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Como sentar ao lado de uma poltrona vazia no avião: técnicas subversivas

Quem escreveu

Vanessa Mathias

Data

03 de December, 2014

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São nos maiores momentos de crise e privação, como guerras, tsunamis, terremotos e longas viagens na classe econômica, que o homem prova seu poder de resistência.

Analisemos a situação. Voluntariamente nos oferecemos a doze horas de confinamento, em meio metro quadrado, com restritos direitos de ir e vir.   Claro que o animal interior desperta, como um tigre enjaulado. Ensaia pular na jugular do passageiro à frente, que insiste no “direito a reclinar”.

“- Reclinar a Sra sua sogra você não quer não, né?”.

Obviamente o seu assento está reclinado. Mas, convenhamos,  justiça, ética e igualdade são conceitos válidos apenas quando não estamos lutando pelo último gole de água no deserto.

Por isso a poltrona do meio vazia em um voo lotado é a verdadeira miragem, o santo Graal da classe econômica. Mas requer muita sorte. Ou apenas algum esforço: sim, existe técnica!

Se você, caro viajante, for discípulo de Darwin e crente na sobrevivência do mais forte, siga os passos abaixo para  alcançar os vinte centímetros mais desejados pelo seu cotovelo.

Passo 1: Observe a lotação do voo

Sua professora de física da 5a B já havia demonstrado: dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço. Muito menos se o espaço é projetado para, no máximo, meio corpo.

O primeiro a fazer é acompanhar assiduamente a lotação do seu voo durante os dias que antecedem a viagem. Se estiver lotado, bau-bau. O que você busca, caso não lote, é ser o passageiro mais odiado do Boeing, por afortunadamente ‘calhar’ de sentar ali ao lado do assento que ‘sobrou’.

Vôos na baixa temporada, em dias de semana (terças e quartas, principalmente), em horários excêntricos, tem menos passageiros: portanto, maiores chances de viajar sem outros humanos invadindo sua bolha pessoal.

Passo 2: Reserve lugar no voo

Melhor prevenir que remediar. Reserve lugar normalmente no de sua preferência, porém na parte de trás do avião. Penúltimos, de preferência. Eles são os últimos a serem reservados. (Os últimos, em geral, não reclinam).

Você demorará mais para se acomodar e para sair – mas o que são os vinte minutos quando você luta por doze horas de uma amplitude digna para seu joelho?

Cheque a disposição dos assentos no seatguru.com.  Se estiverem em duas pessoas é perfeito: reservem o da janela e do corredor, deixando um no meio. As chances de alguém escolher o do meio são pequenas, e mesmo se escolher, ele terá uma grata surpresa quando vocês quiserem trocar sua janelinha ou corredor.

Passo 3: Faça uma malinha de mão pequena

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Foto: Erol Ahmed – unsplash.com

Como sabemos, nossos amigos viajantes adoram levar malas de tamanhos continentais na cabine do avião. Como você será o último a embarcar e desembarcar, as chances são que não terá mais lugar no bagageiro. Leve uma que caiba embaixo do assento à sua frente.

Passo 4: Faça o check-in nos últimos dez minutos

Ser o ‘sortudo da cabine’ exige esforço e impassibilidade. Aguarde calmamente na livraria à frente do check-in a monstruosa fila de viajantes pontuais. Vôos internacionais fecham 1 hora antes, apresente-se com 1 hora e 10 minutos. Ser um dos últimos vai garantir saber o status mais atualizado do vôo. Entre no final da fila mas avise o despachante-organizador-de-filas que você está nesse vôo. Ele (quase sempre) irá resgatá-lo no momento correto  e convidá-lo para fazer o check-in.

Caso esteja lotado, ignore a regra: há chance de overbooking, e você não quer passar uma aprazível noite no Hotel Guarulhos Inn com direito a  um vale-coxinha.

Passo 5: Escolha novamente seu assento no check-in

Aproxime-se do balcão com um sorriso no rosto. Elogie  o lenço da atendente, que realmente combinou com seu cabelo – ou outras amenidades. Pergunte se o vôo esta lotado, inclinando levemente sua cabeça – em geral ela irá mostrar o seat map. Peça para, se possível, sentar em um lugar sem ninguém ao lado. “Estou há tantas horas sem dormir, será que poderia dar uma olhadinha no chart?”   Escolha as poltronas com 2 ou mais assentos um ao lado do outro.

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Foto Shutterstock Copyright Blaz Kure

Passo 6: Seja o último ao entrar no avião

Se estiver saindo do Brasil, uma hora antes, as pessoas já se acotovelam no portão de embarque. Compre um café superfaturado, e sente bem ao ladinho do portão.

