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Dossiê Guaraná: desde Maués até a sua mesa

Quem escreveu

Renato Salles

Data

14 de December, 2016

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Guaraná, como conhecemos no dia ­a ­dia, é um conceito abstrato de gosto. Em 1921, o refrigerante que conhecemos tão bem foi criado pela antiga Companhia Antarctica Paulista para se tornar um ícone brasileiro. Ficou tão popular que o próprio nome guaraná está marcado no imaginário coletivo mais como uma bebida do que como a fruta que a origina. Mas até chegar na sua mesa, aquela garrafinha verde de ‘champagne sem álcool’ carrega todo um universo social, cultural e ecológico, quase impossível de se imaginar.

Originário da Amazônia, o guaraná era usado pelos índios da tribo Saterê­-Mawé por conta de suas muitas propriedades energizantes. Isso porque a fruta tem guaranina, similar à cafeína, mas com efeito de 4 a 7 vezes mais forte. Sendo mais específico, esse nutriente (e muitos outros) ficam na semente, que é separada da casca e da polpa, torrada, e só então ralada para fazer o pó ou o extrato que vai para o refrigerante. Entre os efeitos do consumo do pó de guaraná estão: aumento de energia, perda de peso, melhora da circulação do sangue, estímulo da libido, diminuição do estresse, eliminação de toxinas, entre outros. Ufa! Deu para ver que guaraná é coisa séria para a saúde.

A semente do guaraná: de Maués para suas mãos
A semente do guaraná: de Maués para suas mãos

Eu fui convidado pela equipe do Guaraná Antarctica para me embrenhar Floresta Amazônica adentro para ver de perto a origem da fruta mágica. A viagem coincidiu ainda com a 37ª Festa da Colheita do Guaraná, que acontece sempre no fim de novembro, celebrando a temporada anual de colheita do fruto, na pequena Maués, a 356km de Manaus. A cidade é conhecida não só por ter uma das maiores e melhores produções de guaraná do mundo, mas também por ter uma das mais altas expectativas de vida do país. Até o fim desse texto, você provavelmente vai encomendar também seu estoque de guaraná, quer ver?

Expedição Amazônica

A nossa viagem começa com uma passagem rapidíssima por Manaus, pingando rapidinho no Mercado Central e no suntuoso Teatro Amazonas, e logo corremos para a marina para fazer check-in no nosso transporte-hotel nos 6 dias seguintes. Saímos da capital no começo da noite para chegar a Maués apenas no dia seguinte, já depois do almoço. A ida, que segue o curso torrencial do Amazonas e seus afluentes, demora de 18 a 20 horas. Nem preciso dizer que a volta, rio acima, é ainda mais longa. O trajeto é lento, mas não monótono, pois é impossível não ficar embasbacado com a exuberância da maior floresta tropical do mundo.

O Teatro Amazonas
O Teatro Amazonas

A chegada a Maués impressiona, porque a cidade não é nada do que se espera de uma comunidade descendente de indígenas escondida no meio da Amazônia, acessível principalmente por barco. Começa que são quase 60 mil habitantes lá. Segundo que a margem do Rio Maués­ Açu, em sua maior parte, é tomada por uma grande praia de areia branquinha que deixa muito litoral no chinelo. Tudo muito lindo, mas mal temos tempo para aproveitar a vista. Para conhecer cada detalhe que envolve a origem do Guaraná Antarctica precisamos aproveitar bem o tempo.

Parece algum canto do litoral, mas é Maués
Parece algum canto do litoral, mas é Maués

Da terra para o copo

Tudo começa na Fazenda Santa Helena, mantida pela Ambev não tanto para colher o próprio guaraná, mas como um centro de excelência na produção de mudas e na formação de produtores da região. Por ser um cipó, o guaranazeiro se enrosca nas árvores à sua volta para chegar lá no alto das copas e pegar mais sol. Colher frutas assim não seria nada fácil, então a plantação é toda feita em clareiras abertas na mata, onde os pés não passam da altura de arbustos.

