Tendências dos principais festivais de inovação e criatividade do mundo.
Em 2001, a cidade do Porto foi eleita a Capital Europeia da Cultura e, quatro anos depois, o tradicional bairro da Boavista receberia um incrível projeto que o diferenciaria para sempre dos outros bairros de classe média alta e o colocaria na rota cultural e turística da cidade. Enquanto a construção avançava, todo mundo se perguntava se uma obra tão moderna e futurista roubaria (ou não) a autenticidade urbana do local. Ao longo de quatro anos, foram investidos 111,2 milhões de euros na realização do que veio a ser uma das obras mais celebradas do arquiteto holandês Rem Koolhaas.
A proposta cultural da Casa da Música foi parte de um plano que consiste em desconstruir o elitismo cultural que reinou no mundo das artes em Portugal durante muitos anos, criando uma programação extensa (e intensa), que vai desde concertos solo de artistas, como os do pianista Grigory Sokolov ou da violinista Midori Gotō, a noites de música eletrônica, lançamentos de livros e conferências de imprensa. A Casa não só tranformou a Boavista, como também fez do Porto uma referência cultural.
Saindo da estação de metrô da Boavista, caminha-se cinco minutos para chegar até a entrada principal. É interessante dar uma volta antes de entrar e observar como a Casa da Música, olhada de fora, nos transmite a sensação de que existe ali um universo paralelo. Rodeado pelas fachadas tradicionais tão típicas do Porto, o prédio tem a forma de um poliedro de 17 lados e atinge 40 metros de altura! Parece um objeto não identificado que acabou de pousar e que a qualquer momento levantará voo. Do lado de fora, não dá para perceber bem quanto o vidro foi um material abundantemente usado pelo arquiteto. Estando dentro do prédio, essa escolha fica evidente.
Tive a oportunidade de conhecer o interior da Casa por duas vezes: uma como participante do II Encontro Europeu de Blogueiros Brasileiros, organizado pelo Porto Encanta com o apoio da Associação de Turismo do Porto, que aconteceu na sala Cyber, no Piso 4, e outra vez através de uma visita guiada em português (também disponível para grupos e em inglês). E minha conclusão nas duas ocasiões foi: que lugar in-crí-vel, inspirador e fundamental, não só para turistas e curiosos do mundo inteiro, mas também para os portugueses, pois a Casa da Música assumiu e preencheu um papel essencial na práxis cultural do país.
Além do almoço e jantar com acesso a um terraço incrível e uma super vista do Porto, recomendo a visita guiada, que custa apenas seis euros, pois através dela é possível visitar as salas principais, entender como funcionam, fazer perguntas e fotografar. São oferecidos dois tours diariamente (um às 11h e outro às 16h), com duração de uma hora cada e a entrada é livre para crianças com menos de 12 anos, desde que acompanhadas por um adulto com bilhete.
Apesar da Casa da Música ser um espaço versátil que pode ser usufruído de muitas maneiras, o tema central desta casa é a música e tudo nela está projetado e pensado para que não nos esqueçamos disso.
No subsolo está o Bar dos Artistas, ideal para quem chegou mais cedo e quer tomar um chá ou café, comer algo, usar o wi-fi ou ir ao banheiro. O Piso Zero tem acesso restrito e no Piso 1 fica a bilheteria e a loja com souvenirs bem legais e t-shirts lindas. Os outros andares são: Piso 2: Sala Suggia e bares 1&2, Piso 3: Coro e Foyer Nascente, Piso 4: Camarote I, Cyber e Sala Renascenca e também Sala Suggia Piso 5: Camarote I, Sala 2, Sala Laranja, Sala Roxa e Bar Suspenso, Piso 6: Sala VIP e o terraço Piso 7: restaurante. E é possível estacionar nos Pisos -1,-2 e -3.
Não deixe de notar a ausência de linearidade do edifício, que faz com que algumas salas ocupem dois andares, como é o caso da Sala Suggia, ou se complementem ou interajam entre si, como é o caso da Sala Laranja e Roxa, que servem de apoio, oferecendo programação infantil para que os pais tenham a possibilidade de assistir aos espetáculos na sala principal. Ou ainda, no caso do Foyer Nascente (ao topo das Escadas Norte), que conta com um enorme pé-direito de cerca de 17 metros, permitindo a entrada de luz natural na Sala Suggia.
A transparência tão abordada pelo arquiteto através do uso de placas contínuas e gigantescas de vidro, que muitas vezes substituem paredes inteiras, é usada de uma maneira interessante e surpreendente, como se Koolhaas nos quisesse contar um segredo aos poucos. Vale citar que as tais placas foram produzidas e importadas da Espanha especialmente para essa obra.