Deixe entrar os idosos e grávidas. Os odiosos passageiros da primeira classe. Os portadores de cartão de crédito Titanium-Master-Super-Plus-that-shits-Gold.

Tome outro gole do seu café. Poste a famosa foto do portão de embarque com o nome do destino no Insta. Escolha um filtro Sierra e uma borda Rococó.

Acompanhe o grupo A, o B, o C.  Os passageiros da frente. De trás. Respire fundo. Continue elegantemente e impassível tomando seu café e checando as últimas notícias no Azerbaijão no celular.

A fila termina e anunciam a última chamada. Você observa os despachantes já refazendo a contagem dos passageiros. Chega a executiva correndo com o salto na mão, o mochileiro gringo que havia errado de portão. Sangue frio é essencial.

Jogue fora seu café e apresente-se com seu passaporte na mão. Deseje um muito bom dia às atendentes. E, como quem não quer nada, pergunte se você é o último. Em geral, ainda terão dois ou três perdidos pelo aeroporto.

Passo 7: Escolha seu lugar

Se sua estratégia funcionou, agora estão todos quietinhos e já sentados, e você não terá que passar por mil pessoas esbarrando-se levantando seus micro-acampamentos.

Sorria para as comissárias, pergunte como foi o dia, se esse é o primeiro voo ou ja estaão cansadas.. Pergunte se poderia ir ao toalete. Elas ficarão surpresas com sua educação. E começarão a te amar – elas adoram saber sobre o poder que elas exercem sobre seu xixi.  Isso dará tempo dos últimos dois passageiros se sentarem.

Agora você, que está lá atrás, terá uma oportunidade única de caminhar por todo o voo, da porta até seu lugar lá atrás, mirando e mentalizando atentamente se há dois lugares sobrando em alguma parte.

Com sorte, serão os seus próprios  e nada mudou. Caso contrário, pergunte a comissária, que já te ama, se o vôo já esta fechado. Se sim, peça gentilmente se poderia trocar para o 23J. Senão, espere em pé mais um minutinhos discutindo qual a temperatura local no destino final com suas, já BFFs, comissárias.

Sente na sua cadeira, e coloque sua mala pequena ao lado, desestimulando neurolingüísticamente outros espertinhos que quiserem também trocar suas poltronas.

Sempre dá certo. E quando não dá… bom, para isso Deus inventou vinho com Rivotril.

E você, tem uma técnica infalível para compartilhar com a gente? Comente aqui!

*Foto destaque: Sofia Sforza

Quem escreveu

Vanessa Mathias

Data

03 de December, 2014

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Vanessa Mathias

Seu exacerbado entusiasmo pela cultura, fauna e flora dos mais diversos locais, renderam no currículo, além de experiências incríveis, MUITAS dicas úteis adquiridas arduamente em visitas a embaixadas, hospitais, delegacias e atendimento em companhias aéreas. Nas horas vagas, estuda e atua com pesquisa de tendências e inovação para instituições e marcas.

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Comentários

  • Seria um post? Utilidade pública? Ou uma crônica? É UM NOVO GÊNERO DA LITERATURA! hahaha maravilhoso

    Fiz isso e peguei uma fileira INTEIRA pra mim voltando da Argentina: gratidão eterna!

    - Victor F
    • A Vanessa arrasa. Deveria escrever mais crônicas, não acha? :)

      - Lalai Persson
  • todo mundo sempre quer sentar na janela… quando eu sei que o avião é daqueles gigantes com três cadeiras no meio eu escolho a do meio… quase ninguem viaja sozinho e ninguem quer viajar separado de seu par… geralmente consigo de 2 a 3 cadeiras livres pra deitar e ser feliz

    - Fefa Contreiras
  • Que texto bacana! A autora é engraçadíssima! Deve ser bacana demais gastar 3,2 horas tomando uma cerveja com ela!

    - Bruno Taveira
    • Oi Bruno! hahaha valeu, me chama que eu vou (como já dizia Kaoma).

      - Vanessa
      • Kaoma dizia: chorando se foi quem um dia só me fez chorar.
        Me chama que eu vou quem diz é o Magal!

        - Renato Salles
  • “A poltrona vazia é o santo graal da classe econômica”
    Gritei aqui, muito bom! xD

    - Paula A.

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Vivemos em um mundo de opções pasteurizadas, de dualidades. O preto e o branco, o bom e o mau. Não importa se é no avião, ou na Times Square, ou o bar que você vai todo sábado. Queremos ir além. Procuramos tudo o que está no meio. Todos os cinzas. O que você conhece e eu não, e vice-versa. Entre o seu mundo e o meu.