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Entenda: a polêmica do show do Radiohead em Israel

Quem escreveu

Renato Salles

Data

26 de July, 2017

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Semana passada aconteceu o tão polêmico show do Radiohead em Tel Aviv. A polêmica toda rolou porque muita gente queria que Thom Yorke e sua gangue desistissem do show, considerando que a banda é super dedicada a causas políticas, e deveria se sensibilizar com a causa Palestina. Eles, basicamente, cagaram e andaram para o que falaram, e o show lotadaço foi incrível segundo a Vanessa (aqui do blog que está estudando no país – e fez, inclusive, um live de lá.

Bom, essa é a versão curta da história.

O Oriente Médio, hoje, é palco das piores guerras correntes. As notícias de chacinas, bombardeios e ataques terroristas são diários. Para mim é muito difícil acompanhar. Com toda essa gritaria em torno do show dos caras, resolvi dar uma investigada para deixar toda a história mais clara na minha cabeça. Mas é tanta coisa, que achei que valia a pena compartilhar a informação, porque acho que muita gente está um pouco desinformada. Então aqui está a versão longa:

O Estado de Israel foi criado em 1948 pela ONU, apesar de não ter sido um consenso com os líderes árabes da região. Desde então, a área virou um campo de batalhas explosivo entre árabes e judeus. O primeiro ataque da liga árabe a Israel foi apenas um dia após o estabelecimento do Estado. Até 1967, a Cisjordânia e a Faixa de Gaza formavam um território de controle exclusivamente palestino. Mas aí veio a Guerra dos Seis Dias, com vitória de Israel, que passou a controlar as duas áreas. Em 1988, depois da Primeira Intifada (ou revolta em árabe), sob comando de Yasser Arafat, a OLP (Organização para a Libertação Palestina) proclamou o estabelecimento do estado palestino, e assinou os Acordos de Paz de Oslo em 1993. Mas a paz não veio, claro. Esse vídeo (em inglês) do Vox faz um resumo excelente de tudo que a região passou desde a queda do Império Otomano no começo do século 20.

Em 2000, novas negociações de paz em Camp David falharam em agradar israelenses e palestinos, dando início à Segunda Intifada, ainda mais violenta, que durou até 2005. A essa altura, Israel desiste de tentar controlar os conflitos e parte para uma política separatista agressiva. Levanta muros, estabelece pontos de controle de circulação de palestinos, e cessa as tentativas de negociação. Para eles, a disputa não tem solução, então o ideal é deixá-la do lado de lá. Os palestinos, em compensação, passam a viver em estado contínuo de ocupação, sem conquistar direitos como nação. A Faixa de Gaza, dominada pelo Hamas, corta relações com a Cisjordânia, e é colocada em estado de sítio por Israel, tornando-se um gigantesco campo de refugiados, em condições subumanas de vida. E é aqui que entra o Radiohead.

Em 2005, com o estabelecimento de um apartheid geográfico e social por Israel, a sociedade civil palestina se juntou em um movimento pacífico de boicote internacional a Israel como forma de pressionar o país. O BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções) é formado por uniões palestinas, partidos políticos, redes de refugiados, organizações femininas, comitês de resistência popular e outras instituições palestinas. Inspirados pelo movimento anti-apartheid sul-africano, o BDS acusa o estado israelense de ferir leis internacionais, e clama para que companhias, instituições e governos que endossam o estado israelense cortem suas relações como forma de enfraquecer a opressão deles sobre o território palestino.

O movimento BDS conta com o apoio de ONGs pelos direitos humanos, igrejas, artistas, jornalistas, acadêmicos, e muitas instituições ao redor do mundo. Um dos mais famosos é o músico Roger Waters, do Pink Floyd, um dos promotores do celeuma com Thom Yorke e companhia. Uma carta aberta assinada por 47 personalidades partidárias do BDS foi publicada no site Artists for Palestine UK, pedindo que o Radiohead levasse em conta seu histórico de luta política e cancelasse o show em Tel Aviv. O mesmo já tinha acontecido recentemente com o Chemical Brothers.

Yorke, obviamente, não gostou nada, e deu uma entrevista na Rolling Stone falando que se sentia ofendido que as pessoas pensassem que eles seriam incapazes de conhecer a realidade da região e de tomar decisões sobre participar do boicote ou não. Também reclamou que ninguém teria tentado falar diretamente com eles, partindo diretamente para uma humilhação pública. Waters respondeu, então, que tentou contato direto com Yorke algumas vezes, sendo rechaçado violentamente por ele. A questão toma ainda novas camadas de complexidade porque a esposa do Jonny Greenwood, guitarrista da banda, é israelense, árabe e judia.

O circo estava armado. De um lado, a banda defendia seu direito de fazer música isenta de questões políticas. Do outro, protestos de ativistas chegaram até a interromper um show da banda em Glasgow. Mesmo fãs apontavam o grande envolvimento político da banda desde o começo da carreira, citando os shows em prol da independência do Nepal, e a divulgação do trabalho da Naomi Klein, defensora do BDS. Acho que os argumentos mais claros e sinceros são os dados pelo Ali, na página Jewish Voice for Peace (sim, uma página judia).

No fim aconteceu. No dia 19, o show rolou. Yorke não deixou barato, e comentou no meio: ‘Muito foi dito sobre isso, mas no fim nós só tocamos um pouco de música’. Em seguida, lá de cima, começaram palmas uníssonas e braços levantados, em um senso de comunhão com a opinião do músico.

E ainda rebateu mais críticas em uma entrevista: ‘Tocar em um país não é o mesmo que endossar seu governo’. Ele comenta, por exemplo, que não endossam o governo do Trump – e, pela mesma lógica, não deveriam então tocar em nenhuma cidade dos EUA.

E aí, você acha que eles deveriam ter cancelado o show?

Radiohead toca no Yarkon Park, em Tel Aviv - foto: J Horovitz / Times of Israel
Radiohead toca no Yarkon Park, em Tel Aviv – foto: J Horovitz / Times of Israel

*Foto do destaque – Andrew Milligan/PA

Quem escreveu

Renato Salles

Data

26 de July, 2017

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Renato Salles

Para o Renato, em qualquer boa viagem você tem que escolher bem as companhias e os mapas. Excelente arrumador de malas, ele vira um halterofilista na volta de todas as suas viagens, pois acha sempre cabe mais algum souvenir. Gosta de guardar como lembrança de cada lugar vídeos, coisas para pendurar nas paredes e histórias de perrengues. Em situações de estresse, sua recomendação é sempre tomar uma cerveja antes de tomar uma decisão importante. Afinal, nada melhor que um bom bar para conhecer a cultura de um lugar.

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    Vivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.