”. E empresas já estão desenvolvendo formulações baseadas nas moléculas encontradas nos cogumelos mágicos. A britânica Compass Pathways está focada na criação de tratamento com base na psilocibina sintética pura. Já a americana CaaMTech está desenvolvendo formulações que combinam múltiplos de derivados de psilocibina, projetados para preservar ou melhorar as combinações de compostos encontrados em cogumelos mágicos que ocorrem naturalmente, e em março soltou um comunicado de imprensa informando que conseguiu resolver a estrutura cristalina da droga psicodélica psilacetina, um derivado de psilocibina sintético. Até a China já entrou no jogo e no início de abril anunciou que o Wuhan General Group, por meio de sua subsidiária MJ MedTech, criou uma divisão chamada M2BIO dedicada a explorar as oportunidades em medicina psicodélica.

Um centro de pesquisas psicodélicas

Foto: Jr-korpa

O assunto está mesmo em alta. No fim de abril, a Imperial College de Londres lançou o Center for Psychedelic Research, o primeiro centro de pesquisas do mundo dedicado exclusivamente ao tema. Financiado por doadores, a instituição se baseia em mais de uma década de trabalho pioneiro nesta área realizada na própria universidade, incluindo um ensaio clínico que deu início aos esforços globais para desenvolver a psilocibina sintética. O centro vai se concentrar em dois grandes temas: o uso de psicodélicos em cuidados da saúde mental e como podemos usar ferramentas para investigar a base da consciência do cérebro. Nos próximos anos, o centro pretende desenvolver um tratamento licenciado para a depressão e investigar o potencial da molécula para tratar outras condições, como a anorexia.

Segundo o coordenador, Dr. Robin Carhart-Harris, “este novo centro representa um momento decisivo para a ciência psicodélica; simbólico de seu reconhecimento agora no mainstream. Psicodélicos devem ter um grande impacto na neurociência e psiquiatria nos próximos anos. É um privilégio estar na vanguarda de uma das áreas mais interessantes da ciência médica.” Aos ansiosos, o cientista alerta que ainda pode levar alguns anos para a terapia psicodélica estar disponível aos pacientes, mas a pesquisa até agora tem sido muito encorajadora. Segundo ele, “pesquisas clínicas em estágio inicial mostraram que, quando ministradas com segurança e profissionalmente, a terapia psicodélica é uma grande promessa para o tratamento de algumas condições muito sérias de saúde mental e pode um dia oferecer novas esperanças a pessoas vulneráveis com opções de tratamento limitadas”.

Os opositores apontam que a psilocibina tem alguns riscos – particularmente a possibilidade de acidentes e experiências traumáticas que podem ser psicologicamente prejudiciais (especialmente entre pessoas com predisposição a doenças mentais), mas a comunidade científica e os entusiastas do assunto estão pra lá de empolgados com o assunto. Que venha o futuro!

*Foto destaque: Photo by Pretty Drugthings on Unsplash

Referências:

https://psilocybintechnology.com/

https://maps.org

https://howtousepsychedelics.org

https://psychedelicreview.com

https://www.mushroompac.org/

Quem escreveu

Rê no Rolê

Data

17 de May, 2019

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Rê no Rolê

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Comentários

  • Eu realmente não me dou bem com canabinoides: THC me dá ansiedade após o uso, e até mesmo o inofensivo CBD interage com meu antidepressivo, causando a tal síndrome serotonérgica. Nunca tive qualquer problema com cogumelos, apesar de usar concomitante com um antidepressivo. Eu entendo e apoio a pesquisa com cogumelos para fins medicinais, mas não vamos esquecer que o cogumelo como “droga recreativa” tem méritos igualmente sérios: na própria tabela mostrada no artigo, o cogumelo sai como a droga recreativa mais segura. Ao contrário do álcool, que te deixa com uma ressaca daquelas (e algumas pessoas até mais violentas!), o cogumelo me deixa mais simpático, feliz, fico possuído de uma imensa gratidão por todos a minha volta — tudo isso sem ressaca nenhuma no dia seguinte. Só um sereno e muito bem vindo afterglow.

    - Max
    • Max, chama a gente quando você ficar assim tão feliz ;-)
      Brincadeiras a parte, obrigado pelo teu comentário!

      - Renato Salles

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