Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
Montreal é uma cidade conhecida pelo seu valor no entretenimento. Lar de bandas consagradas como Arcade Fire e The Stills, a cidade de Quebec também é o local de origem do icônico Cirque du Soleil. Mas Montreal também é um hub de inovação, concentrando empresas e pesquisadores especializados em inteligência artificial. E nesse cruzamento de arte, entretenimento e tecnologia, Montreal organizou o C2 (Commerce + Creativity), um evento que fala de tecnologia e negócios, mas de um jeito diferente.
Quem me conhece sabe que eu sou rata de festival. O ano retrasado fui em 18, o ano passado em 10 festivais, esse ano já fui a 6 e devo chegar em 10. Sem a pretensão de cagar regra, e sim de estabelecer de onde venho para esse comentário: é diferente de todos que eu já vi.
Como todos os eventos, ele contou com palestras e speakers de peso, sejam eles do mundo das artes (Spike Lee e will.i.am) ou lideranças dos negócios (como Bozoma Saint John). Mas o espaço do conteúdo mais tradicional é menor em comparação a outros festivais – e, no meu caso especificamente, repetido. Isso porque o festival é feito para que o público tenha uma experiência para além do conteúdo, e mais extraordinário.
A minha razão específica para ir ao C2 foram os labs. Já havia visto fotos antes dos participantes conversando nas alturas, em uma piscina de bolas, conversando com estranhos em guarda-chuvas rosa, comendo ervas para sair de um labirinto…
É isso o que mais me encantou sobre o C2. É como um festival de inovação com alguns elementos mágicos e imagéticos que só presenciei no Burning Man.
Nessa edição, meu favorito foi o lab Noir, em que os participantes precisavam interagir no escuro, conversar e colaborar. No slow-lab, os participantes foram incentivados a reduzir o ritmo para observar o impacto de um ritmo mais lento na maneira como absorvemos as coisas.
Pude refletir como isso ajuda desenvolver nosso pensamento crítico – tendo a arte como âncora. Outro lab de destaque foi o Alter Ego, onde os participantes tiveram a oportunidade de perceber com mais clareza a identidade que formam de si mesmos e como podem se libertar dela: já pensou se você fosse o seu extremo oposto? Pessoas como Beyoncé, Fernando Pessoa e David Bowie tiveram um alter ego. Por que não criar o seu?
O C2 também inverte a lógica da produção de conteúdo, colocando o público participante como produtor de conteúdo também. Uma parte muito interessante do evento esteve nos “braindates”, encontros um a um ou em grupos onde pessoas que nunca se viram se juntavam em uma mesa para discutir um assunto em comum. Acredite, foram mais de 4500 braindates em 3 dias de evento, com discussões sobre criatividade, liderança… bodes, games, alucinógenos.
Conheci o Antoine, responsável pela criação de todo conteúdo experiencial no C2. Além disso, bati um papo com um game designer que era também palestrante, que indagava se vivemos ou não em uma simulação. Papo de sobra!
O que a tecnologia de ponta da NASA tem a ver com Disney e Pixar? Paul Propster, planejador de comunicação da agência espacial norte-americana falou da importância do uso de storytelling pela agência para falar com o público geral. As empresas de animação foram parte fundamental no processo de incorporar o storytelling no dia a dia da agência espacial. Ainda falando do espaço, outro ponto alto do festival foi a aparição de David Saint-Jacques, astronauta do programa espacial canadense, que conversou com o público sobre avanços na área da saúde… ah, Saint-Jacques estava falando diretamente do espaço!
Mas a Terra também foi tema no C2. O festival se mostrou bastante a par do efeito Greta Thurnberg, e enquanto mais protestos de jovens cobrando ação diante do aquecimento global aconteciam mundo afora, o evento deu espaço para alguns jovens que têm atuado na resolução de problemas globais. “Temos toda a tecnologia, (…) não há nada que não tenhamos. Não precisamos fazer mais pesquisa (…) A razão porque não mudamos é a ganância de corporações, o que eu chamo de capitalismo com esteróides. Porque negócios, comércio e liberdade são bons, mas a forma como priorizamos o dinheiro deles sobre todas as nossas vidas é o que está nos matando.” – a fala contundente vem de Jamie Margolin, de 17 anos, fundadora do movimento Zero Hour, em um discurso que cobra ação, bem alinhado ao mote do evento que convida o público a agir diante das grandes questões do mundo atual. Outro prodígio foi Isabella Grandic, empreendedora de 15 anos de idade que tem como objetivo tornar produtos sintéticos de origem animal acessíveis para todos até 2025. Apaixonada por sustentabilidade e por como reduzir o impacto ambiental da produção de alimentos, ela também é considerada uma das personalidades inovadoras mais promissoras dessa geração.
Guy Laliberté é fundador do Cirque de Soleil. Nada mais normal do que ele falar em um tanque de areia ao redor de um piano. Laliberté agora busca como incorporar a tecnologia no futuro do entretenimento através da nova empresa Lune Rouge. Ele contou que o distrito do velho porto de Montreal contará com um venue de entretenimento em formato de pirâmide e móvel no mês de junho. Lembrando que o fato dele ser um dos grandes investidores que ajudou a comprar a fazenda onde fica o Burning Man não é coincidência.
A junção de tecnologia e entretenimento, que é a cara de Montreal, deixa sua marca no C2. Ele prioriza a experiência e o aprendizado mais do que keynotes. Afinal, é a memória e o sentimento que nos levam à ação, não apenas informação. Por isso a quantidade de workshops era maior que a de palestras ou keynotes.
Toda a experiência do festival era extremamente fluída: o crachá você podia “clicar” e trocar suas informações de contato, além de trocar decor quando você chegava perto da sua atividade. Além disso ele era uma carteira vir tual pagar tudo que havia por lá, o LED mudava de cor indicando que você está no lugar correto, ele iluminava de acordo com votos durante apresentações…. e, claro, tinha seu nominho e foto
A cada local havia uma estação para carregar o celular (ou mesmo um power bank à sua disposição), zilhões de opções de food truck – e o melhor: nunca vi um festival sem filas gigantescas! A cada talk, danças e performances tomam o ambiente.
O universo imagético e cenográfico transforma completamente a experiência – se o famoso Cirque du Soleil se refere como “Le cirque Reinventé“, o C2 é “La conférence réinventée”, a conferência reinventada.
*Foto do destaque: C2
Seu exacerbado entusiasmo pela cultura, fauna e flora dos mais diversos locais, renderam no currículo, além de experiências incríveis, MUITAS dicas úteis adquiridas arduamente em visitas a embaixadas, hospitais, delegacias e atendimento em companhias aéreas. Nas horas vagas, estuda e atua com pesquisa de tendências e inovação para instituições e marcas.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.