Gastronomia, cultura, arte, música, diversão, compras e inspiração na Selva de Pedra. Porque para amar São Paulo, não é preciso firulas. Só é preciso vivê-la.
Chichicastenango é uma cacofonia de máscaras representando demônios, camisetas parodiando marcas de cerveja, tecidos bordados em cores brilhantes, ouro falso refletindo o sol quente, colares de jade e coral pendurados em fios metálicos e espigas de milho assado crepitando sobre carvão.
Um dos passeios ditos obrigatórios na Guatemala, Chichi é bastante difícil de registrar. Tudo pede sua atenção: as crianças enroladas em cobertores coloridos, incenso queimando na escadaria da igreja, senhoras arrumando ramos de flores, gritos dos vendedores, o senhorzinho puxando sua roupa para pedir dinheiro.
Não menos importantes são as incrivelmente insistentes vendedoras ambulantes que vão acompanhá-lo por todo o trajeto, quer você queira ou não. Qualquer parada é motivo para ser abordado por vendedor em Chichicastenango. Parece muito um bazar asiático onde você não consegue esconder sua condição de turista.
A pressão incomoda mesmo. Mas existe uma razão para Chichi, o maior mercado ao ar livre da América Latina, ser tão visitado: é bonito de ver. A cidadezinha escondida nas montanhas do oeste da Guatemala tem uma atmosfera de lugar mágico, principalmente de manhã cedo, quando a neblina começa a dissipar. Seu uso como local de peregrinação religiosa e centro de compras para os aldeões da região, mantém a atmosfera de lugar real, mesmo que Chichi seja visitada por turistas durante todo o ano.
O que vai ajudar sua experiência a ser menos estressante é chegar com o espírito preparado, já sabendo o que esperar e o que procurar. As fotos abaixo, que fiz em novembro passado durante uma viagem pela Guatemala com meus colegas de 3 Travel Bloggers (dá pra ver o episódio inteiro e praticar o espanhol aqui), ajudam um tanto.
Alguns toques para quem vai visitar Chichicastenango
Os preços iniciais pedidos às vezes são irreais. Pode pechinchar à vontade. Mas não esqueça que algumas dessas peças, principalmente mantas de tecido, são feitas à mão num trabalho que não raro leva meses. Então pechinche, mas não diminua o trabalho dos artesãos.
Comece o rolê na Igreja de São Tomás e atravesse o mercado até a pequena Capela do Calvário, onde um assustador Jesus Cristo espera por você dentro de um túmulo de vidro. Não é permitido tirar fotografias em nenhuma das igrejas.
Caminhando pela rua à direita da Capela, você avista o cemitério todo colorido. Boa visão para fotos.
A não ser que você queira pegar a cena dos vendedores chegando com seus produtos antes do sol nascer, não vale a pena se hospedar em Chichi. A maior parte dos turistas vem de van a partir da antiga capital colonial Antigua ou da moderna Cuidad Guatemala, numa viagem que leva até duas horas. Você também pode ficar numa das sete vilas ao redor do Lago Atitlán, a cerca de uma hora de viagem.
O mercado é enorme, então não caia na besteira de comprar assim que chegar. Os vendedores são muito (repito: muito) insistentes e então olhe, pechinche e tenha coragem de dizer não e visitar outras bancas.
A experiência máxima em Chichicastenango é o Festival de São Tomás, que acontece entre 13 e 22 de dezembro. Acontecem duas procissões por dia, mais danças e queimas de fogos. O auge é na noite do dia 21. Apesar do nome do santo, a festa também presta homenagem às religiões maias praticadas antes da chegada dos espanhóis.
As pessoas não querem ser fotografadas. O melhor jeito de tentar fazer isso é na honestidade: conversar antes, dar um agrado financeiro depois. Saiba que os vendedores podem cobrar se você fotografar os produtos à venda e que não é permitido tirar fotografias dentro da igreja, da capela ou do cemitério.
O mercado de Chichi fica entre duas igrejas. A principal é Iglesia de Santo Tomás, de 1540. Mas os descendentes das civilizações Maias K’iche’ conseguiram manter muito de sua cultura, incluindo crenças pré-católicas.O mercado acontece às quintas e domingos, atraindo uma mistura de artesãos, vendedores e grupos de turistas, que chegam principalmente de Ciudad Guatemala. A escadaria da igreja é usada como ponto de encontro, lugar para queimar incenso, realizar oferendas e acender fogueiras. As mulheres de Chichi, ou masheñas, também usam a escadaria para espalhar as flores que depois vão vender no mercado.Artesã demonstra a técnica de tecelagem que os guatemaltecos usam para criar seus tecidos super elaborados. Mais do que vender tecidos, ela está lá para ganhar una plata dos turistas que param para tirar fotos. Com tantos turistas fotografando, é claro que os preços sobem. Chichi pode ser um encanto visual, mas não é o melhor lugar para fazer compras. Se for ceder aos encantos das cores e texturas, faça todas as suas compras com o mesmo vendedor e negocie um bom desconto.Boa oportunidade de souvenir: as máscaras artesanais que encontrei em Chichi custavam mais barato do que em outros mercados que visitei na Guatemala. Mais difícil que escolher uma, é carregar de volta na bagagem.Além das barracas fixas, há muitos vendedores que chegam com seus produtos de vilas espalhadas pelas montanhas da região, quase sempre mulheres. Elas podem ser incrivelmente insistentes e, não raro, apelam para argumentos como “mas eu estou passando fome” e “você tem muito mais dinheiro que eu”. É o retrato de uma economia ainda em frangalhos por décadas de guerra civil e que está apenas começando a se reerguer. O único jeito de não cair nessa é evitar contato visual e andar em frente. Mas se você estiver disposto a dar uma chance, vai ver que os guatemaltecos são no geral pessoas muito doces, simpáticas e boas de papo. A maior parte das barracas e ambulantes de Chaviar (o nome original de Chichicastenango) vendem praticamente as mesmas coisas. Vale parar, tocar, experimentar e fazer muitas perguntas antes de se decidir por comprar algo. Procure por tecidos que sejam feitos à mão, mesmo que custem mais. Algumas mantas são verdadeiros tesouros e levam um ano para serem produzidas.Meus companheiros de viagem, mais experientes em América Latina, dizem que a Guatemala é o país mais colorido da América Central. Vendo o pequeno cemitério de Chichicastenango, dá mesmo para acreditar.Arepas, arepas, arepas em todo lugar: mais do que as flores ou as cinzas dos restos de fogueiras, o cheiro de Chichi é o dos pãezinhos de massa de milho tostando sobre a chapa quente. A parte norte do mercado é a menos turística, usada pela população para comprar mantimentos e coisas para casa em geral. Procure pelo grande refeitório escondido entre as tendas, pegue uma mesa e gaste seus quetzales com gosto.
Gaía Passarelli é paulistana de nascença, autora do livro "Mas Voce Vai Sozinha?"(Globo, 2016) e do blog How to Travel Light. Encontre-a em gaiapassarelli.com
Vivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.