Mudinhas tratadas com todo o cuidado
Mudinhas tratadas com todo o cuidado

Mas a área da fazenda usada para a plantação é de apenas 20%, mantendo a taxa de preservação de mata original determinada pelo Governo do Estado de Amazonas. Isso faz da lavoura um tanto incomum e linda: ao redor dos guaranazeiros, um paredão verde gigante fecha todos os lados.

O Ademir, que é saterê-mawé, conhece o guaraná como a palma da mão
O Ademir, que é saterê-mawé, conhece o guaraná como a palma da mão

Na fazenda, o guaraná passa pela colheita, lavagem, torra e ensacamento. De lá, ele segue para o centro de extratos, onde as sementes dão origem ao sumo que depois vai virar o refrigerante.

O Galetti é o cara que garante a qualidade do teu guaraná
O Galetti é o cara que garante a qualidade do teu guaraná

Falando em qualidade, o guaraná de Maués é o melhor que existe em termos de sabor, adstringência e abundância. Por isso a Ambev tem um programa tão intenso de formação das famílias ribeirinhas, que vai do plantio à torrefação. Toda a produção da região feita por essas famílias é comprada pela empresa, desempenhando papel determinante na economia local.

A vida ribeirinha

Nosso tour inclui também a visita à propriedade do Sr. Natanael. Ele mora com a família em uma casa isolada no meio da mata, afastado mais de uma hora da cidade. A casa, simples mas muito digna e bem cuidada, revela sua ascendência saterê­-mawé: A construção principal abriga apenas os quartos e uma pequena sala onde há uma TV de plasma. A cozinha e a sala de jantar ficam em uma área coberta mas aberta ao lado. O banheiro é uma pequena cabana de madeira no fundo do quintal.

A torrefação dura pelo menos 4 horas. Haja braço!
A torrefação dura pelo menos 4 horas. Haja braço!

Ao redor, a enorme plantação de guaraná divide espaço com um galinheiro e um pomar com manga, limão, cidra, jambo, urucum, e outras que eu não tenho condições de identificar. Sr. Natanael ensina como faz a própria torra das sementes com o mesmo orgulho que mostra as peles de animais selvagens penduradas na parede, que ele mesmo abateu. Tento conversar com as crianças,­ filhos e sobrinhos do Sr. Natanael,­ e descubro que gostam de matemática, enquanto assistem um episódio do Chaves em uma tela de celular minúscula. Vão todos os dias à escola em um barco da prefeitura, que passa pelo rio recolhendo os alunos. As crianças só se soltam, e ficam extasiados, quando um dos nossos liga o drone e o põe no ar.

Essa é a plantação (e a vista) do Sr. Natanael
Essa é a plantação (e a vista) do Sr. Natanael

Celebrando o guaraná

Entre uma visita e outra, nós encontramos tempo para relaxar e aproveitar um pouco do nosso paraíso ribeirinho. A água morna do rio convida a um bom mergulho, ou uma volta de stand-­up paddle ou até de wakeboard. Precisamos recarregar as baterias para aguentar 3 dias intensos de festa.

SUP no Maués Açu
SUP no Maués Açu

A Festa da Colheita do Guaraná atrai todos os anos gente de todos os cantos do Amazonas e Pará para Maués, com muita comida, atrações musicais poderosas e muito guaraná, claro. A areia da praia é tomada por uma estrutura enorme de palco, iluminação, caixas de som e camarotes. Em volta, barraquinhas de comida e bebida dividem espaço com um parque de diversões humilde e banquinhas de jogos com ar de quermesse. É a Coney Island do Amazonas.

Guaraná everywhere
Guaraná everywhere

É impossível escapar de experimentar pelo menos uma iguaria com o ingrediente homenageado. Sou convidado a provar o licor de guaraná (parece catuaba) e o ‘iogurte da longevidade’, que nada mais é que iogurte caseiro batido com pó de guaraná e alguma fruta. No meu caso morango, que me soa como algo trazido por OVNIs ali. Só refugo quando me oferecem o famoso e muito consumido Guaraná Turbinado: uma mistura que leva guaraná, açaí, amendoim, aveia, abacate, ervas, e outros ingredientes mais. Se para viver 100 anos eu depender disso, acho que me contento com uns 80.