O projeto acústico da Sala Suggia é assinado pelo também holandês Henz van Luxemburg, uma das maiores autoridades no que diz respeito à sonoridade de ambientes e que desenvolveu a segunda melhor sala para concertos acústicos do mundo, também em Portugal (a primeira fica em Boston). A sala acomoda 1238 pessoas sentadas e tem como principal característica a clareza com que o som chega até mesmo ao último assento. Para não falar na decoração incrível, em que todo pormenor foi cuidadosamente pensado. A sala é belíssima. Dentre os brasileiros que já passaram pela Sala Suggia recentemente estão Lenine, o Rappa, Criolo e Adriana Calcanhoto.
Danilo Cabral, de São Paulo, onde mora e trabalha como consultor de marketing digital, nos conta sua experiência como espectador do show de Jeff Mangum na Sala Suggia:
“Quando as portas da sala se abriram, o que mais me impressionou foi a beleza do lugar. Misturando o velho e o novo, poltronas modernas com balcões no estilo clássico, visão perfeita de qualquer posição que se esteja… Talvez seja o lugar com a melhor acústica em que já tive oportunidade de ver um show. O salão lotou rapidamente, e o público estava quieto à espera do jovem gênio. Todas as luzes se apagaram, deixando somente um spot de luz em cima de uma cadeira, no centro do palco. O silêncio era sepulcral quando Jeff Mangum entrou, empunhou o violão e começou a cantar. A emoção de todos os espectadores era palpável. Logo na terceira música, Jeff convidou o público a chegar mais perto do palco. Foi um auê, todo mundo saiu correndo para ficar colado no palco, alguns até subiram e sentaram ao lado do cantor. Eu fiquei na borda do palco, olhando nos olhos do meu grande ídolo. Sua voz nunca foi seu forte, mas reverberando por aquela incrível sala de espetáculos, ela parecia forte e extremamente clara. Ele não precisava fazer força alguma para que sua voz, um tanto quanto frágil, chegasse a todo mundo ali presente. Olhando para os lados, percebi que não era só eu que chorava de emoção. Além de dois dos meus melhores amigos que me acompanhavam, a maior parte da platéia também estava com os olhos marejados. Ao final do show, não me contive e gritei “Jeff, I love you!”. E ele me respondeu dizendo que me amava também. Sem dúvida alguma, essa foi uma das noites mais importantes da minha vida. Além de ter visto um dos meus ídolos da vida bem de perto, o cenário foi a estupenda Casa da Música.”
São experiências como esta que fazem das salas da Casa da Música um lugar com atmosfera emocionante, servindo de palco para todos (artistas e público).
A Sala 2, como diz o nome, é a segunda maior sala e acomoda 300 pessoas sentadas ou 650 em pé. Tudo nela pode ser deslocado ou removido e as cadeiras em roxo são uma homenagem ao designer português Daciano da Costa (autor do modelo nos anos 1970). É uma sala onde o aconchego e a amplidão se encontram e se complementam. Por ela já passaram Emicida, Anelis Assumpção, Toninho Horta e a espanhola Buika.
Na visita guiada é possível conhecer salas como a Renascença e o Foyer Nascente e se maravilhar com a homenagem que Koolhaas faz à azulejaria portuguesa.
O Bar Suspenso também é incrível, pois permite até mesmo a quem não bebe apreciar a arquitetura e decoração minimalista. O Restaurante (que vai render um segundo post, fiquem de olho!) abre para almoço e jantar e vale muito a visita. Do seu terraço, é possível curtir uma vista linda do Porto.
O subsídio governamental para a programação da Casa da Música é de aproximadamente 4 milhões de euros por ano. Parece muito, mas não é, tendo em vista a extensão da programação. Somente com patrocínios e parcerias estabelecidas através da Fundação Casa Música é que a instituição pode se manter ativa e acessível. É possível fazer doações de qualquer valor através deste link. A música agradece.
Casa da Música
Av. da Boavista 604-610, 4149-071 Porto, Portugal
Segunda a sábado das 9h30 às 19h00 e domingos e feriados das 9h30 às 18h
[email protected]
Todas as fotos deste artigo e imagem destacada por Priscilla Dieb © todos os direitos reservados.
A Priscilla escolheu como mantra a frase de Amyr Klink: "Pior que não terminar uma viagem é nunca partir". Adora mapas e detesta malas. Não perde uma promoção ou um código de desconto e coleciona cartões de fidelidade. Nas horas vagas é diretora de arte, produtora de festas, dj e coletora de lixo nas ruas de Amsterdã. Escreve aqui e no www.almostlocals.com
Ver todos os postsParabéns pelo post. Deu muita vontade de voltar com calma!
Vivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.