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A França do fim do século 19era um país em profunda transformação social. A República finalmente se estabeleceu junto com a Revolução Industrial. Os centros urbanos cresceram, a miséria também. A classe mais baixa trabalhava até a exaustão, enquanto a burguesia e nobreza lutavam para ganhar ainda mais privilégios. A sociedade patriarcal mantinha o domínio e a independência masculina, enquanto relegava as mulheres ‘de bem’ ao exercício do lar. A cidade também mudou com a chegada da iluminação pública, dando abertura para o surgimento de uma verdadeira cena noturna underground. Foi retratando essa boemia marginal que o pintor Henri de Toulouse-Lautrec fez fama com sua arte.
A exposição ‘Toulouse-Lautrec em Vermelho’, que abriu na última sexta-feira, ocupa um andar inteiro do MASP com 75 obras do artista, além de 50 documentos como fotos, cartas, bilhetes e telegramas. A curadoria fatiou seu trabalho em 5 pedaços, separados por enormes muros escarlates, organizando-os por tema ao invés de cronologia. Dessa forma, a crônica que Lautrec faz da sociedade de seu tempo fica explícita.
Mesmo estando em plena Belle Époque, evocando a cultura e o cosmopolitismo, a sociedade parisiense mantinha seus hábitos hipócritas de bons costumes. A prostituição tinha sido regulada desde a época de Napoleão, considerando que os homens poderiam dar vazão aos seus desejos na rua como uma forma de ‘proteger’ suas esposas direitas. As prostitutas tinham que se cadastrar na prefeitura, e deveriam trabalhar em algum bordel legal, as maisons closes, ou casas fechadas. É nelas que ele se aproxima das trabalhadoras da vida, num grau que ele participa e retrata os momentos mais íntimos de suas vidas. Não a luxúria das noites agitadas, mas os momentos de tédio, de reclusão, de privacidade. Essas mulheres anônimas tomam toda a primeira parte da exposição. Na segunda, as mulheres retratadas são consideradas ‘distintas’, como modelos, lavadeiras e nobres, como sua mãe, a Condessa Adèle de Toulouse-Lautrec. A divisão joga luz sobre o questionamento do artista sobre o papel das mulheres, e das prostitutas, na sociedade parisiense.
Na terceira parte aparecem os homens. Esses, sim, todos com seus devidos nomes e sobrenomes, são os distintos cavalheiros da elite em seus fraques e cartolas, que deixavam as esposas em casa para ceder às tentações da noite. E as duas últimas partes trazem as cenas da boemia em sua plena exuberância, que tanto fizeram Lautrec famoso. Estão lá o célebre ‘Moulin de la Galette’, os pôsteres da dançarina Jane Avril, e os cartazes do debochado Aristide Bruant, que tinha um cabaré com seu nome. Com esses cartazes, ele ainda revolucionou o mercado de arte, sendo o primeiro artista a ter reproduções espalhadas por toda a cidade.
Nas mesas centrais, vemos os registros e documentos que jogam luz sobre a personalidade do artista, e suas relações pessoais. As cartas para sua mãe mostram um garoto dependente e às vezes mimado, enquanto com os amigos ele se torna bastante irônico. Sua obra toda se caracteriza por traços difusos, fazendo uso extensivo do cartão como pano de fundo, o que inverte a lógica de ter o branco com base. Através de suas pinceladas, vemos uma Paris colorida e teatral, que é exuberante e decadente ao mesmo tempo.
‘Toulouse-Lautrec em Vermelho’ é uma das exposições que fazem parte de uma série organizada pelo MASP para discutir questões de sexualidade e gênero dentro da arte. O subsolo ainda tem mostras impactantes como ‘Envolvimentos‘ da Wanda Pimentel, ‘Quem tem medo de Teresinha Soares‘, da própria Teresinha, ‘Nada Levarei Qundo Morrer‘, de Miguel Rio Branco, e ‘Montagens‘ de Tracy Moffatt. Todas elas interagem em seus conteúdos, e o discurso da curadoria fica ainda mais potente quando se vê todas. Reserva uma tarde inteira porque vale a pena.
Toulouse-Lautrec em Vermelho
MASP – Av. Paulista, 1578
Até 01.10 – Terça a domingo, das 10h às 18h. Quinta, das 10h às 20h.
Ingresso: $30 (inteira) e $15 (meia). Terças: gratuito.
Para o Renato, em qualquer boa viagem você tem que escolher bem as companhias e os mapas. Excelente arrumador de malas, ele vira um halterofilista na volta de todas as suas viagens, pois acha sempre cabe mais algum souvenir. Gosta de guardar como lembrança de cada lugar vídeos, coisas para pendurar nas paredes e histórias de perrengues. Em situações de estresse, sua recomendação é sempre tomar uma cerveja antes de tomar uma decisão importante. Afinal, nada melhor que um bom bar para conhecer a cultura de um lugar.
Ver todos os postsOlá Renato, tudo bem?
Visitei a exposição de T-L e tentei tirar fotos de algumas obras, mas nem de longe ficaram tão boas como as suas.
Portanto, disculpe a curiosidade, você poderia, por favor, acrescentar alguns dados técnicos sobre o equipamento usado? (se for celular marca e modelo, etc.)
Agradeço a atenção.
Abraços.
Olá Alan,
Eu fui à exposição sem nada de equipamentos. Todas as fotos foram tiradas com um Iphone 7 comum. Abs
Vivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.