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Mergulhando com tubarões na África do Sul

Quem escreveu

Gaía Passarelli

Data

18 de March, 2016

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“Tá, quem vai querer fazer o mergulho com tubarões amanhã?” Silêncio na mesa. Tomada por coragem momentânea e entusiasmada pela terceira taça de Pinotage sul-africano da noite, levantei a mão. Sim, quero ir.

Só no dia seguinte, discutindo o assunto com os colegas durante o café da manhã, é que ficou claro que eu não tinha a menor ideia do que significa “mergulhar com tubarões”. Um amigo sul-africano incentivou. “Dá medo mesmo, mas é foda, você nunca vai esquecer, não perde a chance,” ele disse. “E você vai também?” eu quis saber. “De jeito nenhum. Uma vez na vida tá bom.”

Parecia suficiente para mudar de ideia, mas me mantive animada com a perspectiva. Afinal, quantas vezes na vida você vai ter a oportunidade de estar dentro da água, em segurança, perto dos enormes tubarões brancos? Sim, aquele mesmo predador altamente eficiente que ganha uma semana inteira de programação especial todos os anos no Discovery Channel? Não é uma oportunidade que aparece todo dia. Então, mesmo com um frio horroroso e muito sono, entramos na van por volta das três da manhã seguinte. Estávamos em tempo, a quatro horas de distância, e queríamos alcançar Gansbaai, entre a Cidade do Cabo e a região do Cabo das Agulhas, no extremo sul da Africa do Sul, antes do sol nascer.

Nossa operadora era a White Shark Project, uma das empresas credenciadas pelo governo sul-africano para oferecer o pacote de cage diving para turistas. É obrigatório assistir uma rápida aula em vídeo antes de fazer o mergulho. O capitão, que responde pela segurança de cada participante, vai junto para responder perguntas e estressar a principal regra do rolê: vendo tubarão na água ou não, é absolutamente proibido colocar a mão para fora da gaiola. Não pode. Ponto.

Pouco antes do sol nascer, vários barcos saem do cais em direção ao Shark Alley, uma área entre a costa e as pequenas ilhas onde os grandes tubarões brancos se reúnem para caçar focas. Há várias operadoras diferentes em Gansbaai, todas trabalhando com cage diving.

A prática consiste em entrar na água dentro de uma gaiola, que fica presa na lateral do barco. Até cinco pessoas podem entrar na gaiola por vez, sempre vestidas com neoprene e máscara. Dentro e fora da gaiola, a voz do capitão é lei, e quem ele vir colocando a mão para fora da jaula vai pro cantinho do castigo. A tripulação joga enormes nacos de peixe na água, e o cheiro atrai os tubarões. Pode acontecer de eles não aparecerem no dia por qualquer motivo, mas uma vez perto do barco, os bichos vão comer enquanto tiver alimento oferecido, e, com o passar das horas, ficam cada vez mais agitados e agressivos. Os grupos de mergulhadores descem um de cada vez, com intervalos, sempre sob os olhos atentos do capitão. A água gelada só permite que a gente fique cerca de dez minutos dentro da gaiola, mas, se alguém quiser sair antes, é só sinalizar. Como o rolê dura a manhã inteira, se você aguentar o frio, dá para entrar e sair da gaiola várias vezes.

 

Shark Alley: região em que os tubarões vem atrás das ficas que vivem nas ilhas. A caça de tubarões brancos é proibida por lei e às vezes há mais de mil tubarões no mesmo local. Você não quer cair na água sem a gaiola, acredite.
Rumo ao Shark Alley. A caça de tubarões brancos na África do Sul é proibida por lei e às vezes há mais de mil tubarões no mesmo local. Você não quer estar na água sem a gaiola, acredite.

 

O uso de iscas para atrair os tubarões é uma das críticas à prática.
Além dos pedaços de peixe jogados na água, um marujo usa carcaças presas em cordas como iscas. A ideia é que o tubarão tenha que puxar a carcaça, ficando mais tempo perto do barco para os turistas poderem ver – eles são absurdamente rápidos.

 

Prontos? O capitão fica acima da gaiola vendo se todas as regras de segurança estão sendo cumpridas. Colocar as mãos pra fora da gaiola é absolutamente proibido, já que o tubarão não vai fazer distinção entre seu braço e o pedaço de peixe. E, sim, já teve gente perdendo a mão.
Prontos? O capitão fica acima da gaiola vendo se todas as regras de segurança estão sendo cumpridas. Como o tubarão não vai fazer distinção entre seu braço e o pedaço de peixe, colocar a mão para fora da gaiola é o no go.

 

OLHA ELE ALI!
OE! Os tubarões são atraídos pelo cheiro das iscas de peixe (vísceras e sangue) na água. Tem gente que desiste depois da primeira descida. E tem gente que nem vai.

 

Não é obrigatório cair na água, claro. Muita gente aproveita o passeio para apenas fotografar esses animais impressionantes de perto.
Não é obrigatório entrar na gaiola, claro. Muita gente aproveita o passeio para fotografar os animais de perto. E eles são impressionantes mesmo.

 

SOBREVIVI!
Medo superado, entrei na água umas quatro vezes. Quase dá para ver o sorriso por baixo da máscara, vai?!

 

Tem diploma pra quem mergulhar. Mas que tem que fazer a aulinha também!
Na volta, tem diploma para quem mergulhar. Mas que tem que fazer a aulinha também!

O cage diving é talvez a forma mais “fácil” de alguém que não é mergulhador profissional ou biólogo estar perto desse animal magnífico que é o grande tubarão branco. Mas “fácil” não é a definição certa para estar dentro de uma gaiola no mar gelado, vendo o bicho engolir pedaços de peixe perto da sua cara. Um tubarão branco não é um peixinho, mas um animal enorme que não raro chega a ter sete metros de comprimento. O barco balança, a água é gelada, o capitão grita e o tubarão é um animal muito ágil, para enxergar algo além de um borrão, você tem que controlar os movimentos e estar debaixo da linha da água quando ele chega. Mas, depois de pegar o jeito, dá para ver os olhos pretos pequenos, a barbatana, a cauda e, claro, os dentes enormes.

A prática ajuda a desmistificar o tubarão branco, animal visto como extremamente violento. O discurso do White Shark Project é sempre em torno de como esses predadores são importantes e devem ser respeitados. Mas o cage diving não é sempre bem visto. Críticos lembram que a alimentação artificial dos tubarões em Shark Alley é nociva e que a presença humana dentro da jaula faz com que os animais estabeleçam uma perigosa conexão entre gente e comida. Além disso, a falta de bom senso de algumas pessoas faz com que o perigo seja real – por incrível que pareça, tem gente que realmente tenta passar a mão no tubarão.

Para saber mais (em inglês)

Shark Alley no site do South Africa Tourism
White Shark Project: shark diving

Quem escreveu

Gaía Passarelli

Data

18 de March, 2016

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Gaía Passarelli

Gaía Passarelli é paulistana de nascença, autora do livro "Mas Voce Vai Sozinha?"(Globo, 2016) e do blog How to Travel Light. Encontre-a em gaiapassarelli.com

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