Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
O futuro da comida é algo que me interessa cada vez mais. Sempre fui meio criança na hora de lidar com ela, mas de uns tempos para cá passei a ousar mais na hora de escolher o que comer. Nas viagens que faço também passei a prestar mais atenção no assunto, explorar mais sabores, afinal a comida é sempre um bom lugar para começar a entender uma cultura. A carne perdeu a importância que tinha na hora de preparar meu prato e aos poucos começo a deixá-la de lado. Foi tudo isso somado que fez o projeto F.O.M.E. – Feeding our minds and enviroments (alimentando nossas mentes e o nosso ambiente numa tradução livre) chamar a minha atenção.
O evento terá sua terceira edição na Vila Modernista, nos Jardins, produzido por um time de peso: Marakuthai, Tea Connection e AMMA Chocolates, com concepção e realização do The Soul Kitchen. Parte da verba será revertida para a restauração da Vila. O F.O.M.E. é uma plataforma de discussão sobre alimentação e nutrição, propondo uma análise mais profunda sobre nossa relação com o consumo de alimentos.
Eu estive na primeira edição e saí de lá comovida (não acho adjetivo melhor). Esta terceira edição do F.O.M.E. será um pouco diferente, contando com uma programação repleta de atividades educativas abertas ao público e, claro, comida. Ao longo do dia, os participantes vão poder fazer aula de compostagem e horta urbana, meditação, yoga e receitas com chocolate passo a passo.
Eu, que sempre prefiro não ler releases antes de conhecer um projeto (#confissão), fui para a primeira edição boiando e curiosa com o que teria pela frente. A casa estava cheia. Logo soube que a ideia principal do projeto é discutir a nossa relação com o alimento. Como alimentamos nosso corpo, nossa mente e a comunidade. Ou apenas comemos para saciar a fome?
Fomos divididos em quatro mesas. Cada uma recebeu um dos quatro mediadores convidados para discutir a comida dentro de sua área de atuação. Nós começamos com o Cauê Tessuto, chef consultor, que hoje distribui peixes para restaurantes em São Paulo. Para acompanhar a conversa, foi servida uma tainha tão saborosa que deu vontade de abraçá-la. Ele discorreu sobre o processo que vai da pesca até chegar ao nosso prato, explicando que a sazonalidade na pesca geralmente não é respeitada no mercado, que prefere peixes mais comuns e evita experimentar peixes menos conhecidos (e o quanto nós, consumidores, perdemos com isso). A pior parte foi confirmar o que já sabemos: consumimos muitas vezes peixe estragado e, claro, nunca existirá peixe fresco de verdade em São Paulo, pois o mínimo de dias que ele terá ao chegar aqui desde a sua pesca, serão três dias. Contou então sobre a tainha, peixe tão subestimado, mas que hoje faz parte do menu do Maní, por exemplo. Ao fim da conversa eu já tinha decidido que peixe eu não como mais em qualquer lugar como costumo fazer.
O segundo mediador foi o agricultor Patrick Assumpção, que atua com pequenos produtores no interior de São Paulo. Para acompanhar a conversa, tivemos uma salada feita à base de PANCs – plantas alimentícias não convencionais -, com cará-moela (um tubérculo aéreo), vinagreira e mandioca. A discussão com ele foi assustadora, especialmente ao contar a realidade dos produtores que tem um tempo curto para devolver o empréstimo feito pelo governo, não permitindo assim arriscar à plantação de alimentos menos conhecidos ou que tem colheita mais demorada. Com isso também perdemos a chance de experimentar outros legumes e verduras, repetindo assim sempre as mesmas opções à nossa mesa.
A Roberta Ribeiro é médica e hoje dedica a vida ao Mindful Eating – comida de corpo e alma. O tempo que passamos com ela foi fazendo um exercício de mindfulness para sentir e perceber melhor a comida, além de deixar qualquer distração de lado. Afinal, quantas vezes você pega no telefone ou se entrega a qualquer outra atividade, como assistir TV, por exemplo, enquanto come. Ficamos longos minutos sentindo a pele e textura de um tomate, o cheiro, até finalmente mordê-lo e sentir seu gosto. Impossível terminar o exercício e se dar conta de que comemos na maior parte do tempo para saciar a fome do que para aproveitar a comida. Entre os vários benefícios que essa prática pode trazer, uma delas é identificar quando a fome é física ou emocional, ajudando assim a evitar a compulsão. Desafio: tente fazer a próxima refeição prestando atenção somente na comida, mastigando devagar e tentando identificar os alimentos.
A noite fechou com o Rafael Tonon apresentando um panorama do futuro da comida nas cidades e as boas práticas ao redor do mundo, para diminuir, por exemplo, o desperdício, diminuir o consumo de carne, etc. O grande desafio que temos é saber como iremos aumentar a produção de alimentos em 70% até 2050, quando a população mundial atingirá a marca de 10 bilhões de pessoas. Não vai ser fácil.
Se eu mudei um pouquinho depois desse encontro? Não totalmente, porque é um exercício constante mudar a forma como a maioria de nós se relaciona com a comida. Prestar atenção nela, eu ainda presto menos do que deveria. Procurar saber de onde vem o alimento que eu coloco no meu prato ainda não é uma tarefa simples. Preferir os produtores locais nem sempre está tão à mão. Comer totalmente de forma mais consciente ainda não é uma realidade para mim. Mas esta conversa, as leituras diversas que tenho feito a respeito, documentários que tenho assistido mostram que a gente pode fazer um pouquinho e esse pouquinho pode fazer grande diferença no todo. E eu, aos poucos, vou mudando e melhorando neste ponto.
F.O.M.E. na Vila
3 de setembro, das 12 às 18h
Vila Flavio de Carvalho – Al. Lorena,1257.
Preços das comidas: R$20
Cervejas artesanais: R$15
Drinques: R$20 a R$25
Água e refrigerante: R$5
*Foto destaque: Markus Spiske no Unsplash
Lalai prometeu aos 15 anos que aos 40 faria sua sonhada viagem à Europa. Aos 24 conseguiu adiantar tal sonho em 16 anos. Desde então pisou 33 vezes em Paris e não pára de contar. Não é uma exímia planejadora de viagens. Gosta mesmo é de anotar o que é imperdível, a partir daí, prefere se perder nas ruas por onde passa e tirar dicas de locais. Hoje coleciona boas histórias, perrengues e cotonetes.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.