Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
Tem duas estações de esqui que estão no topo da minha lista de lugares para conhecer. Uma é Chamonix, a estação de esqui icônica e meca para alpinistas. Chamonix tem muitos teleféricos e uma grande estrutura com várias pistas e muitas atividades para serem feitas na estação, ou seja, você não precisa ser um esquiador para curtir Chamonix. A outra é La Grave, o oposto de Chamonix.
La Grave tem 500 habitantes no vilarejo, praticamente não há estrutura hoteleira, ou seja, não é lugar para quem procura resort, é lugar para quem busca por aventuras na neve com boa experiência em cima de um par de esquis.
Uma único teleférico saindo de La Grave te leva a uma geleira a 3.000 metros de altura acima do mar e se ainda pegar um dos dois teleféricos velhos lá em cima, dá para ir até o topo do Glacial de La Girose, que fica a 3.550 metros acima do do mar e proporcionando uma descida de mais de 2.300 metros verticais até do vilarejo La Grave.
Para descer do topo da montanha, não tem pista azul, nem vermelha, nem preta. Não há nenhuma pista preparada nem marcada pra descer. Significa que não tem indicações de perigo, placas marcando o caminho ou sinalização sobre penhascos. Quem desce por aqui precisa saber se orientar entre as pedras, penhascos e buracos no glacial. Certamente não é um lugar para quem não sabe o que está fazendo.
As geleiras significam riscos em cair em crevasses e séracs, como estão em movimento constante, fendas abrem e fecham com o passar do tempo. Durante o inverno a neve pode cobri-las. Invisíveis esses buracos podem engolir quem passa por cima.
Corda, mosquetões, cadeirinha, que normalmente são associados a escalada, tem seu lugar natural entre os equipamentos dos esquiadores aqui. Tanto para resgatar alguém que caia num crevasse, quanto para fazer rapel para atravessar um penhasco.
Cascatas glaciais, formadas onde a inclinação é tão grande que a geleira não consegue deslizar, soltam blocos de gelo para baixo e trazem riscos de você ser atingido por um bloco maior do que um carro.
Nas descrições das rotas estabelecidas constam palavras como “bem sério, crevasses, navegação complexa”. “Sério” nesse caso significa consequencias graves se algo der errado.
Mesmo para quem é esquiador de bom nível, aqui é um lugar para ir acompanhado por um guia de montanha ou um amigo local que conhece o terreno. A área é íngreme com rotas que passam por couloirs com larguras não muito maiores do que o comprimento de um par de esquis e com inclinações acima de 45°. Como uma área crua onde a montanha não foi adaptada para um resort, também não há controle de avalanches* como se poderia esperar em outros lugares.
Em 2006, Doug Coombs, considerado o pai do esqui extremo de grandes montanhas, estava esquiando por aqui com alguns amigos. Decidiram descer o couloir Polichinelle, um zig-zag complexo para descidas. Esses couloirs são populares entre esquiadores por causa da neve fofa que acumulam e o desafio do espaço confinado que se apropriam. Um dos amigos acabou tomando um tombo e caiu num penhasco. Tentando chegar ao amigo, os esquis de Doug deslizaram sobre uma parte rochosa e ele também caiu. Quando o hélicoptero chegou ele já estava morto. Depois o amigo também morreu por conta dos ferimentos no hospital.
Resumindo, não é atoa que, quando se fala sobre La Grave, a conversa venha sempre carregada com o tom de lugar mítico e perigoso. Uma meca para aventureiros e praticantes de esqui off piste, ou fora da pista. Aqui pode-se passar a vida explorando e ainda tem coisa nova para descobrir. Eu vou sair daqui para dar a volta da montanha La Meije, não por nada com um certo de frio na barriga.
* a prática de artificialmente diminuir os riscos de avalanche, sendo com bombas ou construções que segurem a neve.
Foto destaque: O teleférico clássico do La Grave. Foto: Benoit Mouren (CC BY-NC-ND 2.0)
Viaja sempre com uma mochila com camera, laptop e kindle e uma mala pequena de roupas. Nela leva mais uma mala vazia que vai enchendo ao longo da viagem. Não é fã de pontos turísticos, não gosta de muvuca e foge de filas, mesmo que seja para ver algo considerado imperdível. Por isso nunca subiu na Torre Eiffel, mesmo tendo ido várias vezes à Paris. Acredita que uma boa viagem é sentir a cidade como morador. Tanto que foi pra São Paulo em 2008 e ainda está por lá.
Ver todos os postsVivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.