O primeiro dia é marcado pelo concurso da Rainha do Guaraná. As candidatas representam os bairros e regiões do município, e trazem fã ­clubes com bandeiras e muita torcida. Os critérios julgados são difíceis de entender, e o resultado é um tanto controverso, deixando a plateia agitada. A noite termina com o set de um DJ de estilo único, extremamente eclético e ansioso, juntando hits de rock, disco, pop, forró, sertanejo, axé, pagode e outro em trechos de no máximo 30 segundos. DJ Luis Augusto me conquistou.

Os estados... brasileiros... não pera!
Os estados… brasileiros… não pera!

A segunda noite tem entre outras atrações a encenação da lenda do guaraná. Segundo as crenças saterê­-mawé, um curumim bondoso, saudável e forte despertou a inveja do pajé, que o matou. Sua mãe, devastada, recebeu um aviso do deus Tupã para que enterrasse seus olhos separados do corpo, e esses olhos brotaram como guaranazeiros. O espetáculo de dança, super bem produzido, prende a atenção principalmente das crianças, e ajuda a manter a cultura indígena viva.

Assim nasceu o primeiro pé de guaraná
Assim nasceu o primeiro pé de guaraná

O terceira e última é disparada a mais cheia, já que é noite de headliner. Este ano temos o sertanejo Gusttavo Lima, que eu pouco conheço, mas que arrasta multidões apaixonadas. Ao meu lado, uma fã chamada Thalia carrega cartazes dizendo que já tinha ido a mais de 100 shows do cantor, e esperava nessa noite conseguir abraçá-­lo pela primeira vez. Ela viajou 12 horas em um barco com redes para chegar até lá. Uma senhora atrás tem uma camiseta do filho deficiente para conseguir um autógrafo. A emoção de ver o astro é tão grande que Dona Zete cai desmaiada na areia logo no começo do show. A compensação chega quando ela é chamada para subir no palco e, ao ser perguntada sobre seu nome, consegue apenas responder: ‘eu vou morrer!’ A festa não acaba antes do grande DJ LA subir novamente às pickups e soltar mais um set variado e complexo.

Todo mundo querendo foto com o Gusttavo Lima, e eu tirando selfie com a D. Zete
Todo mundo querendo foto com o Gusttavo Lima, e eu tirando selfie com a D. Zete

A viagem acaba com um dia calmo e esplendoroso cortando a imensidão do Rio Amazonas. Para coroar essa jornada, somos presenteados com um pôr ­do ­sol digno de um Monet, e uma noite estrelada contra a escuridão profunda da Floresta Amazônica. Obrigado por essa, Tupã!

Ah, Amazônia! Por que tão linda?
Ah, Amazônia! Por que tão linda?

Para ver o álbum de fotos completo dessa viagem, dá uma olhada no Facebook do CoP.

Essa viagem é parte de uma parceria do Chicken or Pasta com o Guaraná Antarctica.

Quem escreveu

Renato Salles

Data

14 de December, 2016

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Renato Salles

Para o Renato, em qualquer boa viagem você tem que escolher bem as companhias e os mapas. Excelente arrumador de malas, ele vira um halterofilista na volta de todas as suas viagens, pois acha sempre cabe mais algum souvenir. Gosta de guardar como lembrança de cada lugar vídeos, coisas para pendurar nas paredes e histórias de perrengues. Em situações de estresse, sua recomendação é sempre tomar uma cerveja antes de tomar uma decisão importante. Afinal, nada melhor que um bom bar para conhecer a cultura de um lugar.

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Comentários

  • Maués, minha terra querida…. Terra da longevidade… Fico feliz que o senhor conheceu nossa terra.Quase ninguém sabe onde fica e se existe.

    - Tanizes Cardoso Neo
    • Tanizes, visitar Maués foi um grande privilégio que eu tive. Fiquei encantado com toda a cultura da cidade, e com a mobilização de todos ao redor da Festa do Guaraná. Queria poder levar mais pessoas para conhecer esse lugar tão especial!

      - Renato Salles
  • Necesito comprar semillas tostadas de guarana, y guarana en polvo por Kg.
    Cuanto es el valor del kg de semillas tostadas para comprar 100 kg?

    - John Alexander Puentes Amaya

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